“O que sugerimos é que se vejam as coisas em contexto e não escolhamos sempre as mesmas ovelhas negras para tentar que o foco se projete apenas nelas. Há muitas ovelhas negras, algumas das quais em Portugal, e devemos vê-las todas e não ser seletivos na identificação dos problemas”, disse hoje Augusto Santos Silva, durante uma sessão, no Palácio das Necessidades, para assinalar o final do mandato de Portugal como membro eleito do Conselho de Direitos Humanos (CDH) nas Nações Unidas (2015-2017).
Para o governante, “a ideia de uns que estão puros e outros que estão impuros é uma ideia perigosa em todos os domínios”.
O chefe da diplomacia portuguesa defendeu que Portugal tem “um desempenho em matéria de direitos humanos muito fraco” em algumas áreas, como a violência contra as mulheres, enquanto noutras "é excelente, como o combate à discriminação por razões de orientação sexual”.
Também exemplos de boas práticas, Santos Silva sublinhou a “luta internacional” de Portugal pela “abolição da pena de morte, não apenas pela moratória” nos países que ainda a têm no seu enquadramento legal - como a Guiné Equatorial, membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Portugal, destacou, realiza um “combate ativo, permanente, em todas as assembleias-gerais das Nações Unidas pela abolição da pena de morte, porque entende que é uma pena bárbara e desumana”.
A política pública de resposta à toxicodependência, por uma abordagem médica e não criminal; a luta contra a discriminação e os avanços em direitos civis tão importantes como o direito à igualdade das pessoas independentemente do sexo ou orientação sexual, e também a abertura para o acolhimento de refugiados são outros casos de defesa dos direitos humanos em Portugal apontados pelo governante.
Para o ministro, a realização dos direitos humanos deve ser vista “mais como um filme do que apenas uma fotografia, tentando perceber como se desenrola um processo”, sustentou.
Antes da intervenção do ministro, durante um debate sobre o tema, o deputado do Bloco de Esquerda José Manuel Pureza tinha advogado que Portugal deveria defender uma “muito maior exigência para a eleição para o Conselho de Direitos Humanos” (CDH).
“Portugal pode e deve ser um porta-voz, um animador do debate internacional da necessidade de muito maior critério para um Estado ser membro do CDH. Portugal prestaria um grande serviço ao CDH, evitando que em certos momentos sejam eleitos Estados cuja eleição só contribui para o desprestígio e descredibilização” deste órgão das Nações Unidas, considerou o bloquista.
Uma proposta de que Santos Silva se demarcou.
“Não achamos que a melhor maneira de promover os direitos humanos em todo o mundo seja organizar castas ou clubes. Uns tendo direito, que não sei quem é que concederia, de serem eleitos para o CDH, e outros arredados, por um estigma que não sei quem teria legitimidade para impor, que seriam uma espécie de intocáveis nessa matéria”, comentou.
“Preferimos que haja organizações das Nações Unidas em que estão ao mesmo tempo democracias totalmente perfeitas, democracias com falhas, como é a nossa, e autocracias”, acrescentou.
Por fim, o ministro referiu-se a uma “questão muito complexa”: o equilíbrio entre a agenda da soberania e a dos direitos humanos.
“Nem a agenda da soberania pode servir para disfarçar incumprimentos gravosos de direitos humanos, nem a agenda dos direitos humanos pode servir para postular que alguns países merecem viver em soberania limitada e outros merecem viver em soberania não limitada”, defendeu, para concluir que “todos os países vivem de certa maneira em soberania limitada”.
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