De acordo com a informação a que a Lusa teve acesso, em causa estão sobretudo emigrantes e empresários portugueses que também investiram em títulos de dívida do Grupo Espírito Santo (das empresas Espírito Santo International (ESI) e Rio Forte) mas que o fizeram através de sucursais do banco BES no exterior, nomeadamente na Madeira, e que não são contemplados pelo mecanismos que menoriza as perdas dos lesados do papel comercial que será apresentado publicamente esta tarde pelo primeiro-ministro, António Costa.

Segundo disse à Lusa o presidente desta associação, Luís Janeiro, apenas de clientes que investiram em papel comercial através da sucursal da Madeira há mais de 100 milhões de euros em causa.

O responsável afirmou que a associação está satisfeita com a solução conhecida esta segunda-feira, 19 de dezembro, que permite compensar parcialmente os lesados que compraram papel comercial do Grupo Espírito Santo (GES), vendido aos balcões do BES, mas também considerou que esta é injusta por deixar de fora portugueses que foram "igualmente enganados", pelo que espera haja novos mecanismos de futuro que cheguem a todos os prejudicados.

"Isto é uma solução política. Temos de dar os parabéns ao Governo e às entidades que encontraram alguma solução. Achamos normal que os problemas se resolvam uns de cada vez, mas queremos que este acordo faça jurisprudência, a ver se vivemos num Estado de direito", afirmou o responsável desta associação, que conta com 120 associados clientes de retalho do GES.

Segundo a associação de defesa de clientes bancários ABESD, é importante que todos tenham o mesmo tratamento, até porque "em muitos casos as referidas subscrições foram efetuadas em território nacional e posteriormente domiciliadas em sucursais externas" e "essas mesmas sucursais estavam sobre supervisão das entidades reguladoras em Portugal, Banco Portugal e Comissão do Mercado de Valores Mobiliários [CMVM]".

A ABESD já pediu hoje uma reunião de urgência com o gabinete do primeiro-ministro, António Costa, e o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, para expor este tema.

O Fundo de Indemnizarão permitirá minorar as perdas dos cerca de 4.000 clientes de retalho do BES que investiram 434 milhões de euros em papel comercial de empresas do GES, que foi à falência, e cujo reembolso nunca receberam.

De acordo com fontes envolvidas nas negociações, os clientes lesados que aceitem a solução têm garantido que receberão 75% do valor investido, num máximo de 250 mil euros, nas aplicações até 500 mil euros, e 50% para as aplicações acima dos 500 mil, valor que será pago até 2019.

O valor será reembolsado por aplicação e não por cliente (há aplicações que têm mais do que um titular).

Por exemplo, para uma aplicação de 400 mil euros serão pagos 250 mil euros, porque é o valor máximo possível para esse montante, ainda que seja abaixo dos 75%. Já para uma aplicação de 600 mil serão pagos 300 mil euros.

Ou seja, de forma garantida, os clientes assumem sempre perdas, mas recebem desde já dinheiro que teriam de provavelmente esperar anos para recuperar em processos em tribunal e de forma incerta.

A primeira tranche deverá paga logo no momento do contrato de adesão, que cada cliente terá de assinar, e que será equivalente a cerca 30% do valor a que cada o lesado tem direito, tendo sido esta percentagem calculada com base no que a consultora Deloitte considerou que era o valor que os credores comuns receberiam se o BES tivesse sido liquidado em 3 de agosto de 2014, em vez de ter seguido o caminho da resolução, como aconteceu.

O valor será pago por um veículo que ainda será criado - um fundo de indemnizações -, mas uma vez que este nascerá sem dinheiro, a intenção é que seja conseguido o valor necessário através de um financiamento junto da banca, com garantia do Estado e contragarantia do Fundo de Resolução bancário, pelo que se colocam dúvidas sobre o impacto que esta solução terá no défice orçamental do próximo ano.

O empréstimo que será pedido aos bancos depende da adesão dos clientes lesados a esta solução, estando já estimado que se todos aderirem serão necessários 286 milhões de euros.

Quanto aos clientes que quiserem a aderir a este mecanismo, estes têm de cumprir uma série de obrigações.

Em primeiro lugar, têm de ceder os direitos judiciais dos processos já colocados em tribunal, contra entidades e administradores ligados ao GES, ao veículo que será criado. Esse veículo assumirá, depois, a litigância desses processos na Justiça e receberá eventuais compensações decididas pelos tribunais.

O objetivo é que esse Fundo consiga recuperar em tribunal nos próximos anos pelo menos o valor pago aos clientes lesados.

Os clientes terão ainda de comprometer-se a renunciar a reclamações e processos judiciais contra uma série de entidades, que para já são Banco de Portugal, CMVM, Fundo de Resolução bancário, Estado, Novo Banco e o seu futuro comprador. Mas a lista ainda está em processo de revisão.

Este mecanismo de compensação foi discutido desde março entre o grupo de trabalho constituído pela Associação de Indignados e Enganados do Papel Comercial, Banco de Portugal, CMVM e ‘banco mau' BES, com mediação do Governo, através do advogado Diogo Lacerda Machado.