“Eu não sou das pessoas apologistas de, depois de um incêndio, começar campanhas de arborização, que é aquilo que normalmente os governantes gostam de anunciar. Aquilo que há a fazer é tentar perceber como é que o sistema regenera”, afirmou, em declarações à agência Lusa, a propósito do fogo que deflagrou na ilha da Madeira em 14 de agosto.
O investigador e professor na Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Coimbra alertou que o recurso à plantação de árvores após um incêndio é, normalmente, a “pior das opções”.
“Temos de ver como é que o sistema reage no médio prazo. No mínimo, esperar até à próxima primavera antes de fazer alguma coisa. E, normalmente, o recurso a arborizações é a pior das opções. É a forma de o poder político mostrar que está a fazer alguma coisa”, reforçou.
Joaquim Sande Silva justificou com o facto de ser comum nas campanhas de arborização as plantas utilizadas “não serem adequadas aos locais” ou “serem compradas a fornecedores” do exterior, o que provoca “problemas de instalação” no terreno.
“Tudo isto, no final, resulta normalmente em grandes taxas de insucesso. É basicamente dinheiro deitado à rua. […] Muitas vezes a natureza faz melhor do que o homem. Consegue revestir o terreno de forma mais eficaz e com espécies mais adequadas”, salientou.
O especialista, que fez parte das duas comissões técnicas independentes para os incêndios de Pedrogão e de 15 de outubro de 2017, avisou para a probabilidade de existir uma “regeneração das espécies invasoras”, uma vez que o incêndio poderá ter “estimulado a dispersão de sementes do eucalipto”.
“A Madeira tem um problema com várias espécies invasoras, nomeadamente uma espécie que pouca gente reputa de invasora, mas que o é, de facto, que é o eucalipto, que se tem estado a expandir devido aos incêndios passados”, exemplificou.
O investigador lembrou também as características orográficas da Madeira para defender obras de estabilização de emergência nos solos e evitar derrocadas no inverno.
“A forma de prevenir que haja problemas durante épocas de chuva é fazer obras de estabilização de emergência, que, como o nome indica, são de emergência. Só serão úteis se forem feitas antes das grandes chuvadas”, assinalou.
O incêndio rural na ilha da Madeira deflagrou em 14 de agosto nas serras do município da Ribeira Brava, propagando-se progressivamente aos concelhos de Câmara de Lobos, Ponta do Sol e Santana. Ao fim de 13 dias, a proteção civil regional indicou que o fogo “está totalmente extinto”.
Dados do Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais apontam para mais de 5.045 hectares de área ardida.
Durante os dias em que o fogo lavrou, as autoridades deram indicação a perto de 200 pessoas para saírem das suas habitações por precaução e disponibilizaram equipamentos públicos de acolhimento, mas muitos moradores foram regressando a casa.
Hoje, o município de Câmara de Lobos revelou que promoveu uma ação de plantação de árvores nas zonas afetadas pelo incêndio, numa “iniciativa simbólica” sobre o que é necessário fazer depois de os terrenos serem limpos.
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