No encerramento da XII Convenção Nacional do BE e depois de reconduzida no cargo de coordenadora bloquista – apesar da sua direção ter perdido lugares na Mesa Nacional –, Catarina Martins apontou ao PSD e à extrema-direita, deixando o PS fora do alvo direto, ao contrário do que tinha feito na abertura da reunião magna.
"Só há, portanto, uma forma de continuar a vencer esta direita tingida de extrema-direita: que a esquerda lute pela maioria, que nunca se desvie da obrigação de ser a voz e a força do povo", apelou.
Para a líder do BE, "ao fazer esta escolha vertiginosa, Rui Rio quer levar a extrema-direita para o Governo", o que o fez perder "capacidade de disputar o centro ao PS".
"À esquerda, essa desistência da direita coloca ainda maiores responsabilidades: toda a política nacional será determinada pela força da esquerda para conseguir as soluções para o país", defendeu.
Uma certeza Catarina Martins parece ter: "o Bloco é e será a barreira contra a direita e a extrema-direita".
"Na direita e na extrema-direita, eles que falem da sua zanga contra quem trabalha, contra a mulher, contra o imigrante. Nós falaremos de respeito pelas pessoas e de como melhorar os salários e pensões", disse.
De acordo com a coordenadora do BE hoje reeleita, "desde que o Bloco é o terceiro partido" e que afastou "o PSD e o CDS do Governo", a direita só tem um objetivo que é "criar uma fronda que lhe permita voltar ao poder, e isso exige nada mais nada menos do que aniquilar a força popular da esquerda".
"Nesse mundo novo, o PSD não hesita em caminhar para uma aliança com a extrema-direita, que aliás é um braço laranja que se destacou mas cujo futuro só depende de influenciar o seu antigo partido. Não tem sido difícil, já há gente do PSD a gritar que quer exterminar o Bloco", criticou, sem nunca enunciar o nome do partido Chega.
Nas palavras da líder bloquista, "o Bloco é a força contra o pântano da desigualdade e do empobrecimento, contra o atraso e a arrogância dos poderosos".
"Não transigimos, não recuamos, não cedemos na defesa do respeito e da liberdade, não voltamos atrás na luta pelo emprego e pela saúde, pelo salário e pela pensão. Ouçam-nos bem: saúde e emprego, salário e pensão, é assim que vai ser", avisou.
À pergunta sobre como é que os bloquistas farão este caminho, que relevância é que tem sua a proposta e com que força é que lutarão "pela saúde e pelo emprego, pelo salário e pela pensão", a líder do BE deu uma "resposta é clara".
"Com a força do nosso mandato popular, com a força das ideias com que nos apresentamos ao país e com a clareza e consistência do nosso compromisso", comprometeu-se.
"O Bloco já mudou a política autárquica"
Na ótica da líder, a campanha para as eleições que deverão ocorrer em setembro ou outubro "começa já com novos patamares de exigência graças a esse trabalho, graças ao trabalho de autarcas do Bloco espalhados por todo o país".
E pediu "a quem duvidar da importância do Bloco nas autárquicas" que veja o que o partido fez "com 7% na Câmara Municipal de Lisboa", município onde nas autárquicas de 2017 elegeu um vereador e firmou um acordo de governação da cidade com o PS.
"É difícil o combate autárquico? Difícil foi garantir manuais escolares gratuitos em toda a escolaridade obrigatória, medida que depois estendemos a todo o país. Difícil foi garantir refeições de qualidade, difícil foi aprovar planos plurianuais e impor concursos para atribuir apoios, trazendo transparência à política autárquica. Difícil foi tirar as salas de consumo vigiado do papel e concretizar o que está na lei há mais de 20 anos", salientou.
E continuou: "Difícil foi encontrar soluções para as pessoas sem abrigo e mudar a resposta, não discutimos hoje abertura de estações de metro mas abrigo que respeita e casas para quem precisa. É difícil, mas estamos a fazer".
A coordenadora do BE assinalou igualmente outras influências do BE, destacando que, "se há uns anos" os bloquistas lutavam "quase sozinhos contra a entrega a privados da água em tantas autarquias, hoje todos reconhecem o erro e a exigência é a tarifa social automática da água em todo o país", se "o recurso aos contratos emprego inserção foi a solução das autarquias para quase tudo, hoje a exigência tem de ser a vinculação de precários nas autarquias" e se o interior "seria terra sem esperança e perdida no passado", hoje "já se marcha por todos os direitos".
"Transparência, responsabilidade, responder pela habitação e pelo clima, combater as desigualdades. É essa a força do Bloco em cada autarquia, em todo o país", frisou.
As eleições autárquicas foram um dos temas abordados ao longo da XII Convenção Nacional do BE, que decorreu entre sábado e hoje, em Matosinhos, no distrito do Porto, com alguns aderentes bloquistas a alertar para a dificuldade do combate eleitoral e a necessidade de um resultado.
A moção à convenção da direção, que foi hoje aprovada, rejeita qualquer coligação “com os partidos de direita e com o PS” nas próximas eleições autárquicas, mas assume a disponibilidade dos bloquistas “para todas as responsabilidades” nos municípios e freguesias.
Nas últimas eleições autárquicas, em outubro de 2017, o BE teve um aumento expressivo de votos, conseguiu recuperar um vereador em Lisboa e eleger mandatos para autarquias inéditas, mas falhou a conquista de uma câmara, objetivo que havia sido traçado por Catarina Martins, ficando-se pelos 3,29% dos votos na contagem para as câmaras municipais.
Emprego é a "prioridade das prioridades"
A coordenadora bloquista reeleita considerou depois que o emprego a "prioridade das prioridades" para sair da crise, acusando o Governo de ter esquecido o seu compromisso de mais escalões de IRS, tema em que o BE insiste.
"Se a urgência é o emprego — e sabemos que é — cuidar da qualidade do emprego é a primeira medida para sair da crise. Justiça na resposta à crise, que terá de ser também justiça fiscal. O Governo parece ter já abandonado o compromisso do seu próprio programa de mais escalões de IRS. Pela nossa parte, não esquecemos", avisou.
Numa espécie de "cadernos de encargos" para as negociações orçamentais que hão de vir e deixando claro que o emprego é a "prioridade das prioridades" para sair da crise, Catarina Martins recordou que o Governo socialista recusou todos os compromissos propostos pelos bloquistas no Orçamento do Estado para 2021, no qual o BE votou contra.
"Não só a saúde, o emprego, a proteção social e o controlo financeiro são agora ainda mais importantes depois do sofrimento com a pandemia social que se segue à pandemia viral, como o tempo que vivemos acrescenta outra exigência à política portuguesa: não desperdiçar recursos e multiplicar o investimento em três prioridades para criar novos empregos: habitação, clima e cuidados sociais", antecipou.
Em relação ao emprego, "o que existe e o que tem de ser criado", Catarina Martins insistiu na urgência de "leis laborais fortes, para que o investimento se traduza em mais salário".
"Sem mexer nas leis laborais, o esforço de recuperação pode bem ir parar aos bolsos dos mesmos que se esquecem de tudo nas comissões de inquérito, mas que se unem sempre para reclamar contra leis do trabalho fortes. O investimento que tem de ser feito, não se pode traduzir no salário mínimo como regra, na exploração do trabalho temporário ou dos 3€ à hora das estufas de Odemira", enfatizou.
A dirigente e deputada do BE disse que, esta semana, no parlamento, o partido já avançou com uma "legislação forte para responsabilizar os donos das explorações agrícolas ou das obras, bem como os donos das terras, pelos crimes contra os trabalhadores", avisando que é só o começo.
Sobre tema da justiça fiscal, para a líder bloquista é preciso "aliviar quem ganha menos, pedir a justa parte a quem mais ganha".
"Vamos ouvir de tudo: que não há fortunas, que são as vossas manias, que no melhor dos casos os ladrões são pilha-galinhas e os poderosos uns pés descalços. Não foi o que se viu no Novo Banco, há quem peça e gaste 500 milhões como nós tomamos um café e, ainda por cima, diga que somos nós que temos que pagar a conta", atirou.
Numa alusão recente ao presidente da Promovalor, Luís Filipe Vieira, na comissão de inquérito ao Novo Banco, Catarina Martins puxou da ironia.
"Em Portugal, é mais fácil encontrar uma agulha no palheiro de um grande devedor, do que um milionário que pague os seus impostos", disse.
Quatro listas para a Mesa Nacional
Os delegados da XII Convenção Nacional puderam votar em quatro listas para a Mesa Nacional, o dobro da última reunião magna de 2018.
A liderança de Catarina Martins apresentou uma lista de continuidade e sem grandes alterações e elegeu, nas votações em urna que encerraram esta manhã, no último dia da Convenção Nacional, 54 mandatos para a Mesa Nacional, com 224 votos.
Assim, foi reconduzida como coordenadora nacional do BE, uma vez que lidera a lista mais votada à Mesa Nacional, o órgão máximo entre convenções.
A moção E, promovida pelos críticos do movimento Convergência – já constituído depois da última reunião magna -, conseguiu 68 votos, alcançando 17 mandatos a este órgão máximo entre convenções.
Os restantes lugares da Mesa Nacional foram distribuídos da seguinte forma: a moção C com quatro lugares e a N com cinco.
Entre os primeiros 10 reeleitos da lista da atual direção, para além de Catarina Martins, estão o líder parlamentar (atualmente em licença de parentalidade) Pedro Filipe Soares, a eurodeputada Marisa Matias e os deputados Jorge Costa, Joana Mortágua, Fabian Figueiredo (que está a substituir no parlamento Pedro Filipe Soares), Mariana Mortágua, José Soeiro, Isabel Pires e José Manuel Pureza.
O historiador Miguel Cardina, investigador do Centro de Estudos Sociais, o economista Alexandre Abreu, que concorreu às últimas europeias pelas listas do BE e será cabeça de lista à Assembleia Municipal de Cascais, e a ativista e estudante Andreia Galvão são algumas das caras novas que a moção A elegeu.
Já a moção E, promovida pelos críticos do movimento Convergência elegeu, entre outros, Ana Sofia Ligeiro e como número dois Mário Tomé, antigo deputado da UDP, uma das forças políticas que deu origem ao Bloco de Esquerda.
Foi ainda eleita a Comissão de Direitos, o outro órgão eleito em Convenção à qual se apresentaram três listas: moção A, moção Q e moção E.
Para este órgão, a lista apresentada pela direção conseguiu 220 votos, o que se traduziu em cinco mandatos.
Os outros dois lugares foram distribuídos entre as moções E (que teve 75 votos) e Q (com 39 votos), que conseguiram um mandato cada uma.
Em 2018, a lista da moção encabeçada por Catarina Martins, tinha conseguido 457 votos para a Mesa Nacional, conseguindo 70 dos 80 mandatos, enquanto a moção C elegeu os restantes 10.
* Com agências
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