“Não quero acreditar que, numa cedência ao populismo, os partidos de esquerda tenham aprovado a eliminação das portagens pensando que aquilo que interessava politicamente era a popularidade da medida, já que as pessoas não se apercebiam da injustiça que a acompanhava. Acredito, sim, que o fizeram por falta de informação”, afirma o ex-chefe de Estado num artigo de opinião publicado hoje no jornal Público.
Para o também ex-primeiro ministro, “os assessores económicos dos respetivos grupos parlamentares tinham a obrigação de saber da existência da restrição orçamental e de para ela chamarem a atenção dos deputados, de modo a que as suas decisões fossem mais consentâneas com a ideologia que perfilham”.
Lembrando que “não há almoços grátis”, Aníbal Cavaco Silva avisa que “a perda de receita de muitos milhões de euros” que resulta da aprovação da eliminação das portagens em sete autoestradas do interior e na Via do Infante, no Algarve será “inevitavelmente acompanhada por mais impostos ou redução de despesa pública”.
Ora, salienta, “em termos líquidos — diferença entre ganhos e perdas — quem fica claramente a perder é o grupo dos não utilizadores das autoestradas em questão, onde se destacam os portugueses que não possuem veículos motorizados”.
Face a esta “conclusão óbvia de que a eliminação das portagens é uma medida regressiva”, ou seja, “são os grupos de baixos rendimentos que proporcionalmente perdem mais”, Cavaco Silva destaca que “o seu nível de bem-estar seria maior se a medida não tivesse sido tomada”.
Para o ex-governante, é assim “surpreendente” que a eliminação das portagens tenha sido tão “entusiasticamente aprovada” na Assembleia da República pelos deputados dos partidos de esquerda, “supostamente defensores dos grupos de baixos rendimentos”.
“Esses partidos nem se preocuparam em fazer uso da possibilidade de limitar a eliminação das portagens aos residentes permanentes das regiões do interior, o que atenuaria a regressividade da medida”, nota, acrescentando que “foram ao ponto de incluírem a autoestrada do Algarve, a Via do Infante, em que uma simples análise do número e do tipo dos seus utilizadores evidencia o elevado grau de regressividade da medida”.
Para Cavaco Silva, este caso evidencia como “para a melhoria da qualidade das análises e das decisões políticas em matéria de política orçamental pode ser útil o conhecimento de alguns conceitos importantes da Teoria das Finanças Públicas”.
“Desta forma — salienta – poderão evitar-se decisões que aumentem a desigualdade entre os portugueses, penalizando especialmente aqueles com mais baixos rendimentos”.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou no dia 23 de julho sete decretos do parlamento sobre IRS, incluindo redução de taxas, IVA da eletricidade e eliminação de portagens, cinco dos quais aprovados pela oposição, com votos contra de PSD e CDS-PP.
Numa nota então publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet, Marcelo Rebelo de Sousa referiu que estes diplomas “têm em comum uma dimensão financeira com impacto nas receitas do Estado” e “todos diplomas terão de encontrar cobertura no Orçamento do Estado para 2025, a fim de poderem ser executados”.
A medida de eliminação de portagens foi aprovada no parlamento em junho, sendo o objetivo acabar, a partir de 01 de janeiro de 2025, com as portagens na A4 – Transmontana e Túnel do Marão, A13 e A13-1 – Pinhal Interior, A22 – Algarve, A23 – Beira Interior, A24 – Interior Norte, A25 – Beiras Litoral e Alta e A28 — Minho nos troços entre Esposende e Antas e entre Neiva e Darque.
De acordo com o PS, que deu origem a esta medida aprovada no parlamento, o impacto orçamental é de 157 milhões de euros.
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