Na segunda audição perante a comissão parlamentar de inquérito que tem por objeto apurar a atuação do Governo na nomeação, gestão e demissão da anterior administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD), António Domingues foi, pela primeira vez, questionado diretamente pelo PSD - partido que pediu para o ouvir novamente - sobre a existência de mensagens escritas de telemóvel (SMS) trocados entre si e membros do Governo.
"Dialoguei com o Governo, o ministro das Finanças e o secretário de Estado [adjunto e das Finanças] e mais uma pessoa pelas mais variadas formas, em conversa, por SMS, por mail, por carta. Se há SMS trocados entre mim, o ministro e o secretário de Estado, há", referiu.
No entanto, o ex-presidente do banco público sublinhou, tal como tinha feito na primeira audição, que não divulgou nem publicitou "SMS nenhuns".
"Os SMS estão no meu telemóvel, ninguém os viu a não ser eu e os interlocutores", disse, admitindo, porém, que não fez segredo perante os seus amigos e pessoas próximas da sua "interlocução com o Governo".
O deputado do PSD, Virgílio Macedo, questionou-o então diretamente se as informações avançadas pelo comentador António Lobo Xavier no programa da Sic-Notícias "Quadratura do Círculo" eram verdadeiras.
"Será que o doutor António Lobo Xavier, conselheiro de Estado, enganou o Presidente da República, ao dizer que havia SMS entre si e o Governo sobre a não entrega de declarações, acha-o capaz disso?", questionou.
"Sou amigo do doutor António Lobo Xavier e a última coisa que me ocorria era ter dúvidas sobre o seu caráter", respondeu Domingues, considerando que os deputados da comissão "têm na mão" toda a documentação que lhes permite concluir sobre este processo.
E acrescentou: "Do meu ponto de vista não havia dúvida sobre o quadro em que eu estava a funcionar", disse, reiterando que colocou "como fundamental" a condição de não entrega das declarações de rendimento e património ainda antes de aceitar o cargo, sobretudo porque convidou pessoas para integrar a sua equipa.
O social-democrata Virgílio Macedo concluiu que, quando a questão da não entrega das declarações se tornou pública, "o Governo não teve a hombridade de honrar o compromisso".
"O Governo deixou-o sozinho e fê-lo passar por tolo, quando Vexa. não é tolo nenhum, é um dos quadros bancários mais qualificados", criticou, considerando que António Domingues foi "muito cristalino e transparente".
Na resposta, António Domingues disse não acreditar que fosse intenção do Governo fazê-lo passar por tolo.
"O dossier da Caixa era um dossier difícil, a partir de certa altura o Governo deixou de ter condições políticas para manter os compromissos, é essa a minha leitura", disse, reiterando o que já tinha afirmado no final de abril, na primeira vez que foi ouvido nesta Comissão.
No início da audição, em resposta ao PCP, António Domingues disse que não tinha informação a acrescentar à dada na audição de 28 de abril e que, nos últimos dias, ainda consultou as suas notas pessoais para verificar se houve falhas.
"Não tenho nada a alterar ou acrescentar. Estive nestes dias a pensar se havia algo de novo, até vi as minhas notas, e não tenho rigorosamente nada a acrescentar", afirmou o gestor que foi presidente da CGD apenas por quatro meses, entre setembro e dezembro de 2016.
Questionado pelo deputado comunista Miguel Tiago sobre se alguma vez o Governo ou alguém em seu nome assumiu que ia alterar a lei para que a administração não tivesse de entregar as declarações de rendimentos e património no Tribunal Constitucional, António Domingues voltou a repetir informação que já tinha dado.
O gestor afirmou que, logo na primeira reunião com o ministro das Finanças, Mário Centeno, em março, aquando do convite para dirigir o banco público, o alertou que, entre outras condições, não aceitava ficar sujeito ao Estatuto do Gestor Público, nem à entrega dessas declarações no Tribunal Constitucional.
António Domingues acrescentou que depois enviou uma carta ao ministro Mário Centeno, com vários anexos, em que voltava a colocar as suas condições, mas por extenso e de modo mais formal.
"Quis que ficasse escrito para não haver nenhuma dúvida, essa carta é conhecida", afirmou.
Sobre o facto de nessa carta não estar referido explicitamente o Tribunal Constitucional, considerou que foi "por lapso de forma", mas que estava lá que tinha de haver alterações ao estatuto de gestor público, nomeadamente na prestação de informação.
Domingues disse que desde então ficou convencido que "o assunto ficou arrumado" até surgir a polémica.
O gestor disse hoje que teria gostado de "conduzir os destinos da Caixa", mas que achou por bem sair "no melhor interesse" do banco.
[Notícia atualizada às 16:54]
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