Temer chega ao poder sem o aval das urnas e com um reduzido apoio popular: apenas entre 1% a 2% dos brasileiros votariam nele para presidente, de acordo com uma sondagem recente. A sua administração, concordam até os aliados mais próximos, precisa de acertar logo desde o primeiro dia no Palácio do Planalto.

Um representante da política tradicional, mas sem o aval das urnas

Considerado um hábil gestor de relações políticas, Temer é, ao mesmo tempo, uma peça permanente do xadrez do poder no Brasil e uma figura relativamente desconhecida para o grande público. O advogado de 75 anos ocupará a presidência do Brasil durante os 180 dias - período máximo - de afastamento de Dilma Rousseff do cargo, enquanto a presidente aguarda a sentença final do Senado no julgamento de impeachment. Se a destituição de Dilma for definitiva, Temer ficará no cargo até 31 de dezembro de 2018.

Bombardeado por acusações de golpista por Dilma, Temer não pode apoiar-se no seu carisma ou numa grande retórica. "É discreto, menos conhecido do que Dilma, mas vai herdar boa parte da insatisfação que existe com a política tradicional, que ele representa. Não vai ser fácil apresentar-se como um homem novo, sem relação com os que caíram", afirma Thiago Bottino, analista da Fundação Getúlio Vargas.

Os seus assessores projetam um governo bem articulado com o Congresso e de perfil tecnocrata. Para Lincoln Secco, historiador da Universidade de São Paulo, ele vai ter uma dificuldade adicional e inédita: Dilma Rousseff. "Temer terá a sombra da presidente como uma pressão para que o seu governo apresente resultados rápidos", disse o académico, para quem a falta de legitimidade obtida com as urnas pode prejudicar a sua tarefa (Rousseff caiu tendo recebido mais de 54 milhões de votos).

O medo de perder direitos sociais

Casado com uma mulher que tem menos da metade da sua idade e autor de um livro de poesia massacrado pela crítica, Temer representa o poder estabelecido no Brasil. Em contraste, o PT levantou a bandeira dos direitos trabalhistas, programas sociais e uma agenda de novos direitos, que incluem uma definição ampla de família e que permitiu a adoção de crianças por casais homossexuais.

"O assunto mais complexo para a perspectiva do novo governo é o possível retrocesso dos direitos adquiridos", diz Debora Messenberg, especialista em Sociologia Política da Universidade de Brasília. "Há um grande receio de que uma série de avanços dos últimos anos dos governos do PT, avanços sociais, direitos trabalhistas, retrocedam em um novo cenário onde os políticos evangélicos terão um espaço importante", completou.

E a crise política deixou a sociedade brasileira muito dividida. "Os movimentos sociais vão para as ruas. Temer não vai ter uma vida fácil", afirma a professora.

Como se tira o Brasil da recessão?

É talvez a maior esperança do governo Temer e um dos capítulos mais espinhosos do Brasil em 2016: passar de um modelo de maior intervenção na economia para um de tendência liberal. O país terá que movimentar-se depressa para minimizar o prejuízo num momento em que se encaminha para o primeiro biénio recessivo desde a década de 1930 e para a maior perda de riqueza em um século.

Com a queda de 3,8% do PIB em 2015 e as perspectivas de repetir o resultado negativo este ano, e ainda de um crescimento zero em 2017, a estrutura macroeconómica do Brasil passa por um longo ciclo de paralisia. O desemprego chegou a 10,9% no primeiro trimestre, a inflação ficou em 9,28% em abril e o déficie fiscal primário foi de 2,28% pontos do PIB na última medição a 12 meses.

Com um horizonte de dívida complexo, os mercados têm muitas expectativas com o plano liberal mencionado no programa "Uma ponte para o futuro", que apresenta um pacote de medidas de choque para tirar o Brasil da recessão.

O que vai acontecer com a investigação dos casos de corrupção?

A corrupção na Petrobras, um escândalo que envolve empresários e políticos e que desviou milhares de milhões de dólares desta empresa estatal, atingiu em cheio o partido presidido por Temer, o PMBD. Mas ele não foi afetado, apesar de o seu nome ter sido citado em alguns depoimentos de réus confessos que procuram ter as suas penas reduzidas.

A investigação dos casos de corrupção tornou-se a principal bandeira dos movimentos que apoiaram o impeachment e que não são exatamente admiradores das antigas práticas políticas nem da cúpula do PMDB. "O problema da corrupção não vai acabar. E tenho dúvidas sobre o que acontecerá com a Operação Lava Jato. Poderia ser estrangulada. Espero que não, mas este risco existe", destacou Bottino. 

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