O governo britânico anunciou, esta quinta-feira, um novo pacote de sanções dirigido a sete oligarcas russos, entre eles Roman Abramovich, dono do Chelsea, clube de futebol inglês e atual campeão europeu e mundial em título.

Para além de Abramovich, o seu antigo sócio, Oleg Deripaska, Igor Sechin, presidente executivo da petrolífera estatal russa Rosneft, Andrey Kostin, presidente do banco VTB, Alexei Miller, presidente da empresa de energia Gazprom, Nikolai Tokarev, presidente da empresa estatal russa de oleodutos Transneft, e Dmitri Lebedev, presidente do Conselho de Administração do Banco Rossiya também foram sancionado com o congelamento de bens e proibição de viagens. Em conjunto, de acordo com a informação divulgada pelo governo britânico, o património líquido dos sete vale cerca de 15 mil milhões de libras (18 mil milhões de euros).

As medidas aplicadas implicam que, para além do congelamento de bens e da proibição de viagens para o Reino Unido, nenhum cidadão ou empresa britânica possa fazer negócios com eles.

O impacto destas decisões que ocorrem na sequência da invasão russa da Ucrânia têm consequências duras para o Chelsea que passou desde hoje a estar impedido de vender bilhetes para jogos e de negociar jogadores, tanto transferências como renovações de contrato, o que poderá ter implicações graves na estrutura do plantel para a próxima época, uma vez que jogadores-chave como os médios Jorginho e Kanté, o defesa Rüdiger ou o capitão Azpilicueta estão em final de contrato. A manter-se estas sanções, os jogadores que serviram de exemplo nas linha anteriores, ficarão livres para assinar por outro clube.

O processo de venda do clube também foi suspenso, mas aqui a questão torna-se um pouco mais complexa. Sendo Abramovich dono de 100% do Chelsea, o clube é congelado, o que implica uma suspensão de qualquer aquisição do mesmo por terceiros. No entanto, explica o Guardian, o governo pode assumir o processo de venda, desde que o atual dono dos londrinos não tenha acesso a qualquer verba do negócio, o que, na teoria não seria um problema para o russo que, anteriormente, já tinha prometido doar os lucros da transação para ajudar a Ucrânia.

A ministra da Cultura, Nadine Dorries, disse que os Blues ainda poderão jogar partidas e pagar aos funcionários, mas admitiu que as sanções "têm um impacto direto no Chelsea e nos adeptos”. No que toca aos jogos propriamente ditos, por exemplo, para além de só poderem estar presentes nos estádios os adeptos ou com bilhete de época ou com ingressos já comprados, o que deverá, nos últimos jogos da época causar situações inusitadas como jogos em Stamford Bridge sem adeptos rivais, a equipa orientada pelo alemão Thomas Tüchel terá um teto máximo para ser gasto nas deslocações da equipa, seja em que competição for, de 20 mil libras (23.900 euros), assim como um teto máximo de 500 mil libras (cerca de 600 mil euros) para a organização de jogos em Londres.

"Temos trabalhado arduamente para garantir que o clube e o desporto nacional não sejam desnecessariamente prejudicados por estas importantes sanções. Para garantir que o clube possa continuar a competir e operar, vamos emitir uma licença especial que permitirá que os jogos sejam cumpridos, os funcionários sejam pagos e os titulares de bilhetes assistam aos jogos enquanto, crucialmente, Abramovich é privado de beneficiar da propriedade do clube”, anunciou a ministra no Twitter.

Em resposta, o clube londrino emitiu um comunicado em que pede ao governo britânico para poder continuar a "operar o mais normal possível”, na sequência das sanções aplicada ao proprietário do clube.

No texto, o emblema londrino confirmou que as sanções impostas a Abramovich têm efeitos no funcionamento no clube, mas explicou que, entretanto, o governo britânico emitiu uma licença que permite “continuar certas atividades”.

“Queremos debater com o governo do Reino Unido os contornos dessa licença. Isso incluirá um pedido para que a licença permita que o clube continue a operar o mais normal possível. Hoje, o Chelsea vai cumprir os seus jogos com o Norwich e o West Ham, da equipa masculina e feminina, respetivamente. O clube fará uma atualização desta situação quando for apropriado”, pode ler-se na nota publicada no site oficial do clube.

No entanto, as más notícias provenientes do anúncio das sanções a Roman Abramovich continuam por vias indiretas. Esta tarde, a Three, o patrocinador das camisolas do Chelsea, suspendeu “temporariamente” a sua ligação ao clube inglês de futebol.

Através de uma porta-voz, a Three explicou que solicitou ao Chelsea que o nome e o logótipo da marca fossem removidos “temporariamente, mas de forma imediata” das camisolas de todas as equipas dos ‘blues’, desde a principal até à formação, passando também pelo futebol feminino.

“Reconhecemos que esta decisão afetará os adeptos do Chelsea, que seguem o seu clube com paixão. No entanto, sentimos que, dadas as circunstâncias e a decisão da sanção do governo que está em vigor, esta é a medida certa”, disse um porta-voz da empresa de telecomunicações, a quarta maior no Reino Unido.

A Three patrocina o Chelsea desde 2020, num contrato que, de acordo com a imprensa inglesa, rende ao emblema londrino 40 milhões de libras por ano (cerca de 47 milhões de euros). Hoje, no jogo diante do Norwich, em encontro antecipado da 30.ª jornada da Liga inglesa, o patrocínio continua exibido nos equipamentos, algo que aconteceu apenas por falta de tempo.

Abramovich além do Chelsea

Roman Abramovich, de 55 anos, tem participações na metalúrgica Evraz, na Norilsk Nickel e é dono do Chelsea FC desde 2003.

Em 2005, vendeu uma participação de 73% na petrolífera russa Sibneft à gigante do gás estatal Gazprom por 9,870 mil milhões de libras (11,770 milhões de euros) e o património líquido é estimado em 9.400 milhões de libras (11.200 milhões de euros).

Abramovich naturalizou-se português em abril de 2021 ao abrigo da Lei da Nacionalidade como descendente de judeus sefarditas expulsos de Portugal no século XV, um programa que foi utilizado por milhares de pessoas desde a entrada em vigor da lei, em 2015.

Além do passaporte russo, Abramovich naturalizou-se israelita em 2018 no âmbito da Lei de Regresso, beneficiando da isenção de visto de entrada nos países europeus, não só da União Europeia (UE) como também o Reino Unido.

Roman Abramovich ganhou renome internacional com a compra do clube de futebol londrino Chelsea FC, em 2003, no qual investiu milhões de euros para o elevar ao nível dos grandes europeus, contratando jogadores e treinadores famosos.

O recrutamento em 2004 do treinador José Mourinho e de um contingente de jogadores portugueses, nomeadamente Paulo Ferreira, Ricardo Carvalho e Tiago, tornou-o também conhecido em Portugal.

Ao longo de quase duas décadas transformou o Chelsea FC num dos grandes da Primeira Liga inglesa e das competições europeias, mas a maior visibilidade atraiu escrutínio sobre os seus negócios as suas ligações ao regime do Presidente russo, Vladimir Putin.

Em 2018 retirou o pedido de renovação do visto de investidor no país devido ao conflito diplomático entre o Reino Unido e Rússia, na sequência do envenenamento do antigo espião Sergei Skripal em Inglaterra.

Na altura, a então primeira-ministra Theresa May ordenou uma reavaliação dos vistos atribuídos a centenas de “oligarcas russos” no país, porém Abramovich nunca foi sujeito a sanções internacionais.

Em dezembro, o opositor político russo Alexei Navalny criticou a decisão de Portugal de conceder a naturalização a Abramovich, questionando a legalidade e associando o empresário a Putin, numa altura de tensão militar na Ucrânia.

“Finalmente conseguiu encontrar um país onde pode pagar alguns subornos e fazer alguns pagamentos semioficiais e oficiais para acabar na União Europeia e na NATO”, escreveu Navalny na rede social Twitter.

Mas a natureza do relacionamento entre Putin e Abramovich foi posta em causa recentemente na justiça britânica, que forçou a editora HarperCollins a pedir desculpas e a retirar do livro “Putin’s People” as alegações de que o clube de futebol foi comprado sob ordens do chefe de Estado.

A Associação Frente Cívica, liderada pelo antigo candidato à Presidência da República portuguesa e antigo vice-presidente da Câmara do Porto Paulo de Morais, considerou "mais do que duvidosa [a] ligação de Abramovich às comunidades de judeus sefarditas”.

O Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa e o Instituto dos Registos e Notariado (IRN) abriram, separadamente, inquéritos para verificar a conformidade do processo de Abramovich. No entanto, parece pouco provável que haja outro desfecho para além do inquérito já aberto, com a ministra da Justiça a dizer hoje à Rádio Renascença que a lei portuguesa não permite retirar nacionalidade a Roman Abramovich por razões políticas.

Com casas e família espalhada pela Rússia, Estados Unidos, Londres e Israel, o empresário russo está determinado a provar que pediu a nacionalidade portuguesa de boa-fé, com planos de investimento económico e donativos a instituições de beneficência, como fez em outros países.

"Ao longo do último ano, temos estado a avaliar a melhor forma de contribuir tanto para a preservação da herança judaica como o apoio à sociedade em geral em Portugal. Esperamos que alguns desses planos sejam realizados num futuro próximo”, indicou a porta-voz do empresário à Lusa.

Ao contrário de várias notícias na comunicação social, salientou, "não há benefício imediato ou agenda oculta por trás de nada disto”, lamentando a "publicação de muita informação falsa”.

"A lei portuguesa do regresso não só permite, como encoraja ativamente judeus com ascendência portuguesa comprovada a estabelecer raízes em Portugal. Este espírito acolhedor atraiu Abramovich, que viu a candidatura à cidadania portuguesa como uma oportunidade para honrar a história da sua família e, ao mesmo tempo, apoiar a comunidade judaica local, contribuindo para a preservação da vida judaica em Portugal”, justificou a porta-voz.