De acordo com o parecer do Conselho de Redação (CR) da TVI, hoje divulgado, o órgão, reunido em 21 de janeiro, "condena veementemente a vigilância a dois jornalistas – Henrique Machado (TVI) e Carlos Rodrigues Lima (Sábado) – ordenada por duas procuradoras do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, com o intuito de descobrirem as suas fontes".

O CR da estação de Queluz considera ainda que a "decisão é atentatória da liberdade de imprensa e suscetível de ferir, na globalidade, a relação entre os jornalistas e as suas fontes".

O Conselho de Redação salienta que "inquirições a jornalistas sobre as suas fontes de informação, perseguições policiais, vigilâncias, fotografias e filmagens a estes profissionais, devassa das suas comunicações até do seu sigilo bancário são medidas que abrem precedentes que colocam em perigo a própria democracia, uma vez que limitam e condicionam o funcionamento de um dos seus pilares: a comunicação social".

O órgão que representa a redação da TVI sublinha que "é condição de um Estado de direito democrático uma comunicação social livre e independente, que assenta em princípios deontológicos firmes, nos quais se inclui uma relação de confiança e colaboração entre jornalistas e fontes", manifestando "toda a solidariedade aos companheiros de profissão visados".

Entretanto, na semana passada, as direções de informação de duas dezenas de media portugueses emitiram uma posição conjunta contra quaisquer tentativas de condicionamento da liberdade de imprensa.

"A liberdade de expressão, a garantia de sigilo profissional e a garantia de independência dos jornalistas (art.º 6.º Estatuto do Jornalista), bem como a proibição de subordinação da dita liberdade de expressão a qualquer tipo ou forma de censura, são pilares fundamentais da constitucionalmente consagrada liberdade de imprensa", sublinharam, apontando que esta "passa, expressamente, pelo direito a manter sigilo absoluto sobre as fontes jornalísticas".

A carta foi subscrita pelos diretores André Veríssimo (Negócios), António José Teixeira (RTP-TV), Anselmo Crespo (TVI), Bernardo Ribeiro (Record), Domingos Andrade (TSF e Global Media Group), Eduardo Dâmaso (Sábado), Inês Cardoso (Jornal de Notícias), João Paulo Baltazar (Antena 1), João Vieira Pereira (Expresso), José Manuel Fernandes ('publisher' do Observador), José Manuel Ribeiro (O Jogo), Luísa Meireles (Lusa), Mafalda Anjos (Visão), Manuel Carvalho (Público), Mário Ramires (do Nascer do Sol e do i), Octávio Ribeiro (diretor-geral editorial da Cofina Media), Pedro Leal (Rádio Renascença), Ricardo Costa (SIC), Rosália Amorim (Diário de Notícias) e Vítor Serpa (A Bola).

A PGR instaurou um "processo de averiguações" para o "apuramento das responsabilidades por eventual violação dos deveres funcionais", recordou, também na semana passada, o Sindicato dos Jornalistas, relembrando ainda que escreveu ao secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, com conhecimento da ministra da Cultura, "por não compreender o seu silêncio face a este atentado à liberdade de imprensa, garantida na Constituição da República Portuguesa".

Em resposta, o secretário de Estado reiterou a "defesa intransigente do princípio da liberdade de imprensa e o repúdio de qualquer tentativa de condicionamento ou interferência com a liberdade de os jornalistas desenvolverem o seu trabalho para o cumprimento do direito à informação", refere o SJ.

O Sindicato dos Jornalistas apontou que, "ao mesmo tempo", o governante "refugiou-se na 'separação de poderes' e nada adiantou sobre se tomará alguma ação sobre o caso, que representa um grave precedente e coloca constrangimentos ao exercício de um jornalismo livre e independente, fundamental em democracia".

Em causa está a notícia da revista Sábado, em meados deste mês, de que a procuradora Andrea Marques, do DIAP ordenou à PSP que fizesse vigilâncias a jornalistas.

O caso já levou a Federação Europeia de Jornalistas (FEJ) a notificar Portugal, junto do Conselho da Europa, sendo esta a primeira vez que Portugal é alvo de um "alerta" na plataforma criada em 2015 para denunciar violações da liberdade de imprensa e proteger o jornalismo.

Portugal assinou a recomendação do Conselho da Europa sobre o direito dos jornalistas a não divulgarem as suas fontes de informação, adotada em 2000 – e que está igualmente protegido na Constituição da República Portuguesa (artigo 38.º).

Além disso, cinco organizações de defesa da liberdade de imprensa - FEJ, Centro Europeu para a Liberdade de Imprensa e dos Media(ECPMF), Article19, OBCT e IPI -, enquanto parceiros do observatório de resposta rápida sobre liberdade de imprensa (Media Freedom Rapid Response - MFRR) saudaram Teresa Ribeiro pela sua designação como representante para a liberdade dos media da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e chamaram a sua "atenção" para a notícia de 13 de janeiro da Sábado.

O título noticiou que, "entre abril e maio de 2018" a PSP "vigiou secretamente quatro jornalistas no âmbito de uma investigação" sobre 'fuga de informação relacionados com o caso de corrupção 'e-Toupeira', "por ordem da procuradora Andrea Marques (...) sem prévia autorização de um juiz de instrução e com vista a identificar as fontes dos jornalistas".

Referem ainda que os jornalistas sob vigilância são Sílvia Caneco (Visão), Isabel Horta (SIC), Carlos Rodrigues Lima (Sábado) e Henrique Machado (Correio da Manhã e TVI) e que "a polícia extraiu as trocas de SMS dos jornalistas e, para um deles, obteve acesso à conta bancária pessoal".

A polícia "também acompanhou Rodrigues Lima por vários dias, em 30 de novembro de 2020, interrogou-o como suspeito", sendo que "em 08 de janeiro de 2021 Machado foi também interrogado como suspeito", salientam.

"Estamos muito preocupados com a falta de supervisão judicial neste caso", pelo que "instamos as autoridades portuguesas a abrirem rapidamente uma investigação transparente para avaliar se as medidas de vigilância infringiram a lei e como é que isto foi permitido, salientam na carta à ex-secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros, pedindo ainda que Teresa Ribeiro aborde o assunto com o Governo português.