Em entrevista à Lusa, questionado sobre as contratações da Media Capital, Poiares Maduro disse que o tema suscita “preocupação” relativamente a “empresas [que] estiveram a solicitar ao Estado apoios financeiros, dizendo que não tinham condições de sustentabilidade mínima e depois, subitamente, conseguem encontrar capacidade financeira para fazer contratações milionárias”.
A Media Capital, dona da TVI, teve a produtora Plural em ‘lay-off’ e vai receber 3,3 milhões de euros no âmbito da compra antecipada de publicidade institucional.
“Se nos escandalizamos que os bancos estejam a receber apoios públicos ou que empresas que sejam detidas pelo Estado, como aconteceu na TAP, depois deem bónus aos seus administradores mesmo quando apresentam prejuízos, não podemos deixar de nos preocupar quando empresas, que ainda que forma indireta — compreendo que o mecanismo escolhido pelo Governo tornava difícil esse controlo porque não é um subsídio, é uma compra antecipada de publicidade”, recebem apoios, disse.
“Naturalmente que podemos dizer que as empresas devem ser livres de fazer as suas decisões de gestão, com o risco que isto comporta, e que são ou não premiadas pelo mercado, de acordo com isso”, mas “o que não podem é querer solicitar apoios públicos precisamente porque dizem que não têm a sustentabilidade, numa lógica de mercado, mas depois invocar o seu estatuto totalmente privado e a lógica de mercado para tomar decisões que, quer queiramos ou não, são decisões arriscadas”, argumentou.
O antigo ministro da tutela da comunicação social do governo de Passos Coelho realçou que “quando estão, ainda por via indireta, envolvidos meios financeiros públicos”, devia haver “uma preocupação grande de escrutínio e deveria ser exigida a essas empresas que tivessem uma prudência, que fossem consequentes com aquilo que elas próprias estiveram a dizer: que é o mercado não nos assegura sustentabilidade para a nossa atividade”.
Instado a comentar se considera que a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) – que em 17 de julho anunciou que estava a analisar as mudanças na estrutura acionista da TVI – já deveria ter comunicado a sua análise sobre assunto, Miguel Poiares Maduro disse que a demora “não é apenas um problema dos reguladores na área da comunicação social em Portugal”.
Aliás, “nós temos em geral um problema com os nossos reguladores”, considerou, referindo tratar-se de algo que tem vindo a referir “há bastante tempo”.
“Acho que a principal causa do pouco desenvolvimento do nosso país e do nosso baixo crescimento é a fraca qualidade das nossas instituições. E entre essas, de um ponto de vista fundamental, a fraca capacitação e independência dos reguladores em muitas circunstâncias”, “que tem a ver desde com a credibilidade, com autoridade, com os processos de selecção, com as suas regras de funcionamento, com a massa crítica que eles conseguem ter e atrair para o funcionamento dessas atividades”, prosseguiu.
“Eu não sei em concreto como é que está a ERC neste momento, nem mesmo os meios que tem, mas deduzo que, como no caso de outros reguladores, lembro-me a Autoridade da Concorrência muitas vezes também demora imenso tempo”, apontou.
O ex-ministro considerou que é “muito importante que seja garantida a transparência sobre quem realmente é que tem a propriedade, quem é que exerce depois o poder de controlo dentro da empresa, correspondendo ou não à participação que tenha no capital”.
O empresário Mário Ferreira comprou em maio 30,22% da Media Capital por 10,5 milhões de euros.
Considerando que as medidas de apoio aos media são “urgentes”, o professor universitário defendeu ser preciso apostar também em outras áreas importantes para o setor.
“Esta fragilidade económica torna o setor facilmente capturado por dinheiros de origem mais duvidosa ou cuja intenção de investimento, cuja intenção que está por trás do investimento no negócio que em si mesmo não é lucrativo nos pode levar a duvidar sobre as intenções desse investimento” e isso exige “reforçar os mecanismos de transparência”.
A lei que regula a transparência da titularidade, da gestão e dos meios de financiamento dos media entrou em vigor em outubro de 2015, era Miguel Poiares Maduro ministro com a tutela da comunicação social.
“Somos dos países mais desenvolvidos a nível europeu [na lei da transparência dos media], mas temos de tornar mais transparente essa informação, por exemplo, no próprio portal da ERC, que está pouco transparente”, considerou.
O regulador dos media “tem demorado muito tempo, quer na adoção da regulamentação, mas acabou por fazer, quer depois na divulgação dessa dessa informação, mas é um passo importante nesse sentido, até porque inclui não apenas a propriedade, mas também a dependência a nível de fontes de publicidade”, argumentou Miguel Poiares Maduro.
“Se houver empresas que têm um peso particularmente forte nas receitas de um grupo de media ou de um jornal através do volume de publicidade que colocam aí – empresas ou instituições públicas, pode ser uma câmara municipal -, os cidadãos devem saber porque isso também é uma razão de suspeita que imediatamente ocorre relativamente a esse órgão de comunicação social”, apontou.
Miguel Poiares Maduro continua ainda a defender a existência de um regulador único para os media e telecomunicações, em vez de dois diferentes – ERC e Anacom – como atualmente acontece.
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