Em entrevista à RTP, transmitida hoje à noite, na qualidade de secretário-geral do PS, António Costa sustentou que este é "um tema que está fora da agenda da vida dos portugueses" e é alimentado pela "bolha mediática e certo mundo político".

"Não vamos estar aqui a criar crises artificiais. Percebo que há aqui uma direita que não consegue suportar a ideia de que este mandato parlamentar se cumpra e que não são capazes de respeitar a vontade dos portugueses. E cria-se aqui um clima artificial para procurar colocar na agenda um tema que está fora da agenda da vida dos portugueses. A minha agenda, a agenda do Governo, a agenda do PS é a agenda da vida dos portugueses", afirmou.

Questionado sobre se não lhe parece que se está a abrir o caminho a eleições antecipadas, o líder dos socialistas e primeiro-ministro retorquiu que eleições antecipadas houve há um ano, em 30 de janeiro, e os portugueses "votaram pela estabilidade quatro anos", ao dar maioria absoluta ao PS.

"Temos de nos habituar, primeiro, a respeitar a vontade dos cidadãos. E a vontade dos cidadãos foi muito clara", defendeu.

"O que eles disseram foi que queriam estabilidade para quatro anos, queriam um Governo que pudesse começar, desenvolver o seu trabalho e ser avaliado no final do seu trabalho. É isso que devemos fazer, em primeiro lugar", acrescentou.

Além disso, mencionou que a Constituição diz "que os mandatos são de quatro anos" e que a dissolução só deve acontecer "em situações muitíssimos excecionais, como aquelas que o Presidente da República entendeu existirem há um ano"​​​​​​.

Segundo António Costa, "há aqui uma enorme distinção entre o debate daquilo que tenho designado a bolha mediática e um certo mundo político e aquilo que é a vida do dia a dia dos cidadãos".

Dirigindo-se ao jornalista que conduziu a entrevista, Hugo Gilberto, referiu: "Se reparar, nas sondagens que têm saído há uma coisa muito interessante, é que a esmagadora maioria das pessoas nem sequer responde. Tenho visto aí sondagens em que para terem 600 e tal respostas, têm de fazer quase 2.000 contactos, porque as pessoas não estão nem aí".

"Acho que os portugueses não estão nem aí. Os portugueses manifestamente não querem dissolução nenhuma. Os portugueses não querem que os políticos criem problemas. O que os portugueses querem é que os políticos resolvam problemas", reforçou.

Quanto a uma possível dissolução do parlamento na sequência de uma derrota do PS nas eleições de 2024 para o Parlamento Europeu, António Costa argumentou que "cada eleição é a sua eleição" e invocou o caso das europeias de 2004.

"Essas eleições de 2004 são, aliás, um caso até bastante evidente, porque aí estávamos a ter um Governo do doutor Durão Barroso, o PS teve 44,5% dos votos, uma votação esmagadora, a direita ficou com uma votação muito baixa, e não só não houve dissolução por causa desse resultado como o doutor Durão Barroso até deixou de ser primeiro-ministro para ser presidente da Comissão Europeia, foi substituído pelo doutor Santana Lopes", apontou.

Para o secretário-geral do PS, com a guerra na Ucrânia, a inflação e a crise energética, a estabilidade é ainda mais importante hoje do que era há um ano.

Pedro Nuno Santos continua a ser "um dos grandes quadros" do PS

O líder dos socialistas considerou que o ex-ministro Pedro Nuno Santos continua a ser "um dos grandes quadros" do PS e afirmou que a vida de um político "não é uma corrida de cem metros".

António Costa assumiu esta posição ao ser questionado sobre o futuro político de Pedro Nuno Santos, que se demitiu de ministro das Infraestruturas e da Habitação em janeiro deste ano.

O secretário-geral do PS começou por reiterar a promessa de não interferir na escolha do seu sucessor e disse que o que tem procurado fazer é "identificar quem são os melhores quadros" do partido.

"Mobilizá-los para a ação política e dar oportunidade para que provem as suas capacidades e que possam ser tudo aquilo que eles desejem ser e que os militantes do PS desejem que eles possam ser", prosseguiu.

Em seguida, António Costa afirmou que "o Pedro Nuno Santos é indiscutivelmente um dos grandes quadros políticos do PS". Interrogado se continua a ser, respondeu: "Claro que é, isso é um dado objetivo".

Questionado sobre as polémicas em que Pedro Nuno Santos se envolveu, com destaque para a relacionada com a TAP, que levou à sua saída do Governo, não provocaram danos, o secretário-geral do PS relativizou.

"A atividade política é uma atividade que tem momentos de sucesso, tem momentos de insucesso, tem momentos bons, tem momentos negativos. A vida de um político não é uma corrida de cem metros. A vida de um político é uma vida, e ao longo dessa vida vai-se sendo sucessivamente avaliado", argumentou.

António Costa deu o exemplo do seu próprio percurso, recordando a derrota que teve em eleições autárquicas há 30 anos quando concorreu a presidente da Câmara Municipal de Loures.

"O engenheiro Demétrio Alves derrotou-me nessas eleições, faz parte da vida política. As pessoas têm de aprender a ter vitórias, derrotas", insistiu.

Nesta entrevista, conduzida pelo jornalista Hugo Gilberto, o secretário-geral do PS defendeu que é cedo para se falar das eleições presidenciais de 2026 ou de quaisquer outras eleições previstas para os próximos anos.

Interrogado se o atual presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, é um bom candidato a Belém e se o PS irá desta vez apoiar um candidato a Presidente da República, António Costa respondeu: "É tudo muito prematuro. Nós não podemos estar a discutir cada coisa tudo ao mesmo tempo. A vida política tem os seus tempos próprios".

"Há de chegar o momento em que se há de discutir quem é que são os candidatos [às várias eleições]", acrescentou.

Montenegro não disse "com o Chega nada, nada, nada"

O secretário-geral do PS, António Costa, considerou que o presidente do PSD, Luís Montenegro, não disse o que seria necessário para se demarcar claramente do partido de André Ventura, "com o Chega nada, nada, nada".

António Costa alegou que Luís Montenegro "quer manter uma situação equívoca" e está a ajustar a sua atuação política para "que se distinga pouco o PSD para os eleitores do Chega".

Interrogado se não ficou descansado quando Luís Montenegro numa entrevista recente excluiu governar ou aceitar o apoio de partidos "racistas, nem xenófobos, nem oportunistas, nem populistas", o líder dos socialistas e primeiro-ministro realçou nessa frase "o que não diz".

"Não disse o que era necessário dizer: não haverá nenhum acordo com o Chega", realçou.

Para António Costa, o que o presidente do PSD deveria ter dito era "com o Chega nada, nada, nada", mas "não disse, e era isso que deveria ter dito".

"O grande problema", segundo o secretário-geral do PS, "não é a dimensão do Chega em si – que já é significativa –, mas é o que o Chega condiciona e determina a ação política da direita democrática".

No seu entender, "hoje o PSD tem muitas vezes um comportamento, uma atitude, um vocabulário que não corresponde àquilo que é um partido institucional".

António Costa deu como exemplo ter havido "um vice-presidente do partido" – Paulo Rangel – "a dar uma conferência de imprensa pondo em causa a visita de um chefe de Estado de um país irmão como é o Brasil" e identificou uma "enorme degradação no debate político no vocabulário que hoje a direita vai utilizando".

"Pior do que a situação equívoca, é que todo o posicionamento político do PSD, todo o tipo de discurso que o PSD vai tendo sobre as questões das migrações, sobre o funcionamento das instituições, o vocabulário que vai utilizando revela uma preocupação fundamental do doutor Montenegro, que é que se distinga pouco o PSD para os eleitores do Chega", sustentou.

O secretário-geral do PS comparou o populismo a "um vírus que se vai transmitindo" e contra o qual é preciso proteção e vacinação, "uma pandemia política".

Nesta entrevista, António Costa foi questionado sobre a exigência de Luís Montenegro para que se pronuncie sobre a polémica em torno da fundamentação jurídica das exonerações na TAP, mas evitou o tema.

O secretário-geral do PS disse antes querer saber "qual é a alternativa do PSD" para o futuro da companhia aérea portuguesa.

Interrogado se não entende que deve falar da existência ou não de um parecer jurídico e se não considera que houve "uma trapalhada" na articulação entre ministérios sobre este assunto, António Costa não respondeu diretamente à pergunta.

Falando em termos gerais da Comissão Parlamentar de Inquérito à Tutela Política da Gestão da TAP, defendeu que o Governo não deve interferir nas competências de outros órgãos de soberania e que as comissões de inquérito não devem ser "arma de arremesso político, ou se não perdem a sua credibilidade".

Segundo António Costa, também o presidente do PSD deveria "aguardar pelos resultados", mas "a cada depoimento quer transformar num episódio da semana".