Numa carta enviada à DGS, a que a agência Lusa teve acesso, a Associação Portuguesa pelos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto (APDMGP) refere que tem recebido relatos cada vez mais frequentes destas situações e pede que a DGS tome uma posição sobre este assunto.
“Sabemos, concretamente, que há inúmeras instituições de saúde em que está a ser imposto às grávidas a realização do teste do novo coronavírus às 39 semanas de gestação e, caso seja positivo, estas são encaminhadas para outro hospital”, refere a associação.
No caso de o teste ser negativo, “é proposta a indução do parto para o dia seguinte, mesmo sem outras razões médicas que justifiquem a antecipação do parto”.
“Esta prática não é recomendada pela Organização Mundial de Saúde e não está isenta de riscos para a mãe e para o bebé, não se compreendendo, por isso, que esteja a ser aplicada de forma indiscriminada em tantas instituições de saúde”, adianta a APDMGP.
Para a associação, existem “claros indícios” de que a cultura de agendamento de partos, que já se verificava em muitos contextos, se agravou agora, o mesmo se passando com as cesarianas, que “estão a ser agendadas de forma rotineira para as grávidas que testam positivo, nomeadamente nos hospitais da Guarda, de Vila Franca de Xira e de Évora”.
“Enquanto Associação, defendemos, claro, que a proteção adequada de profissionais de saúde não seja descurada”, mas “é “inaceitável” que sob este pretexto sejam tomadas medidas que “desrespeitam os direitos da mulher na gravidez e no parto, contribuam para o recurso abusivo a intervenções obstétricas e ignorem as recomendações das autoridades de saúde internacionais”.
Para a APDMGP, é “um dever das autoridades de saúde dotar as mulheres, as famílias e os profissionais de informação adequada e contextualizada, reduzindo os quadros de incerteza e desigualdade, e travar esta outra pandemia de partos agendados, seja por indução ou por cesariana, que atualmente se verifica”, lembrando que “a escolha é sempre da mulher, no pleno exercício dos seus direitos”.
Sandra Oliveira, autora do livro Nascer Saudável, também alertou para o facto de haver hospitais a dizerem às grávidas que têm de fazer indução após o resultado do teste para garantir a não contaminação.
“Uma indução no momento errado pode levar dias e o mais provável é que termine em cesariana”, disse à Lusa Sandra Oliveira, defendendo que “se os profissionais de saúde estão protegidos com equipamentos de proteção individual e as grávidas nem têm uma incidência maior de infeção que a restante população, é um atentado à saúde das mulheres e bebés”.
Contactado pela Lusa, o secretário-geral da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia, Diogo Ayres de Campos, afirmou que, “do ponto de vista científico não há justificação nenhuma para se estar a provocar o parto mais cedo por causa da infeção” pelo novo coronavírus, que provoca a doença covid-19.
Ao induzir o parto mesmo às 39 semanas corre-se “algum risco adicional”, disse o obstetra, explicando que “são partos mais prolongados, mais dolorosos e têm um risco acrescido em relação ao bebé”, nomeadamente baixa oxigenação.
“Nós tentamos sempre evitar induzir o trabalho de parto se não houver um motivo e aqui claramente não é um motivo que o justifique”, disse Diogo Ayres de Campos, adiantando que a covid-19 parece não afetar muito a gravidez nem o recém-nascido, “o que dá alguma tranquilidade”.
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