O consórcio detalhou na altura que um dos telemóveis do presidente francês, Emmanuel Macron, estava na lista de alvos deste sistema de espionagem, tal como o do ex-presidente da Comissão Europeia Romano Prodi e o do presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, quando este chefiava o governo belga.
Os telemóveis do presidente do governo de Espanha, Pedro Sánchez, e da sua ministra da Defesa, Margarita Robles, também foram submetidos a escutas “ilícitas e externas” pelo Pegasus segundo dois relatórios técnicos do Centro Criptológico de Espanha, que informou o Executivo.
O Pegasus é um programa informático malfazejo, designado ‘malware’, de ciberespionagem que se instala em dispositivos móveis e é capaz de copiar toda a informação contida no aparelho espiado, do qual assume o controlo quase total, sem que o seu utilizador o saiba.
O programa chega ao utilizador a partir de uma falsa mensagem de correio eletrónico ou uma videochamada perdida nas redes socais, como WhatsApp, na qual se incita a entrar em um sítio com algum tema de interesse para o utilizador do aparelho, a parir do qual é infetado.
Desenvolvido pela empresa israelita NSO Technologies, fundada em 2010 por antigos membros dos serviços de informações israelitas, tem sido vendido alegadamente apenas a governos e aos serviços de segurança destes para combater o crime e o terrorismo.
A revelação sobre o uso do Pegasus foi feita em 2017, se bem que o primeiro alerta tenha sido feito um ano antes.
No verão de 2021, uma investigação uma investigação jornalística global revelou que o Pegasus tinha sido utilizado por governo de todo o mundo, desde a Arábia Saudita ao México, para espiar ativistas, defensores de direitos humanos, jornalistas e políticos.
Coordenadas pela Forbidden Stories, as investigações, com apoio técnico da AI, levantaram uma maré de condenações em todo o mundo, se bem que os governos alegadamente implicados tenham negado a sua relação com o uso ilegítimo do programa.
Cerca de 50 mil pessoas foram identificadas como potenciais alvos do programa, entre o quais 180 jornalistas que investigam casos de corrupção ou violações de direitos humanos, bem como dirigentes políticos.
Entre estes, o consorcio jornalístico afirmou que Mácron era um dos alvos e que o governo marroquino um dos clientes.
O governo francês colocou em marcha um processo de verificações e a justiça francesa abriu uma investigação, enquanto Rabat negou qualquer implicação no escândalo.
Em setembro de 2021, o sítio de informação Mediapart estendeu a mais cinco ministros franceses a possibilidade de terem sido espiados, se bem que as análises técnicas não tenham determinado se os telemóveis foram de facto infetados ou apenas objeto de identificação para espionagem posterior.
À margem de França, o ex-presidente da Comissão Europeia Romano Prodi também estaria entre os espiados, tal como o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel. Neste caso, a situação teria acontecido quando este chefiava o governo belga, indicou o diário belga “Le Soir”, que colaborou com o consórcio.
Na Hungria, e depois das diligências abertas pela procuradoria de Bucareste, soube-se que entre os telemóveis espiados esteva o do jornalista Daniel Nemeth, que investigava a vida luxuosa de personagens próximas do governo do ultranacionalista Viktor Orbán.
Um dos últimos casos de alegada espionagem com recurso ao Pegasus foi relvelado pelo semanário norte-americano The New Yorker, em abril de 2022, com dados do The Citizen Lab, segundo o qual mais de sessenta dirigentes independentistas catalães, na sua maioria, e bascos, tinham sido vítimas do programa.
Entre os investigados estão o presidente da Generalitat (o governo autonómico), Pere Aragonès, os ex-presidentes Quim Torra e Artur Mas e os colaboradores de Carles Puigdemont.
A suposta espionagem coincidiu com os anos mais agitados na Catalunha, quando o governo catalão convocou em 2017 um referendo de secessão, declarado ilegal pelo Tribunal Constitucional.
O caso espanhol foi classificado pelo Citizen Lab como o de maior envergadura analisado até agora, superior aos ataques feitos aos jornalistas da Al Jazeera (36 vítimas) ou a oposicionistas em El Salvador (35).
Para travar a impunidade face ao programa, os EUA já impuseram sanções ao seu fabricante, a empresa israelita NSO Group, vetando o seu acesso a tecnologia dos EUA, enquanto Israel aumentou o controlo sobre as exportações de tecnologia.
A empresa continua a defender que os seus produtos se destinam a perseguir terroristas e criminosos, se bem que não possa controlar a forma como os seus clientes os utilizam.
Em janeiro de 2022, o presidente da NSO, Asher Levy, apresentou a sua demissão, depois de se saber que o programa tinha sido utilizado pela polícia israelita para espiar cidadãos sem ordem judicial.
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