O ex-dirigente comunista, que deixou o partido em 2009, já depois do movimento dos renovadores, de João Amaral (1943-2003), e que levou à suspensão do histórico Carlos Brito, e à expulsão de Edgar Correia e Carlos Luís Figueira, em 2003, revela no livro que o então líder comunista, Carlos Carvalhas, lhe deu a entender que não ia haver sanções na reunião do Comité Central, onde vieram a acontecer.

Se numa entrevista à revista Visão, em 2000, elogiou o papel de Carvalhas para evitar divisões e estragos maiores numa fase “particularmente difícil” após a demissão de Edgar Correia da comissão política, três anos depois Domingos Lopes revela o papel do agora ex-líder.

“O Carlos, sem nunca o dizer expressamente, deu-me a entender que não ia haver sanções, o que me deixou satisfeitíssimo”, escreveu o dissidente comunista que, na reunião do dia seguinte do Comité Central, diz ter sido “dos primeiros a pedir a palavra” para se opor às sanções e apresentar a sua demissão daquele órgão.

Foi “um choque”, admitiu, sem entrar em mais pormenores sobre Carvalhas no processo de expulsões.

Olhando para esses dias, recordou que, após essas expulsões, “os que estava ‘tocados’ pela peste ‘renovadora’ ou ‘liquidacionista’ foram esquecidos e ficaram no limbo até deixarem de fazer parte do ativo” e “centenas e centenas de militantes deixaram o partido”.

Apesar do acordo parlamentar com o PS, e de alguns ganhos eleitorais, antes de 2019, Domingo Lopes considera que “o PCP vem definhando, infelizmente”, sem fazer uma análise à liderança de Jerónimo de Sousa.

Os jovens “não votam no PCP e não se sentem atraídos pelo modo como o partido faz política” e “a culpa é sempre dos outros e nunca da direção”.

Os resultados das legislativas de 2019 mostram, segundo alega, “uma queda significativa do partido”, com a perda de cinco deputados, e, “por outro lado, o mesmo ensimesmamento”, atribuindo-se a “responsabilidade dos resultados a fatores externos à direção”.

“O que revela uma incapacidade de julgar as orientações protagonizadas, isto é, uma espécie de anquilose própria da falta de rejuvenescimento”, lê-se no livro editado pela Guerra e Paz que entra no circuito livreiro em 04 de fevereiro.

E de Marcelo Rebelo de Sousa, o atual Presidente da República, o que diz Domingo Lopes, o comunista que promete continuar a sê-lo, ainda eu sem partido?

O dissidente comunista lembra que em maio de 1974 Marcelo era assistente universitário na Faculdade de Direito, frequentada por Domingos Lopes, dirigente da União de Estudantes Comunistas (UEC), numa altura em que militantes do MRPP fizeram um “julgamento popular” do ex-ministro da justiça de Salazar e professor Cavaleiro Ferreira.

“Cheirava-lhe que os ‘jovens guardas vermelhos’ do MRPP o pudessem sanear”, foi falar com Domingos Lopes: “O que é que ele tinha para me dizer? Uma coisa muito simples: ele estava totalmente do nosso lado, o que nos separava era o leninismo, considerava-se apenas marxista”.

Um episódio que, segundo escreveu, é “bem revelador do que viria a ser, mais tarde, a personalidade do então jovem assistente Marcelo Rebelo de Sousa”.