Nos últimos dias têm sido noticiados variados casos de possíveis abusos ou aproveitamentos de particulares que estão a ser vacinados contra a covid-19 e que não o deveriam ser para já.
Em cima da mesa está o que fazer quando sobram vacinas num determinado local de vacinação. Qual o plano "B" para se alguém faltar à chamada à vacina? Afinal, uma vez pronta para administrar, a vacina tem de ser administrada em alguém, sob pena de se desperdiçar.
O SAPO24 apresenta-lhe alguns dos casos mais populares e qual a resposta do governo de António Costa às múltiplas situações que poderão colocar em causa a hierarquização por grupos prioritários pensada, sendo que hoje o Ministério Púbico abriu inquéritos em relação a casos que envolvem vacinação contra a covid-19 de casos não prioritários.
"Inaceitável qualquer utilização indevida de vacinas", diz o Ministério da Saúde
Assim, em nota ontem divulgada à comunicação social, o Ministério da Saúde considerou “inaceitável qualquer utilização indevida de vacinas" contra a covid-19, alertando que este ato pode ser "criminalmente punível” e afirmando que foi pedido à Task Force que preparasse uma lista de suplentes para quando sobram vacinas.
"A operacionalização do Plano prevê que, no caso de, por circunstâncias imprevistas, não ser possível administrar todas as doses definidas numa determinada entidade, face às caraterísticas de conservação das vacinas e com o intuito de evitar a sua inutilização, as mesmas possam vir a ser administradas a pessoas não previstas inicialmente", pode ler-se no comunicado, referindo-se ao plano em vigor no momento.
No entanto, é deixada a indicação de que nestas situações "se deverão observar as prioridades definidas pelo Plano de Vacinação".
"Como tal, tendo em vista obviar a qualquer falta imprevista de pessoas numa entidade priorizada para vacinar, o Ministério da Saúde entendeu determinar que a Task Force reforce instruções para que as entidades responsáveis pela operacionalização do plano preparem, de antemão, uma lista de outras pessoas prioritárias a quem poderão administrar as vacinas, no caso de impossibilidade superveniente de alguma das pessoas inicialmente definidas, devendo, ainda, tal circunstância ser devidamente reportada", concluiu o Ministério da Saúde, que assim pretendeu clarificar quem deverá receber a vacina nestas situações de subsidiariedade.
Para além disto, é também recordado no comunicado do Ministério da Saúde que de forma a avaliar a correta aplicação dos critérios estabelecidos no plano de vacinação, a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) promoverá, a partir desta semana, auditorias de âmbito nacional.
Apesar disto, não obstando a esta resposta do governo, o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) veio lamentar o atraso do Ministério da Saúde em mandar elaborar uma lista de suplentes prioritários para a vacinação contra a covid-19.
“A nossa surpresa é só agora, mais de seis meses depois de se saber que se iria realizar um plano de vacinação, que o Ministério da Saúde tenha obrigado a que uma coisa básica seja posta no terreno”, disse à agência Lusa o secretário-geral do SIM, Jorge Roque da Cunha.
“Havendo, por exemplo, 30 vacinas disponíveis numa instituição, o que se tem de fazer é criar uma bolsa de suplentes para esse lote de vacinas” para “não haverá desperdício de vacinas”, acrescentou Jorge Roque da Cunha.
“Mas mais vale tarde do que nunca e mais uma vez apelamos que se planeie, que se trabalhe e que se evite a propaganda política em relação às vacinas”, defendeu, apelando também a que o Ministério da Saúde publique o número de vacinas por locais e a previsão, ainda que aproximada, de quando se irá completar a vacinação prioritária dos profissionais de saúde por hospitais e centros de saúde.
A bastonária da Ordem dos Enfermeiros saudou a criação de uma lista de outras pessoas prioritárias para vacinação, considerando que a utilização indevida de vacinas contra a covid-19 “mina a confiança das pessoas no sistema”. No entanto, Ana Rita Cavaco considerou que “a medida do Ministério da Saúde vem tarde, mas antes tarde do que nunca”.
“Isso [dizer que sobrou uma vacina] é um esquema, uma desculpa dizermos que sobrou uma vacina. Não há sobras de vacinas. Se as coisas forem organizadas, porque planear é antecipar cenários, não vamos ter estas situações”, vincou.
“Tem acontecido que algumas pessoas que estão previstas para vacinação iniciem sintomas, tenham testes positivos ou tenham qualquer outro tipo de impedimento e que não possam ser vacinados naquele dia”, explicou.
Portanto, defendeu, “as listas têm que ter sempre nomes supletivos para nós podermos administrar todas as vacinas que chegam aos locais, mas esses nomes supletivos têm de ser pré-definidos em pessoas que são prioritárias, não é em provedores de santas casas, não é em diretores de Segurança Social, não é primos, tios, amigos porque isso é errado”.
No entanto, segundo a bastonária da Ordem dos Enfermeiros, “é inegável que essas pessoas que fizeram a primeira dose da vacina têm de fazer a segunda, agora tem é que lhes acontecer alguma coisa”.
“Depois temos os bombeiros que ainda nem sequer iniciaram a vacinação, as forças de segurança, os estudantes de enfermagem que nem foram incluídos em qualquer grupo prioritário e que estão a ajudar nos lares e que estão a fazer ensinos clínicos nos hospitais e noutros locais expostos a doentes covid e isso não faz sentido”, lamentou Ana Rita Cavaco.
Já o comentador político Marques Mendes veio frisar que estes abusos que vão sendo conhecidos representam um "abalo na confiança dos cidadãos nas instituições", sendo de repensar os critérios penais associado a estes possíveis aproveitamentos em matéria de vacinas.
INEM e uma história contada em duas partes
Apesar de o governo considerar como "inaceitável qualquer utilização indevida de vacinas", a verdade é que têm sido noticiados alguns casos de possíveis abusos em diversos meios de comunicação.
Como tal, um dos mais paradigmáticos é o caso do INEM. Se primeiro a Associação Nacional de Emergência e Proteção Civil (APROSOC) denunciou, no dia 28 de janeiro, a vacinação de dezenas de profissionais não prioritários na sede do INEM, passados dois dias, a 30 de janeiro, seria a vez do Correio da Manhã avançar com a notícia de que funcionários de uma pastelaria tinham também sido vacinados pelo INEM.
Segundo a nota da APROSOC, o presidente do INEM, Luís Meira, “contrariou as indicações do Ministério da Saúde e vacinou dezenas de profissionais não-essenciais e que não são profissionais de saúde”.
"Pedro Coelho dos Santos, jornalista e assessor pessoal de Luís Meira, e seu amigo pessoal, Ana Gomes, assessora jurídica do presidente do INEM, bem como todos os diretores por Luís Meira nomeados, foram vacinados, tendo parte deles hoje recebido a segunda dose da vacina”, lê-se no comunicado da APROSOC, que referiu ainda outras pessoas vacinadas que não seriam do grupo prioritário.
Segundo o documento, o presidente do INEM “requisitou dezenas de vacinas a mais para imunizar funcionários do instituto, prestadores de serviços e colaboradores externos, parte dos quais seus amigos pessoais, violando as indicações do plano de vacinação” contra a covid-19.
“A lista de vacinação não-essencial circulou em formato Excel entre os diretores regionais e Luís Meira, numa tentativa de manter confidencial a atitude ilegal e que contraria as regras impostas por Marta Temido (ministra da Saúde)”, sublinhou a nota da APROSOC.
Para a APROSOC, “dezenas de vacinas foram usadas indevidamente privando médicos, enfermeiros e técnicos de saúde, entre outros elementos prioritários, de vacinação atempada, privilegiando um circuito de amizades”.
Em comunicado, o INEM desmentiu esta versão e negou “todas e quaisquer acusações de favorecimento pessoal” no seu processo de vacinação.
“O Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) solicitou apenas vacinas para os profissionais prioritários, tendo recebido as 1.174 doses de vacina anti-covid-19 Comirnaty® (Pfizer-BioNTech) solicitadas, que foram administradas a todos os profissionais prioritários que manifestaram interesse em ser vacinados”, indicou o comunicado do INEM.
De acordo com o documento, “iniciado o processo de vacinação, foram identificados profissionais prioritários que não preenchiam os critérios para poderem receber a primeira dose da vacina, de acordo com as indicações de segurança do fabricante (Pfizer), nomeadamente por apresentarem contraindicações, com diagnóstico ou presença de sintomas indicadores de covid-19, ou que tinham estado doentes com covid-19 há menos de 90 dias”.
“O processo de vacinação nos quatro centros de vacinação criados para o efeito, do ponto de vista logístico e da identificação dos profissionais a serem vacinados, foi conduzido pelas Delegações Regionais do INEM”, segundo a nota do instituto.
“Considerando o tempo reduzido para administração da vacina, que após a descongelação deve ser administrada no prazo máximo de 120 horas, bem como as recomendações da Agência Europeia do Medicamento de que qualquer vacina não utilizada deveria ser descartada após a diluição, acrescido do facto de ser possível extrair seis doses por frasco, e não apenas as cinco doses inicialmente estipuladas (de acordo com as indicações do INFARMED), foi possível administrar as doses sobrantes aos profissionais do INEM que dão suporte à atividade de Emergência Médica, para evitar o desperdício destas”, segundo a nota.
De acordo ainda com o comunicado do INEM, “desta forma, para além das 1.174 vacinas solicitadas, foi possível administrar mais 92. Os prazos estipulados para administração das vacinas após descongelação e diluição, bem como a logística de todo este processo de vacinação, nomeadamente a exigência de condições de assepsia na sua preparação, não permitiriam a administração destas doses sobrantes a pessoas externas, e em ambientes externos ao INEM”.
Ainda assim, segundo o INEM, “os frascos que não foram abertos (12) foram cedidos a Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES) da região centro e sul, em articulação com as ARSLVT e Centro, após confirmação que existiam condições para as vacinas serem administradas dentro dos prazos estipulados”.
Por outro lado, se esta situação já causava algumas nos critérios que estariam a ser adotados pelo INEM, no sábado, a revelação do Correio da Manhã iria fazer rolar a cabeça de António Barbosa, diretor regional do INEM no Norte, depois de assumir que tinha autorizado a vacinação de 11 funcionários de uma pastelaria próxima ao INEM no Porto. No entanto, António Barbosa rejeitou que se tratasse de favorecimento, mas sim de uma tentativa de evitar o desperdício de doses de vacina que se perderiam.
De acordo com o Correio da Manhã, que avançou a notícia, "todo o 'staff' do estabelecimento, situado na porta ao lado do INEM, recebeu já as duas doses da vacina", referindo-se aos funcionários da pastelaria em questão. Entretanto, o conselho diretivo do INEM deixou cair o diretor regional no Norte, que tinha colocado o lugar à disposição.
Segundo António Barbosa, estavam disponíveis mais 11 vacinas preparadas para o pessoal do INEM do que o que se veio a verificar ser necessário e a alternativa seria o desperdício.
“Atendendo o que está descrito na norma, a alternativa a vacinar cidadãos próximos seria descartar, literalmente deitar ao lixo”, disse, assinalando que obedeceu apenas a um critério de “disponibilidade e proximidade”.
Em resposta a pedidos de esclarecimento da Lusa, António Barbosa explicou que “os prazos estipulados para administração das vacinas após descongelação e diluição, bem como a logística de todo este processo de vacinação, nomeadamente a exigência de condições de assepsia na sua preparação, não permitiriam a administração destas doses sobrantes a pessoas externas, e em ambientes externos ao INEM”.
Desde Reguengos de Monsaraz, passando por Setúbal e terminando em Arcos de Valdevez
Em Reguengos de Monsaraz, o presidente da Câmara Municipal, José Calixto, foi incluindo na lista de cidadãos prioritário nesta fase. A razão? O autarca é também líder da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva (FMIVPS), que é responsável por um lar de idosos.
“O preenchimento dos critérios para vacinação dos seus profissionais e/ou utentes é uma responsabilidade de cada instituição”, explicou o Ministério liderado por Marta Temido, numa resposta enviada à agência Lusa, na sequência da notícia do jornal Expresso no dia 21 de janeiro sobre a vacinação do presidente da Câmara Municipal de Reguengos de Monsaraz, sem alegadamente preencher os critérios de inclusão nos grupos prioritários desta fase.
Em comunicado enviado à agência Lusa, a FMIVPS explicou ter indicado para serem vacinados “todos os utentes, funcionários, administrativos, técnicos e dirigentes que têm contacto regular direto com os utentes”. Segundo a instituição, essa comunicação foi dada em “obediência às indicações recebidas pelas autoridades de saúde e da segurança social”.
No comunicado, a FMIVPS realçou ter conhecimento de que “os membros das direções” de instituições em “todo o país” estão a ser vacinados nesta fase e que “pelo menos isso acontece” na região do Alentejo. E insistiu que decidiu “seguir a recomendação da CNIS e submeter a vacinação de todos os membros do conselho de administração em exercício regular de funções, porque têm um contacto regular, direto e próximo com os utentes”.
A FMIVPS assegurou também que José Calixto exerce “de forma voluntária o cargo” de presidente do conselho de administração da fundação, “acompanha de forma diária o trabalho desenvolvido” e tem “contacto com os seus utentes”.
“A sua vacinação, além de corresponder ao determinado no Plano Nacional de Vacinação das Estrutura Residencial para Idosos (ERPI) pelas autoridades de saúde e seguir a recomendação da CNIS, foi uma medida exigida para salvaguarda da saúde e da vida dos utentes da fundação”, assinalou a fundação.
Para a instituição, as notícias de que José Calixto foi “vacinado contra a determinação das autoridades de saúde procurando obter uma situação de privilégio injustificado são falsas e gravemente prejudiciais para o seu bom nome, honra e consideração pessoal, profissional e política” e prejudicam a fundação.
“A perseguição de que a fundação e o presidente do conselho de administração vêm sendo vítimas, por constituírem atos ignóbeis no contexto da tragédia que assola o país e o mundo, será, por isso, objeto das respostas adequadas nas instâncias competentes que, não reparando o prejuízo já causado, reporão, pelo menos, a verdade”, acrescentou.
Contactado pela Lusa, o coordenador da Task Force do plano de vacinação da covid-19, Francisco Ramos, disse não ter “nada a declarar” sobre o caso, mas ao Observador reconheceu que José Calixto “não deveria ter sido vacinado” e que “esteve mal” enquanto membro da administração do lar.
Já o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, António Lacerda Sales, admitiu que possa existir justificação para o autarca de Reguengos de Monsaraz ter recebido a primeira dose da vacina devido à sua ligação à direção do estabelecimento residencial para idosos.
"Se faz parte da direção" de um lar, "a situação, ainda assim, transforma-se e, talvez, por isso, tenha sido vacinado e, então, assim, justificar-se-á", afirmou António Lacerda Sales, em declarações aos jornalistas, à margem de uma ação no Instituto Português do Sangue e da Transplantação, em Lisboa.
A afirmação do secretário de Estado Adjunto e da Saúde teve lugar depois de ter sido informado da ligação de José Calixto à instituição, uma vez que, momentos antes, havia declarado, perante a notícia do Expresso, que o autarca “deveria ter sido vacinado na fase correspondente, que seria a dos serviços críticos”.
Por outro lado, em Setúbal, a diretora do Centro Distrital de Setúbal do Instituto da Segurança Social (ISS) pediu no final da semana passada a demissão, que já foi aceite, na sequência da vacinação indevida de 126 funcionários daquele organismo público, informou o Instituto da Segurança Social.
Em comunicado, o Instituto da Segurança Social refere que o pedido de demissão da diretora do Centro Distrital de Setúbal, Natividade Coelho, “foi aceite pelo Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social".
Na quinta-feira, dia 27 de janeiro, na sequência de uma notícia divulgada pela SIC sobre a alegada vacinação indevida de 126 funcionários da Segurança Social de Setúbal, o Instituto da Segurança Social abriu um processo de averiguações urgente com vista ao apuramento dos factos.
“A aplicação do Plano de Vacinação contra a covid-19, em especial a vacinação de residentes e profissionais de lares, envolve diversas entidades”, esclareceu a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), adiantando que o ACES Arrábida (Agrupamento de Centros de Saúde Arrábida) “recebeu a listagem onde constava o nome da instituição, bem como o número de pessoas a vacinar, tendo, assim, vacinado 126 pessoas da referida instituição, no dia 21 de janeiro”.
“Compete às entidades/instituições que acolhem idosos fazer o levantamento, identificação e listagem das pessoas a vacinar e aos Agrupamentos de Centros de Saúde proceder à vacinação das pessoas identificadas por cada instituição”, referiu a ARSVLT, em resposta a perguntas da agência Lusa.
Subindo um pouco no país, a norte, em Arcos de Valdevez, Francisco Araújo, presidente da Assembleia Municipal de Arcos de Valdevez e também provedor da Santa Casa da Misericórdia da vila, não fazendo parte de grupo prioritário, foi também vacinado.
Terão sobrado doses de vacina e a enfermeira responsável pela vacinação no local, que teria conhecimento de problemas cardiovasculares do autarca, tê-lo-á contactado. “Estava no meu gabinete e a responsável telefonou-me a perguntar se queria ser vacinado porque havia sobras”, contou Francisco Araújo ao Observador, sublinhando que "nada tem a ver com a Câmara".
Para além destes casos, ainda no plano das autarquias, Elisabete Adrião, vereadora socialista na Câmara Municipal do Seixal, que é também técnica de ação social, tomou a vacina contra a covid-19 um dia depois de se tornar responsável pelo Núcleo Local de Inserção de Sesimbra, noticiou a Visão a 21 de janeiro . O momento foi partilhado no Facebook, mas já foi entretanto apagado. À Visão, fontes do PS/Seixal adiantaram que a autarca terá usufruído do facto de ter havido "vacinas a mais" e por “ordem de chefias superiores”.
Marco Fernandes, presidente do PS/Seixal, segundo a Visão, “quis ouvir de viva voz a autarca, convocando de urgência o órgão político local, onde as pessoas têm direito a exercer a sua defesa”.
Santa Casa da Misericórdia e a vacinação de "todos os órgãos sociais"
Já em Bragança, o lar da Santa Casa da Misericórdia, terá decidido vacinar "todos os órgãos sociais" da instituição, incluindo quem "nem perto dos doentes" esteja, afirmou Ana Rita Cavaco, bastonária da Ordem dos Enfermeiros ao Público no dia 22 de janeiro, referindo também que todas estas denúncias de vacinação a “motoristas, administrativos que não têm contacto nenhum com os doentes covid-19” estavam a ser dadas a conhecer ao Ministério da Saúde, à Task Force e às entidades oficiais.
Ademais, em Messejana, no Alentejo, Manuel Ruas, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Messejana, foi também vacinado, a par da sua vice-provedora. Manuel Ruas não sente que transgrediu e recusa qualquer aproveitamento. “Não encapotei nada”, sublinhou também ao Público.
Na lista enviada pelo lar de Messejana, estavam originalmente 99 nomes, mas apenas 62 foram validados, incluindo o do provedor e da vice-provedora. Manuel Ruas justifica a sua vacinação pelas inúmeras vezes que tem desempenhado tarefas presencialmente no lar. No entanto, quanto à vice-provedora, reconheceu que a mesma "tem ido pouco" ao lar, mas diz que tem de passar a ir mais e por isso foi vacinada. “No início não pretendia ser vacinado, mas com o agravamento da situação cheguei à conclusão que tinha que haver uma cúpula vacinada”, rematou.
O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Messejana garantiu ainda que falou com alguns colegas de outras 'santas casas' e recebeu a indicação que estavam a vacinar duas a três pessoas por direção. Como exemplos deu a Santa Casa da Misericórdia de Aljustrel e a de Almodôvar.
A norte, Famalicão, Águeda e Braga também espoletam possíveis vacinações indevidas
O administrador do Hospital Narciso Ferreira, em Vila Nova de Famalicão, negou hoje “qualquer fraude” no processo de vacinação na instituição, garantindo que a mulher e a filha foram vacinadas porque se voluntariaram para ajudar no combate à pandemia de covid-19.
Em comunicado enviado à Lusa, Salazar Coimbra acrescentou ainda que ele próprio foi vacinado porque é diretor clínico do hospital,
“Não existe, assim, qualquer fraude no processo de vacinação. Aliás, sempre se diga que outros familiares de outros trabalhadores que colaboram com a instituição foram igualmente vacinados”, afirmou.
Na edição de hoje, o Correio da Manhã dá conta de alegada vacinação indevida da mulher e filha de Salazar Coimbra, deixando para trás cerca de 20 médicos, enfermeiros e outros profissionais que trabalham no internamento covid-19.
O mesmo jornal acrescenta que na lista enviada à Administração Regional de Saúde do Norte,a mulher de Salazar Coimbra consta, erradamente, como sendo médica e que a filha do diretor clínico, apesar de ser realmente médica desempenha a função no hospital de Guimarães.
Deste modo, a mulher do diretor clínico “iniciará esta colaboração logo que a vacina produza o efeito” e integrará uma equipa que está na linha da frente na prestação de cuidados a doentes afetados pela pandemia.
Quanto à “errónea referência e identificação” em relação à mulher como médica, o administrador do hospital disse que foi um “mero lapso dos serviços administrativos, o qual poderá ter sido motivado por mero desconhecimento, em nada contendendo com o processo em causa”.
Em relação à filha, Salazar Coimbra referiu que é médica e que também se disponibilizou “de forma altruísta” para reforçar a unidade de doentes covid-19 do Hospital Narciso Ferreira, “em virtude da extrema necessidade de profissionais capazes de permitir uma resposta urgente ao elevado número de doentes na unidade”.
O diretor-clínico sublinhou que o hospital “tinha e tem necessidade de profissionais que cubram todas as carências no atual cenário pandémico, motivo pelo qual aceitou a disponibilidade da profissional em causa, integrando-a no quadro de médicos para a unidade covid-19 na linha da frente”.
Não obstante, foram também vacinados na primeira fase trabalhadores que exercem funções de motorista e portaria, porque, explica o administrador, estão incluídos na lista de trabalhadores das alas de tratamento à covid-19, “encontrando-se nas prioridades indicadas pelo Ministério da Saúde", aludindo também ao facto de que todos os enfermeiros da ala covid-19, urgência, gastroenterologia, anestesia, pneumologia, otorrino e bloco operatório foram vacinados.
“Apenas os enfermeiros que prestam serviço nos cuidados continuados não foram vacinados logo de imediato, em resultado de um surto de que foram alvo. Na semana passada foram também estes todos vacinados. Em suma, estão todos os enfermeiros vacinados”, assegura.
Também num hospital, mas em Braga, a administração assumiu hoje que logo no início da vacinação vacinou a 29 de dezembro, um informático e uma psicóloga, para “não se desperdiçar vacinas que seriam inutilizáveis num espaço temporal de breves minutos”, No entanto, a administração sublinhou que aqueles dois profissionais, apesar de não prioritários, “prestam assistência em todo o hospital, incluindo áreas covid".
Por fim, a Ordem dos Enfermeiros denunciou também uma alegada vacinação indevida de várias pessoas, incluindo um padre, em Águeda. João Paulo Sarabando Marques, pároco em questão, indicou ter recebido a vacina por indicação da Fundação da Nossa Senhora da Conceição, que gere dois dos lares a que presta assistência religiosa.
“Disseram-me que eu, para continuar a lá ir, tinha de ser vacinado para que não houvesse o risco de eu trazer o vírus de fora”, declarou, sublinhando que os lares em questão, um em Valongo do Vouga e o outro em Macinhata do Vouga, “nem sequer são da paróquia", afirmou.
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