A última greve dos magistrados judiciais ocorreu em finais de outubro de 2005, durante o primeiro governo de José Sócrates, e surgiu em protesto contra a política do executivo socialista de redução das férias judiciais, congelamento da progressão das carreiras, alteração aos estatutos de aposentação e estatuto sócio-profissional.
Na altura, o Conselho Superior da Magistratura (CSM), órgão de gestão e disciplina da classe, lamentou o "ambiente de crispação" no sistema judicial, mas considerou lícito o exercício do direito à greve pelos juízes, considerando que os magistrados judiciais têm uma "dupla condição de titulares de órgãos de soberania e de profissionais de carreira que não dispõem de competência para definir as condições em que exercem as suas funções".
Em declarações recentes à Lusa, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que é presidente por inerência do CSM, considerou que a greve dos juízes transmite um clima de crispação e disse que tudo faria para que seja encontrada uma solução para dissipar o diferendo com o Governo.
Mais de uma década depois, e também durante um governo do PS, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) mobilizou os magistrados para uma maratona de 21 dias de paralisação, que se prolongam entre terça-feira (com uma greve geral, em que todos os tribunais são abrangidos) e paralisações parcelares até outubro de 2019, mês em que deverá efetuar-se eleições legislativas.
Em causa está a revisão do Estatuto da classe, que não contempla questões remuneratórias e de carreira há muito reivindicadas.
A greve foi convocada para todos os juízes em funções em todos os tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional e Tribunal de Contas, mas, à exceção de 20 de novembro (greve geral), a paralisação será parcial e executada apenas em alguns tribunais,
O primeiro dia de greve parcial dos juízes, agendado para quarta-feira, vai afetar o funcionamento de tribunais e secções em Almada, Aveiro, Coimbra, Évora, Lisboa e Porto, segundo indicação do sindicato liderado pelo desembargador Manuel Soares e que conta com 2.300 associados.
O protesto previsto para quarta-feira abrangerá os juízes do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, Tribunal Marítimo, Tribunal da Propriedade Intelectual, tribunais de execução de penas de Coimbra, Évora, Lisboa e Porto e os tribunais administrativos e fiscais de Almada e Aveiro.
A ASJP alerta ainda que existem secções do Supremo Tribunal de Justiça, Supremo Tribunal Administrativo, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas, Tribunais da Relação de Porto, Coimbra, Évora, Guimarães e Lisboa e Tribunal Central Administrativo Norte e Sul que se reúnem às quartas-feiras.
Insatisfeitos com a proposta de Estatutos aprovada no parlamento, por não contemplar matérias remuneratórias, os juízes alegam que foram "desconsiderados no processo de revisão dos Estatutos”, quando em causa está “uma lei fundamental para a organização e equilíbrio dos poderes do Estado, para a Justiça e para a garantia do direito fundamental de acesso a um tribunal independente”.
Entende a ASJP que a atual proposta de Estatuto não resolve bloqueios na carreira com quase três décadas, "prolongando, com custos sociais desnecessários, um conflito que se arrasta já há demasiado tempo".
A ASJP lançou, entretanto, uma petição pública a favor da classe que será entregue no dia 13 de dezembro ao Presidente da República, ao presidente da Assembleia da República, ao primeiro-ministro, à ministra da Justiça e aos grupos parlamentares.
Apesar de o começo da greve estar iminente, com a entrega do pré-aviso de greve no CSM, e de a proposta de revisão do Estatuto estar no parlamento, têm decorrido diligências na última semana com vista a resolver o diferendo entre juízes e Governo, que passaria pela eliminação do teto salarial e integração do subsídio de compensação na remuneração, com vantagens fiscais.
Em 05 de novembro, após entregar o pré-aviso de greve no CSM, o presidente da ASJP, Manuel Soares, manifestou-se convicto de que o protesto a iniciar terá uma boa adesão, ao mesmo nível da greve ocorrida há 13 anos, mas vincou que o que mais deseja é que seja encontrada uma solução que permita levantar o aviso de greve.
Já hoje de manhã, a ASJP declarou-se disponível para parar a greve quando “perceber que é ouvida” e houver um compromisso “assumido e claro” de resolver os problemas da classe.
“Estamos determinados, mas somos responsáveis. Até hoje à noite podemos desconvocar a greve se houver um compromisso assumido e claro de resolver os problemas que existem, que são de natureza remuneratória – não escondemos isso, nem temos vergonha de dizer isso –, mas que também não são só dessa natureza”, afirmou Manuel Soares.
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