Em esclarecimentos à Lusa, Cristina Gonçalves, chefe da divisão de Cultura, e arqueóloga, da Câmara de Benavente (distrito de Santarém), afirmou que o forno em causa “aparenta ser integralmente construído com tijolo de dois furos que ainda hoje é fabricado, sendo utilizada, como ligante, uma argamassa argilosa”.

Estes pormenores, “ainda perfeitamente visíveis no atual derrube”, levam a enquadrar a estrutura “na tipologia dos designados fornos ‘telheiros’, para a produção de telha e/ou tijolo, evidenciando uma cronologia contemporânea”, afirma.

A destruição do designado forno do Telhal, no Porto Alto, foi denunciada por um munícipe no final de outubro e esta semana alvo de um protesto endereçado ao presidente da Câmara de Benavente pelo Grupo Internacional de Historiadores e Estudantes de História.

Na missiva, enviada também à Lusa, o grupo manifestava “profunda revolta pela falta de cuidado/interesse na proteção de uma peça fundamental da história do país, um dos primeiros fornos de barro romano em Portugal” e lamentava a ausência de “qualquer interesse” na sua proteção.

Também para Cristina Gonçalves, “muito embora o forno do Telhal, associado à produção de telhas, se enquadre numa cronologia contemporânea, a preservação da estrutura poderia ser salvaguardada enquanto testemunho da arquitetura industrial rural tradicional”.

Augusto Marques, presidente da junta de freguesia de Samora Correia e membro dos órgãos sociais do Centro de Bem Estar Social Padre Tobias, instituição proprietária do terreno onde se encontrava o forno, disse à Lusa que a destruição “não foi propositada”, tendo ocorrido durante a deposição de terras retiradas de um terreno contíguo, onde está a ser construído um 'eco resort'.

Augusto Marques afirmou que o forno, destinado a “cozer telha para habitações”, estava já “bastante deteriorado” e com sinais de várias reparações “com materiais recentes”.

Contudo, constatada a sua destruição, a instituição esteve no local com um gabinete de arquitetura e vai contactar empresas de restauro para ser estudada a possibilidade de reconstrução, adiantou.

Cristina Gonçalves afirmou que o forno, “com estrutura basal, de formato quadrangular, encimado por uma cúpula”, se encontra num local que, até às intervenções dos serviços de hidráulica para regularizar os percursos fluviais no vale do Tejo, estava sujeito a cheias.

Segundo a arqueóloga, há fornos do período romano ao longo da margem esquerda do Tejo, nomeadamente no concelho de Benavente, que, desde a década de 1980, têm sido alvo de intervenções arqueológicas, nas quais tem participado juntamente com o arqueólogo Clementino Amaro.

“No entanto, as olarias romanas, por regra, estão derrubadas e totalmente dissimuladas no terreno, sendo apenas identificadas na sequência de prospeção arqueológica, ou localizadas em resultado de obras públicas ou privadas, como foi o caso da identificação dos fornos romanos da Garrocheira, cortados por uma retroescavadora, no decurso da construção do canal de rega de Salvaterra de Magos nos anos sessenta do século passado”, afirmou.

Segundo Cristina Gonçalves, “atualmente estão identificadas no concelho de Benavente duas estruturas de fornos romanos, a olaria romana da Garrocheira, centro de produção anfórica, que integra o projeto de investigação já há alguns anos, e, num projeto iniciado este ano, um forno romano na herdade de Monte dos Condes”.

Nelson Lopes, o munícipe que se deparou com a destruição do forno do Telhal, disse à Lusa que se fundamentou na descrição feita pelo historiador samorense Camilo Neves Martins e no facto de o estado de abandono em que se encontrava ter sido levado várias vezes a reuniões da Assembleia de Freguesia e da Assembleia Municipal, sem que nunca fosse posta em causa a atribuição de origem romana.

“Mas, sendo ou não, tinha um peso histórico e fazia parte da memória coletiva. Devia ter sido preservado”, declarou.

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