Partícula elementar abundante no Universo mas esquiva, o neutrino não tem carga elétrica, quase não tem massa e interage apenas fracamente com a matéria.

Os neutrinos são de particular interesse para os cientistas porque são “mensageiros cósmicos especiais”, explica Rosa Coniglione, investigadora do Instituto Italiano de Física Nuclear, num comunicado de imprensa que acompanha a publicação de um estudo na revista Nature divulgado hoje.

Os acontecimentos mais violentos do Universo – como a explosão de uma supernova, a fusão de duas estrelas de neutrões ou a atividade em torno de buracos negros supermassivos – geram os chamados neutrinos de “energia ultra-alta”.

Como estas partículas interagem muito pouco com a matéria, podem escapar das zonas densas que as produziram e viajar em linha reta pelo Universo. Isto fornece informação inestimável sobre os fenómenos astrofísicos que lhes deram origem, informação que é inacessível utilizando métodos mais convencionais.

Estas partículas “fantasma” são extremamente difíceis de detetar. Para apanhar qualquer uma delas em voo, é necessário um enorme volume de água – pelo menos um quilómetro cúbico, o equivalente a 400.000 piscinas olímpicas. Como o Mediterrâneo, onde se encontra o “Cubic Kilometre Neutrino Telescope (KM3NeT)”.

Ainda em construção, o KM3NeT está repartido por dois locais: ARCA, dedicado à astronomia de alta energia, a 3.450 metros de profundidade ao largo da Sicília (Itália), e ORCA, otimizado para estudar as propriedades fundamentais do neutrino, a 2.450 metros de profundidade ao largo de Toulon (França).

Cabos com várias centenas de metros de comprimento e equipados com fotomultiplicadores capazes de amplificar quantidades muito pequenas de luz são ancorados no fundo do mar a uma distancia regular.

Em 13 de fevereiro de 2023, um muão, um eletrão pesado produzido por um neutrino, “atravessou todo o detetor ARCA, induzindo sinais em mais de um terço dos sensores ativos”, segundo a KM3NeT, uma colaboração que reúne 350 cientistas de 21 países.

Na sua origem, o neutrino tinha uma energia de 220 peta eletrões volt (PeV), ou seja, 200 milhões de mil milhões de eletrões volt. Um valor colossal, nunca antes observado na Terra.

“É mais ou menos a energia de uma bola de pingue-pongue que cai de uma altura de um metro”, mas contida ‘numa única partícula elementar’, explicou Aart Heijboer, professor do Instituto Neerlandês de Física Subatómica (Nikhef) e membro do KM3NeT, numa conferência de imprensa.

Com um nível de energia tão elevado, a origem do neutrino só pode ser cósmica. A distância do acontecimento que o produziu “é desconhecida”, mas “o que temos quase a certeza é que não veio da nossa galáxia”, sublinhou o investigador Damien Dornic.