"Riscos de desumanização" foi para isso que alertou o realizador britânico Jonathan Glazer, distinguido na noite de ontem com o Óscar de Melhor Filme Internacional por "A zona de interesse", num discurso em que lembrou as vítimas da guerra entre Israel e o Hamas.
O alerta não é de ignorar, pode é até considerar-se tardio. Ainda hoje a Índia anunciou uma alteração à Lei da Cidadania (CAA) que tem recebido muitas críticas por ser considerada antimuçulmana, a poucas semanas das eleições gerais em que o Governo nacionalista hindu procura obter um terceiro mandato.
Estas notícias no primeiro dia do ramadão muçulmano. Quanto a este último, António Guterres assinalou o início do mês sagrado, “um período em que os muçulmanos em todo o mundo celebram e difundem os valores da paz, reconciliação e solidariedade”, para recordar que, apesar desse momento, os ”assassínios, bombardeamentos e o derrame de sangue continuam em Gaza”. E, assim, apelar ao silenciamento das armas no Sudão e em Gaza.
Irónico que no primeiro dia do jejum muçulmano, comida e ajuda tenha chegado pelos céus, a Gaza. A Força Aérea norte-americana fez hoje um novo lançamento de ajuda humanitária sobre o norte de Gaza destinado aos civis afetados pela ofensiva militar israelita, anunciou o Comando Central dos Estados Unidos (Centcom).
Se pelos céus vem alguma esperança, ou pelo menos alguma sobrevivência, pelos mares as notícias são piores. Navios russos da Frota do Pacífico chegaram hoje ao porto iraniano de Chabahar para participar em exercícios navais conjuntos com o Irão e a China, anunciou o Ministério da Defesa da Rússia.
Já em plena quaresma católica, as palavras do líder desta Igreja em relação à guerra do leste europeu caíram mal. E, agora, a diplomacia ucraniana convocou hoje o representante do Vaticano em Kiev para protestar contra as declarações do Papa, que no sábado apelou às partes em conflito na Ucrânia para terem "a coragem de levantar a bandeira branca" e negociar.
A diplomacia de Kiev acusou o Papa de “legalizar o direito dos mais fortes” e encorajá-los a “continuar a ignorar o direito internacional”. “O chefe da Santa Sé deveria ter enviado sinais à comunidade internacional sobre a necessidade de unir forças imediatamente para garantir a vitória do bem sobre o mal, e apelar ao agressor, não à vítima”, afirmou o comunicado. O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, já tinha reagido duramente no domingo aos comentários do Papa, garantindo que o seu país nunca usaria a bandeira branca face a Moscovo.
Ainda nessa latitude, desumanização pode ser uma boa metáfora para o processo de que foi alvo Navalny durante o período em que esteve preso até morrer. Mas a sua morte lembrou de tal forma os russos da sua humanidade que Moscovo tema que as suas armas de desumanização não sejam suficientes. E, a justiça russa equiparou hoje fotografias do falecido opositor russo Alexei Navalny a "símbolos extremistas" por considerar que a sua exibição constitui propaganda a uma "organização extremista".
No dia em que tudo isto acontece, a bandeira nacional da Suécia foi hasteada na sede da NATO, consolidando o país como o 32.º membro da aliança, dois anos depois da invasão da Ucrânia pela Rússia ter mudado a estratégia militar do Estado nórdico. O processo de desumanização russo, conseguiu assim, fazer com que a Suécia rompesse com décadas de neutralidade pós-II Guerra Mundial quando aderiu formalmente à NATO na quinta-feira passada.
A sua vizinha Finlândia já tinha aderido em abril de 2023 num outro movimento histórico que pôs fim a anos de não-alinhamento militar.
*Com Lusa
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