O Estado português vai pagar uma indemnização à família do cidadão ucraniano que foi morto em 12 de março em instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no aeroporto de Lisboa.

A decisão foi anunciada hoje no final do Conselho de Ministros pela ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.

De acordo com Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, "o que sucedeu no dia 12 de março em instalações do Estado no Aeroporto de Lisboa e que determinou a morte do cidadão ucraniano Ihor é absolutamente inaceitável. Está em total contradição com aquilo que são os padrões de respeito pelos Direitos Humanos que Portugal adota, que as suas forças e serviços de segurança têm a obrigação estrita de respeitar".

A morte de Ihor Homeniuk nas instalações do SEF levou à acusação de três inspetores daquele serviço por homicídio qualificado, cujo julgamento vai começar no próximo ano.

Em comunicado o Conselho de Ministros refere que “decidiu assumir, em nome do Estado, a responsabilidade pelo pagamento de uma indemnização pela morte de um cidadão à sua guarda e em instalações públicas”.

A nota adianta que perante a morte de Ihor Homeniuk, por factos ocorridos no espaço equiparado a Centro de Instalação Temporária do Aeroporto de Lisboa em 12 de março, “o Governo assume a responsabilidade pelo pagamento de uma indemnização à viúva e aos dois filhos menores” do cidadão.

O ministro da Administração Interna afirmou ainda que a morte por agressão do cidadão ucraniano em instalações do Estado no aeroporto de Lisboa lhe provocou “um murro no estômago” e que foram tomadas todas as medidas necessárias.

Segundo o ministro, que recentemente tem sido alvo de criticas por parte dos partidos da oposição, “tudo o que tem sido determinado relativamente a esta terrível situação deve-se à atuação do Ministério de Administração Interna”, referindo que foi o primeiro a lamentar e a agir “quando muitos estavam desatentos”.

Sobre a indemnização à viúva e aos dois filhos de Igor Homenyuk, que será definida pela provedora de Justiça, o ministro disse que se "insere na boa tradição do Estado português”.

O ministério adotou “as necessárias ações visando o apuramento da verdade” sobre a morte do cidadão e, segundo Eduardo cabrita, o assunto teve “uma atenção por parte da comunidade muito inferior aquilo que a sua gravidade justificava”.

A diretora do SEF, Cristina Gatões, que em novembro admitiu que a morte do cidadão ucraniano, da qual foram acusados três inspetores, foi resultado de "uma situação de tortura evidente", demitiu-se na quarta-feira, nove meses após os acontecimentos.

No mandato de Cristina Gatões, três inspetores do SEF foram acusados de homicídio pela morte do cidadão ucraniano, incidente que deu origem à demissão do diretor e do subdiretor de Fronteiras do aeroporto.

O ministro da Administração Interna considerou que a diretora do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras fez bem demitir-se, justificando que o Governo não o poderia ter feito sem haver responsabilidade criminal ou disciplinar.

“O relatório da Inspeção-Geral da Administração Interna indicia 12 pessoas, não a indiciou, mas considero que a senhora diretora nacional fez bem em entender dever cessar funções”, afirmou Eduardo Cabrita em conferência de imprensa no final do Conselho de Ministros.

Na quarta-feira, o Ministério da Administração Interna comunicou que a diretora do SEF, Cristina Gatões, tinha pedido da demissão, mas sem qualquer referência ao homicídio do cidadão ucraniano, há nove meses, em instalações do SEF no aeroporto de Lisboa.

Durante a conferência de imprensa, que foi sobretudo marcada pelo tema, o ministro foi repetidamente questionado sobre o motivo para o Governo não ter decidido afastar a agora diretora cessante.

“Uma pessoa dessas funções só pode ser afastada por responsabilidade criminal, por responsabilidade disciplinar ou por alteração de orientação política”, explicou o governante, justificando que não foi o caso.

O ministro da Administração Interna disse ainda que está de consciência tranquila em relação ao seu mandato, sublinhando que a decisão de se afastar do Governo cabe ao primeiro-ministro.

Nos últimos dias, a continuidade de Eduardo Cabrita no cargo de ministro foi questionada por alguns partidos políticos, mas o governante afastou a possibilidade de se demitir.

“Tal como estou aqui porque o senhor primeiro-ministro entendeu nessa altura tão difícil [em outubro de 2017] pedir a minha contribuição nessas novas funções, também relativamente a esta matéria só o primeiro-ministro lhes poderá responder”, afirmou.

Questionado sobre se continua a ter a confiança política de António Costa, o ministro da Administração Interna afirmou que só o primeiro-ministro poderia responder, mas fazendo um balanço dos seus três anos de mandato, disse estar de consciência tranquila e até orgulhoso.

"Se não funciona, este SEF não serve"

O Presidente da República defendeu hoje que é preciso apurar se a morte de um cidadão ucraniano em instalações do SEF corresponde a uma atuação sistémica e que, se assim for, há que mudar a instituição e protagonistas.

"Se há uma realidade como um todo que enquanto sistema se vem a concluir que não funcionou, não funciona, e não é em casos isolados, globalmente não funciona, então tem de ser substituída por outra. E quem protagonizou a passada provavelmente não tem condições para protagonizar a futura", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa, em resposta aos jornalistas, no Palácio de Belém, em Lisboa.

"Importa verificar se há ou não há um pecado mortal do sistema. Se há, então este SEF não serve e tem de se avançar para uma realidade completamente diferente", reforçou o chefe de Estado.

Confrontado com a posição assumida hoje pela candidata presidencial Ana Gomes segundo a qual o Presidente da República também tem de tirar conclusões sobre a atuação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no caso da morte do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk, em março, no aeroporto de Lisboa, Marcelo Rebelo de Sousa começou por referir que falou do assunto na altura.

"Eu disse que era preciso investigar até às últimas consequências o que se tinha passado, nomeadamente em termos criminais, referiu.

Depois, o Presidente da República assinalou que "o Governo deliberou hoje atribuir uma indemnização à família" de Ihor Homenyuk, assumindo "uma responsabilidade pelo menos objetiva" por parte do Estado pela sua morte.

"Mas há aqui outro problema, e esse problema é mais grave e mais importante: é saber se isto é um ato isolado ou é um sistema. Se isto é um ato isolado, em que há determinados responsáveis eventualmente considerados como tal no fim do processo, é uma coisa. Se isto é uma forma de funcionamento do SEF é outra coisa e é muitíssimo mais grave, e é isso que tem de ser apurado rapidamente", defendeu.

Segundo o chefe de Estado, "se for um procedimento comum, se for uma atuação sistemática, o que está em causa é o próprio SEF, e o Governo será o primeiro a ter de reconhecer que uma instituição assim não pode sobreviver nos termos em que tem existido"-

"É todo o sistema que está errado, e é preciso substituí-lo globalmente por outro. E, se isso vier a ser apurado, naturalmente, depois surge uma outra questão: e a questão é a de saber se aqueles que deram vida ao sistema durante um determinado período podem ser protagonistas do período seguinte, se não devem ser outros os protagonistas do período seguinte", acrescentou.