António Guterres deixou esta mensagem na 25.ª Cimeira Ibero-Americana, em Cartagena das Índias, na Colômbia, numa intervenção que foi fechada à comunicação social, mas que cerca de duas horas mais tarde foi transmitida em diferido.
O secretário-geral da ONU designado, que assumirá funções a 01 de janeiro de 2017, defendeu que hoje existe "um mundo de alguma forma caótico", em que "as relações de poder não são claras" e "a imprevisibilidade e a impunidade têm proliferado", e que é preciso lutar por "uma multipolaridade organizada".
"Para que isso aconteça creio que o espaço ibero-americano é um pilar essencial, porque é hoje essencialmente um espaço de paz, um espaço de afirmação democrática e dos direitos humanos, e um espaço de tolerância na vivência da multiculturalidade", considerou.
O antigo primeiro-ministro português acrescentou que "o espaço ibero-americano pode ser o centro de uma nova aliança à escala global para que os direitos humanos possam encontrar um novo impulso de afirmação em favor das populações de todos os continentes, e finalmente um espaço de tolerância na vivência da multiculturalidade".
António Guterres comparou a realidade ibero-americana com a de "tantos países, nomeadamente do continente europeu", em que "partidos políticos com êxito graças a um populismo xenófobo, à negação dos direitos dos emigrantes e dos refugiados, a um discurso quase de ódio ao estrangeiro e a tudo o que é diferente".
"Quando nós assistimos aos debates eleitorais em muitas partes do mundo e quando sentimos quantas e quantas pessoas, fugindo de conflitos dramáticos, como no caso da Síria, têm dificuldade hoje em fechar fronteiras, porque elas tendem a fechar-se, e o respeito pela diferença tende a diluir-se, infelizmente, a verdade é que o espaço ibero-americano é um espaço de incontestável tolerância", disse.
Incluindo-se entre os membros da comunidade ibero-americana, declarou: "Em nenhum dos nossos países um partido populista xenófobo teve êxito. Poderá haver aqui ou ali alguns toques de populismo, digamos, faz parte da vida, mas do populismo xenófobo a que temos assistido em diversas outras partes do mundo".
"Por isso, num momento em que é essencial uma batalha de valores, creio que o espaço ibero-americano está particularmente bem colocado nessa batalha de valores", reforçou.
Guterres ressalvou que "a paz ainda não está inteiramente alcançada em todo o espaço" ibero-americano. "Mas caminhamos claramente para ela, e isso contrasta com a situação em que infelizmente se encontram África, o Médio Oriente, o Sudeste Asiático, a própria Europa", considerou.
"Por outro lado, a verdade é que no espaço ibero-americano, depois de muitos anos de ditaduras, a democracia triunfou e os direitos humanos se têm afirmado de forma extremamente pujante. Poderá haver aqui ou ali problemas por resolver, mas a direção, a linha é muito clara", sustentou.
Neste discurso, feito em português, Guterres disse que "existe na vida internacional uma situação difícil para a agenda dos direitos humanos que por vezes aparece em confronto com a agenda da soberania nacional".
No seu entender, "as agendas da soberania servem apenas muitas vezes apenas para ocultar o que são reais violações de direitos", mas "a comunidade internacional tem tido às vezes dois pesos e duas medidas" nesta matéria e "a agenda dos direitos humanos também tem algumas vezes servidos outras agendas escondidos".
Segundo António Guterres, neste quadro, "o espaço ibero-americano é um espaço em que os direitos humanos valem por si".
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