“A grande maioria das escolas tem um papel muito ativo e comunica com muita rapidez” às Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), afirmou hoje a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das crianças e Jovens (CNPDPCJ), Rosário Farmhouse, durante uma audição na comissão parlamentar de Educação e Ciência.

No ano passado, os estabelecimentos de ensino voltaram a ser a segunda entidade que mais casos reportaram, apenas ultrapassados pela PSP, tendo havido “9.929 comunicações de perigo vindas diretamente das escolas”, disse Rosário Farmhouse, citando dados do relatório anual que será entregue ainda este mês no parlamento.

Além destes reportes, existem “outras comunicações de perigo que também chegam das escolas, mas não enquanto entidades de ensino, porque são feitas em nome individual por docentes e não docentes”.

Os números hoje divulgados revelam um aumento de casos, já que “em 2022, houve 9.082 comunicações à CPCJ por parte de estabelecimentos de ensino”, acrescentou a deputada Isabel Mendes Lopes, do Livre, partido que requereu a audição de hoje para analisar o dever de comunicação das escolas face a suspeitas de violência sobre crianças.

No ano passado, as CPCJ acompanharam quase 80 mil crianças e jovens, sendo que muitas destas situações foram denunciadas pela comunidade escolar, que está legalmente obrigada a fazê-lo.

No entanto, existem estabelecimentos de ensino onde tal não acontece. A comissão nacional não consegue apurar estatisticamente quem não comunica, “mas as comissões sabem-no”, sublinhou a presidente nacional.

Há escolas que comunicam os casos demasiado tarde, como as situações de absentismo que depois se transformam em abandono: “A maior parte tem uma sensibilidade extrema para a lei de proteção e promoção, mas umas são menos ativas do que outras”, lamentou.

Também a APAV disse hoje no parlamento receber queixas de famílias que não se sentem apoiadas pelos agrupamentos escolares: “A escola não responde de forma eficaz ou minimiza o problema dizendo tratar-se de um problema de miúdos”, explicou David Cotrim.

Também há casos em que as escolas “apenas referenciaram para as entidades competentes, como a Escola Segura, e acham que a situação está resolvida”.

“Não se pode pensar que só porque se se reportou à Escola Segura ou à CPCJ o problema está resolvido, porque a criança está lá e o problema continua lá”, corroborou a deputada socialista Rosário Gamboa.

Nos dois últimos anos, a APAV registou mais 19% de pedidos de ajuda do que nos aos anos anteriores”, apoiando diariamente cerca de oito crianças e jovens.

O representante dos diretores escolares, Filinto Lima, também convidado para a audição parlamentar, disse estar “convencidíssimo de que os 811 diretores das escolas públicas portuguesas” denunciam os casos, assim como todos os trabalhadores escolares, desde psicólogos, mediadores de conflitos a assistentes sociais ou assistentes técnicos.

O PSD avançou com uma recomendação ao Governo para que reforce o programa Escola Segura, da PSP, e para que haja mais formação e sessões de esclarecimento para a comunidade escolar, disse o deputado Pedro Alves.

Rosário Farmhouse lembrou que as CPCJ têm dado formação, tanto em escolas públicas como privadas, até “porque a violência não está na pobreza”.

“Famílias pobres não são necessariamente famílias mal tratantes. Temos casos de maus tratos nas classes sociais mais elevadas de uma gravidade extrema e de uma invisibilidade enorme, porque justificam o injustificável, quer com médicos que justificam o injustificável até justificações de faltas. Os maus tratos são mesmo transversais” alertou.

Filinto Lima alertou ainda para a necessidade de rever o Estatuto do Aluno, um diploma que faz agora 12 anos. Também Farmhouse considerou que “está desatualizado e tem mesmo de ser revisto”, considerando absurdo darem três dias de suspensão a um aluno “que praticou um ato violento porque para ele é um prémio”.