Com Bruno Gomes d’Almeida o caso aconteceu no sábado dia 23 de janeiro, quando, juntamente com várias centenas de pessoas, foi ao posto fixo de doação do Instituto português do Sangue e da Transplantação, em Lisboa, depois de o Instituto Português do Sangue da Transplantação (IPST) ter feito um apelo à dádiva de sangue.
Mesmo com pânico de agulhas, Bruno enfrentou três horas de espera numa fila, mais outra hora na fase de triagem até chegar a sua vez, onde foi confrontado com várias questões, nomeadamente se alguma vez tinha tido uma parceira trabalhadora do sexo ou se tinha tido várias parceiras no último ano.
À terceira pergunta, Bruno achou por bem corrigir a formulação da questão e assumir que tinha um parceiro, uma vez que estava incomodado com o facto de a pessoa que estava a fazer a triagem assumir que por ser homem tinha sexo com parceiras e não com parceiros.
“Então aí ele automaticamente respondeu: ‘Então não pode doar sangue’”, contou à Lusa, acrescentando que de seguida a pessoa ainda disse que “homens que fazem sexo com homens não podem doar sangue”.
Confrontado o IPST, a resposta é a de que o instituto “não questiona a orientação sexual dos seus potenciais dadores” e que “todo e qualquer cidadão [pode] candidatar-se a dar sangue, sem quaisquer diferenças de género ou orientação sexual”.
“No entanto, a dádiva será sempre condicionada por um conjunto de situações que se torna premente avaliar durante o exame médico que antecede a dádiva, nomeadamente as doenças que o candidato refere, as viagens, as infeções, os comportamentos e estilos de vida, com risco acrescido de transmissão de doenças infecciosas graves”, lê-se na resposta à Lusa.
O IPST garante que “os critérios de elegibilidade do dador de sangue assentam em pressupostos de proteção da saúde, do dador e do doente” e que “a avaliação da elegibilidade do dador é fundamental na garantia da qualidade e segurança do sangue a ser transfundido”, mas não respondeu o que acontece no caso de homens que prefiram omitir que são gays e que efetivamente conseguem doar sangue.
À Lusa, a ILGA (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo) Portugal revelou que sempre que há um apelo à doação de sangue aumentam as denúncias de homens gays que se sentem discriminados por lhes ter sido recusada a possibilidade de doar sangue.
De acordo com Marta Ramos, diretora-executiva da ILGA Portugal, a associação tem contabilizado cerca de três queixas por semana, grande parte delas nas suas redes sociais, não sendo, no entanto, reclamações formais.
“Há estas restrições aos dadores por resquícios de homofobia em virtude da pandemia da SIDA e de acharem que havia comportamentos promíscuos por determinados grupos, no caso homens que têm sexo com homens”, recordou.
Segundo Marta Ramos, ao longo dos últimos anos as evidências científicas têm demonstrado que não há mais comportamentos de risco no grupo de homens homossexuais do que noutros e lembrou que “todas as dádivas de sangue são testadas”.
“Há neste momento uma necessidade absurda de clarificação daquilo que são critérios que estão a ser postos em prática que são profundamente obsoletos e discriminatórios”, defendeu.
Em 2016 tinha sido definida o fim da proibição das doações de sangue por parte de homens que têm sexo com homens através de uma norma da direção-geral da Saúde e estava programado que em 2019 fosse constituído um grupo de trabalho para avaliar o impacto da alteração do critério de suspensão do dador, no que diz respeito a homens que têm sexo com outros homens.
“O relatório técnico final com as conclusões deste grupo de trabalho será conhecido em breve”, refere o IPST, garantindo que “apoiará as recomendações apresentadas por este grupo de trabalho”.
O IPST disse ainda que “na sequência de reclamações apresentadas, procede internamente ao esclarecimento das decisões tomadas pelos profissionais”.
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