“Perante a hipótese de marcar a agenda e exigir ao Governo soluções concretas para o município de Lisboa, vossa excelência escolheu apenas o alojamento local, ignorando tantos outros projetos, protestos e lutas das populações das nossas freguesias, que lhe temos vindo, sistemática e repetidamente a apresentar, sem solução”, lê-se numa carta aberta dos autarcas do PS, que é dirigida ao social-democrata Carlos Moedas.

Em causa está o apoio do presidente da Câmara de Lisboa ao alojamento local, manifestado publicamente num protesto de empresários e trabalhadores do setor, que se realizou na quinta-feira, dia em que o Governo esteve reunido em Conselho de Ministros para aprovar as medidas do programa Mais Habitação, que incluem alterações no funcionamento desta atividade económica.

Ao lado do setor do alojamento local, Carlos Moedas reiterou que a Câmara de Lisboa está a trabalhar num regulamento municipal da atividade, que será “inclusivo e realista”, prevendo que seja discutido em breve em reunião do executivo camarário.

“Em democracia não podemos proibir. A proposta do Governo provoca despedimentos e lesa famílias que dependem economicamente deste setor”, afirmou o social-democrata, numa publicação na rede social Twitter, com fotografias da sua presença na manifestação do alojamento local, na Praça do Município de Lisboa.

Entre as medidas do Governo sobre o alojamento local estão a suspensão de novas licenças nas modalidades de apartamentos e estabelecimentos de hospedagem integrados numa fração autónoma de edifício, a reapreciação das atuais licenças em 2030, com as novas a passarem a ter a validade de cinco anos, a criação de um regime de caducidade das licenças inativas e de um novo regime fiscal, que prevê uma contribuição extraordinária no valor de 20% ou uma isenção de impostos se o imóvel transitar para o mercado de arrendamento habitacional.

Na carta aberta, os eleitos pelo PS para a presidência de 13 das 24 juntas de freguesia de Lisboa, nomeadamente Ajuda, Alcântara, Beato, Benfica, Campo de Ourique, Campolide, Marvila, Misericórdia, Olivais, Penha de França, Santa Clara, Santa Maria Maior e São Vicente, acusam o social-democrata Carlos Moedas de “ignorar” todos os munícipes que se veem “asfixiados com rendas exorbitantes” e que continuam a ser despejados, “para a seguir as suas habitações serem convertidas em alojamentos locais ou hotéis”.

“Gostaríamos de o ter visto e de o ver ao lado dos milhares de pessoas que foram expulsas da cidade, e continuam a ser, desde a implementação do NRAU [Novo Regime do Arrendamento Urbano], uma lei cruel e desumana aprovada e aplaudida pelo Governo [PSD/CDS-PP] de que fez parte e que tanto elogiou”, lê-se na carta aberta dos socialistas.

Os autarcas do PS consideram ainda que o dia 30 de março, em que o Governo aprovou as medidas do programa Mais Habitação, “podia ter sido o grande dia da habitação, um dia de caminho de construção de agenda conjunta, de ambição e exigência transversal a todos os partidos, para benefício dos lisboetas”.

Contudo, Carlos Moedas, “infelizmente, optou por uma solução de crítica fácil e de aproveitamento político”, acusam, lamentando que o autarca “não tenha reunido uma única vez com os presidentes de junta”.

Em resposta aos socialistas, a concelhia de Lisboa do PSD assegura que a afirmação de que Carlos Moedas não está a dialogar com as juntas é falsa, porque “a verdade é que tem existido diálogo com todas as freguesias e continuará a ter lugar para o bem comum dos lisboetas”.

Num comunicado intitulado “E se fossem sérios?”, os sociais-democratas referem que a manifestação em que Carlos Moedas participou era de pequenos empresários do alojamento local, onde “não estavam os grandes fundos imobiliários”, e afirmam que o protesto “hoje nem faria sentido”, porque “o PS percebeu o erro e recuou em toda a linha no que se preparava para fazer, aniquilando o setor”.

O PSD sublinha ainda que Carlos Moedas está a trabalhar no regulamento do alojamento local e na aposta em políticas públicas, rejeitando “‘congelar’ o problema e a cidade, como fez o anterior executivo camarário, sem acautelar, em momento algum, o excesso de pressão sobre zonas específicas da cidade”, bem como a proposta do Governo de arrendamento forçado.

Na última reunião pública da Câmara de Lisboa, que decorreu até à madrugada de quinta-feira, foi discutida e votada a proposta do PS para a criação de um programa municipal Mais Habitação, em complemento ao do Governo, mas a maioria das medidas foi rejeitada, inclusive a renovação do programa Renda Segura, que pretendia a isenção total de impostos – IMI, IRS, IRC e IMT – para os imóveis disponibilizados ao município para arrendamento habitacional.

A liderança PSD/CDS-PP, que governa sem maioria absoluta, votou contra todos os pontos da proposta do PS, tendo consigo reprovar a maioria das medidas com o apoio do PCP e do BE, que votaram contra em algumas e se abstiveram em outras.

Dos quatro pontos aprovados, de um total de 10, destacam-se o envio a todos os vereadores das comunicações para exercício do direito legal de preferência na aquisição de imóveis e a decisão de “mandatar os serviços municipais competentes para no prazo de 90 dias proceder à identificação de terrenos municipais, ou de privados – neste caso a adquirir –, para lançamento de projetos-piloto de construção modular e de ‘micro-housing’, dirigidos a estudantes e trabalhadores deslocados (estudantes universitários, polícias, médicos, professores, etc..), bem como para reforçar as soluções habitacionais de emergência”.

No mesmo prazo deverá ser apresentada proposta para “tornar elegíveis ao Subsídio Municipal de Arrendamento Acessível os proprietários de imóveis sitos a mais de 150 quilómetros do concelho de Lisboa, e que aqui residem”.

Outra das medidas aprovadas é a constituição de Balcões Mais Habitação Lisboa, dispersos pela cidade, em articulação com as freguesias, para esclarecimento e divulgação de informação, numa base de maior proximidade aos munícipes.