Em entrevista à Lusa, num bairro de Lisboa, onde decorre uma reunião mundial de inquilinos, a dirigente sueca salienta que “há um problema de falta de habitação em toda a Europa, especialmente nas grandes cidades”.
Ressalvando as diferenças entre norte e sul, Marie Linder reconhece que há aspetos que ligam todos os países: “os jovens não conseguem sair de casa dos pais, porque não há casas acessíveis para eles, há sobrelotação, muitas famílias estão a viver em apartamentos pequenos, não têm quartos para todos, têm de partilhar, e a construção de novas casas está a descer, em toda a Europa”.
“Estamos em 2023. Podemos voar até à Lua e muitas outras coisas, mas não conseguimos garantir uma casa segura para todos. Não é incrível? É isso de que as pessoas precisam, uma casa segura. Podemos fazer todas essas coisas, mas não achamos que seja assim tão importante que todos tenham uma casa segura para viver e não fazemos disso uma prioridade”, lamenta.
Recordando que as Nações Unidas estabeleceram como meta que toda a gente tenha uma casa segura e acessível até 2030, Marie Linder realça: “Faltam seis anos e não me parece que vamos atingir esse objetivo, quando olho para a Europa e para o resto do mundo”.
Para alcançar a meta, “todos os países, todos os municípios têm de começar a construir e cada país tem de apoiar o processo de construção, para que as casas sejam acessíveis”, defende, acrescentando a importância de reforçar a habitação pública e de existir uma mudança de visão.
“Toda a gente tem de comer todos os dias, toda a gente tem de ter uma casa. Temos de mudar a mentalidade. Não podemos aceitar que as pessoas não tenham abrigo, não podemos aceitar que as crianças cresçam em apartamentos sobrelotados. Temos de mudar o raciocínio: ter casa é algo muito importante, como ter comida na mesa e acesso à educação. Tem de estar no centro da sociedade”, sustenta.
As associações de inquilinos têm um papel fundamental em fazer avançar essa mudança de perspetiva, defende.
“[Na Suécia], as coisas não aconteceram por acaso. Somos uma associação de inquilinos com força e temos muitos membros. Se nos organizarmos e pressionarmos, podemos mudar as coisas”, vinca.
Como exemplo, Marie Linder recorda que há uns anos o governo sueco tentou impor rendas de mercado para as novas construções (na Suécia as rendas são negociadas entre proprietários e inquilinos), mas conseguiu-se reunir meio milhão de assinaturas para o impedir.
Na Suécia – onde 60% da habitação é pública (em Portugal esta percentagem fica-se pelos 2%) –, os inquilinos têm “bastante segurança”, mas persistem questões.
“O Estado não tem assumido a responsabilidade de garantir casas acessíveis para as pessoas”, aponta.
Em Lisboa, onde está para participar na 22.ª conferência mundial da União Internacional de Inquilinos, a que preside desde outubro de 2019, Marie Linder ouviu dos representantes portugueses explicações sobre os programas e apoios nacionais e municipais que foram apresentados recentemente, para tentar dar resposta a uma crise crescente.
A União Internacional de Inquilinos está reunida em Lisboa para discutir o “problema transversal” da habitação e promover "o direito a uma habitação digna e segura”.
Entre quarta e sexta-feira, delegados de 21 países vão debater a habitação em geral e o arrendamento em particular.
Em nota de imprensa, a organização destaca que “a crise global na habitação piorou com o aumento do custo de vida, a guerra e as catástrofes naturais” e, nesse contexto, “as políticas de habitação têm de assumir um lugar central nas agendas políticas nacionais em todo o mundo”.
Com sede em Moscovo e escritório em Bruxelas, a União Internacional de Inquilinos reúne-se em conferência mundial a cada três anos.
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