Em comunicado enviado à Lusa, a Arquidiocese acrescenta que também exigiu que o diretor da Fraternidade, padre Joaquim Milheiro, abandonasse a instituição, uma decisão que na altura foi acatada.

A Arquidiocese reagiu, assim, à acusação deduzida pelo Ministério Público contra a instituição e quatro responsáveis, imputando a cada um deles nove crimes de escravidão.

Segundo a Arquidiocese, com as saídas do diretor e “sobretudo” da referida responsável, a casa terá voltado a ter um ambiente “de fraternidade, respeito e bem-estar, retomando “uma normalidade saudável”.

“Nesse sentido, a Arquidiocese não se viu na necessidade de extinguir a Fraternidade, na expectativa de que ela seguisse, então, um novo rumo”, refere ainda o comunicado.

Acrescenta que, “dada a complexidade do caso”, continua a acompanhar a comunidade e a colaborar com o Ministério Público e “deseja e espera que toda a verdade seja apurada”.

O padre, entretanto, acabou por voltar à Fraternidade, "à revelia da Arquidiocese", encontrando-se num estado de saúde "bastante frágil".

O Ministério Público (MP) acusou os responsáveis da Fraternidade e a própria instituição – um padre e três mulheres - de escravizarem raparigas que ali foram acolhidas para seguirem uma vida religiosa.

A Lusa contactou o advogado de uma arguida, Ernesto Salgado, que disse que ainda não decidiu se vai ou não pedir abertura de instrução.

Segundo Ernesto Salgado, a decisão deverá ser tomada nos próximos dias, em consonância com o advogado dos outros arguidos.

Segundo a acusação, os arguidos, de dezembro de 1985 até 2015, angariaram jovens do sexo feminino, de raízes humildes, com poucas qualificações ou emocionalmente fragilizadas, que acolheram na instituição a pretexto de formarem uma comunidade espiritual de raiz católica e de satisfazerem os anseios daquelas de seguirem uma vida religiosa.

Terão “usado” as jovens para desempenhar “todas as tarefas diárias exigidas para a conservação e manutenção das instalações da instituição e continuação da sua atividade”, sem lhes dar qualquer contrapartida.

Ainda segundo a acusação, os arguidos impuseram às jovens ofendidas jornadas de trabalho que chegavam a atingir vinte horas e infligiam-lhes castigos físicos como bofetadas e pancadas no corpo com objetos se o não faziam ou faziam mal feito.

Além disso, insultavam-nas e impuseram-lhes castigos como a privação de alimentação e de banho ou a obrigação de dormir no chão.

“Controlaram os contactos que mantinham com o exterior e privaram-nas de informação, de contactos com familiares e, até, da documentação pessoal”, acrescenta a nota da procuradoria.

Em novembro de 2015, a Polícia Judiciária fez buscas à Fraternidade Missionária Cristo Jovem, depois de três raparigas terem apresentado queixa por maus-tratos, escravidão e cárcere.

O padre e as três mulheres responsáveis pela instituição foram detidos e levados a tribunal, tendo ficado sujeitos a termo de identidade e residência, a mais leve das medidas de coação.

Na altura, a Confederação Nacional dos Institutos Religiosos de Portugal (CNIRP) assinalou à Lusa que este caso não ocorreu num convento, mas numa associação de fiéis, pelo que nem as detidas são freiras nem as vítimas são noviças.

A Fraternidade Missionária Cristo Jovem não está, por isso, sob alçada da Confederação dos Institutos Religiosos, mas da Arquidiocese de Braga, acrescentou a fonte.

Esta tese foi corroborada pelo padre jesuíta João Caniço, que disse à Lusa que a Fraternidade Missionária Cristo Jovem é uma “sociedade apostólica”, ou seja, um grupo de pessoas que se associaram para fazer uma “obra comum”.

“Não pode ser considerada uma congregação, nem uma instituição religiosa porque não é reconhecida como tal pela Igreja Católica”, frisou.

A Fraternidade Missionária Cristo Jovem nasceu de um movimento para jovens que, posteriormente, construiu um edifício em Requião, Vila Nova de Famalicão, sendo agora uma associação de fiéis com estatutos aprovados a 24 de janeiro de 1978 pela Arquidiocese de Braga.