Um total de 541 escolas públicas do 1.º ciclo de um total de 3.886 têm níveis de repetência superiores à média nacional, em todos os anos de escolaridade.

O estudo sobre retenção no 1.º ciclo em Portugal, da associação EPIS (Empresário pela Inclusão Social) foi realizado por Maria de Lurdes Rodrigues (coordenação), Isabel Alçada, João Mata e Teresa Calçada e será apresentado hoje em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian.

Este projeto de investigação denominado “Aprender a ler e escrever em Portugal” tem como principal objetivo aprofundar o conhecimento sobre o problema do insucesso escolar nos primeiros anos de escolaridade.

Uma das questões era perceber qual a incidência geográfica, social e organizacional do fenómeno do insucesso escolar nos primeiros anos de escolaridade, tendo sido identificadas 541 escolas com níveis de repetência superiores à média nacional, em todos os anos de escolaridade. Foram classificadas como “escolas do insucesso”.

Segundo os autores, a análise de dados estatísticos permitiu verificar que o insucesso não atinge de forma idêntica todas as escolas do país, não é um fenómeno disseminado, antes circunscrito, que se manifesta de forma desigual no território nacional, parecendo ser tributário das desigualdades territoriais e sociais que caracterizam a sociedade portuguesa.

Na verdade não se regista o fenómeno da repetência em mais de 900 escolas do primeiro ciclo e cerca de quatro em cada 10 concelhos (38,5%) não têm estabelecimentos de ensino com elevado insucesso escolar.

No entanto, o problema ocorre em cerca de dois terços (61,5%) das unidades concelhias de Portugal continental.

Um total de 107 concelhos não têm escolas de insucesso e 171 vive essa realidade, mas uma análise mais aprofundada revelou que há uma concentração deste insucesso em determinados concelhos.

Seis em cada dez escolas estão em 40 concelhos ou seja quase dois terços das escolas com elevada retenção e desistência situam-se em 14,4 por cento do território nacional, com maior incidência no sul e menor incidência e circunscrição nos concelhos do norte.

A título de exemplo o estudo revela que Lisboa tem 39 das 541 escolas de insucesso que representam 42 por cento do total das suas escolas e que o Porto tem 10 escolas de insucesso que representam 20 por cento do seu parque escolar.

Ainda segundo o estudo há também uma incidência e disseminação mais forte em concelhos do interior e de reduzida dimensão tanto no Sul como no Norte e Centro do país.

Em Elvas, Beja, Silves, Crato, Serpa, Sines, Moura e Castro Marim, concelhos de interior, com baixa densidade populacional, a maioria das escolas destes concelhos são de insucesso.

No Norte e Centro destacam-se os concelhos de Mirandela, Idanha a Nova, Penamacor, Sabugal, Freixo de Espada à Cinta, Vila Velha de Rodão, Vila Flor, Seia e Bragança, concelhos em que a maioria das escolas são de insucesso.

O estudo identifica ainda incidência e disseminação mais forte em alguns concelhos da periferia da cidade de Lisboa nomeadamente em Loures (45 por cento das escolas com insucesso), Amadora (37 por cento), Almada (37 por cento), Setúbal (27 por cento), o que contratas com menor incidência noutros como Vila Franca de Xira (23 por cento), Oeiras (24 por cento), Odivelas (20 por cento), Cascais (17 por cento) e Sintra (16 por cento).

O problema do insucesso no segundo ano de escolaridade, revela a investigação, assume proporções mais dramáticas em escolas do interior do país e da periferia da cidade de Lisboa e é tributário de desigualdades territoriais que as escolas não conseguem contrariar.

São assim escolas expostas e vulneráveis às desigualdades dos contextos territorial e social em que se inserem.

Dentro dos concelhos, sobretudo os de maior dimensão, o problema do insucesso escolas localiza-se apenas em determinadas escolas, em regra, as que prestam serviço educativo em territórios com problemas críticos.

Défice de competências de leitura principal causa de "chumbo" no 2.º ano

O mesmo estudo da associação EPIS revela que a primeira causa de repetência no 2.º ano é o défice de competências de leitura dos alunos.

Em que medida as dificuldades de aprendizagem da leitura explicam o insucesso escolar nos primeiros anos de escolaridade, que fatores explicam, e em que medida, as dificuldades de aprendizagem da leitura, são questões às quais o estudo procurou responder.

A análise indica que as crianças reprovam no segundo ano por não lerem bem, por não terem atingido os objetivos estabelecidos no programa no que respeita à leitura e à escrita, seja no domínio técnico de identificação e descodificação dos sinais, seja na compreensão da leitura ou do domínio do vocabulário.

As dificuldades com a aprendizagem da leitura são consideradas pelos professores como “normais”, argumentando que as crianças são todas diferentes e a grande maioria dos professores das turmas visitadas considera que não é possível eliminar totalmente o insucesso no primeiro ciclo.

Perante situações concretas em que os alunos não atingem os objetivos estabelecidos no programa para a leitura, os professores consideram que têm apenas uma de duas alternativas: a repetência ou a passagem automática.

Para os professores entrevistados a repetência é a alternativa correta, a única alternativa. No seu leque de opções não são encaradas outras alternativas, não são referidas outras soluções.

Segundo a investigação, o apoio proporcionado pela coordenação da escola ou pelo agrupamento é predominantemente a disponibilização de tempo dos designados professores do apoio educativo mas, no final, os esforços empreendidos pelos professores não têm impacto significativo.

“No final do ano, os que recuperaram progridem, os que não recuperaram repetem. Para ser diferente seriam necessárias, na opinião dos professores, outras medidas”, revela o estudo adiantando que a repetência é vista como uma oportunidade e não como um problema.