A COVID-19 abalou o setor das viagens e do turismo a nível global. Nunca antes se tinham verificado tantas restrições, como em abril deste ano, em que 9 em cada 10 pessoas no mundo viviam em países onde foram implementadas limitações nas movimentações. Companhias aéreas, agências de viagens e demais empresas relacionadas com esta área de negócio estão entre as mais afetadas pela pandemia. Estima-se que 197.5 milhões de empregos do setor estejam em risco.

Com alguns países a restabelecer a livre circulação e outros dispostos a fomentar novamente o turismo, sem quarentena obrigatória, após meses de isolamento para travar a propagação do novo coronavírus, gradualmente, viajar poderá voltar a fazer parte do nosso dia-a-dia.

Apesar destes indícios positivos para o turismo, segundo um estudo da Associação Internacional de Transportes Aéreos, no resto do mundo, 36% dos viajantes pretendem esperar pelo menos seis meses após a contenção do vírus para voltarem a viajar em aviões. Estes dados preveem meses difíceis para o setor do turismo e também Portugal acabará por ser afetado, prevendo-se um recuo de 40% no número de visitantes (menos sete milhões de entradas internacionais este ano, em comparação com 2019), segundo um estudo da Oxford Economics.

Restaurar a confiança dos consumidores, por um lado, e abordar as suas preocupações, por outro, são dois passos essenciais para a recuperação da indústria. ​​​Para tal, o Conselho Mundial de Viagens e Turismo lançou o selo “Safe Trave ls” que pretende reconhecer os destinos que cumprem regras de saúde e higiene alinhadas com os Protocolos de Viagens Seguras. Portugal foi o primeiro país europeu distinguido com este selo.

Que mudanças são, então, expectáveis na forma como viajamos? Desenvolvemos algumas

  • Preferência pelo aluguer de propriedades particulares

Mesmo com práticas de limpeza aprimoradas, as pessoas ainda terão receio de interagir umas com as outras, pelo que passarão a dar prioridades ao aluguer de moradias particulares ou refúgios rurais ao invés de hotéis. Desde o início do "desconfinamento", as pesquisas por parte dos portugueses na plataforma Airbnb duplicaram para destinos em Portugal. Os portugueses dão agora preferência a moradias espaçosas para albergar famílias, com piscina e possibilidade de receber animais de estimação, para estadias mais prolongadas, entre uma semana e um mês. Segundo a Airbnb, os portugueses “inclinam-se de forma clara para as viagens domésticas e de duração superior a uma semana”. Também o presidente da Associação Portuguesa de Alojamento Local, Eduardo Miranda, afirma que os portugueses estão a procurar alojamento local em zonas isoladas do interior, especialmente casas isoladas com piscina.

De que forma podem competir os hotéis com este tipo de alojamentos mais isolados? Algumas empresas têm vindo a trabalhar em medidas inovadoras que facilitem a adaptação dos estabelecimentos a esta nova realidade pandémica. Uma delas é a Luggit, startup portuguesa de armazenamento, recolha e entrega de bagagens, que lançou uma plataforma dedicada ao setor hoteleiro. Esta plataforma irá permitir que cada hotel tenha um serviço de recolha e entrega de bagagens higienizadas.

  • Menos multidões em locais turísticos

Os parques temáticos, museus e monumentos são conhecidos por atrair vastas multidões. Mas, à medida que estes locais reabrem e se deparam com esta nova realidade, espera-se que essas multidões sejam mais limitadas e controladas. Nalguns museus, como a Galleria Borghese, em Roma, ou o Museu do Louvre, em Paris, as visitas são já realizadas por tempo determinado e limitado.

Em Portugal, as indicações da Direção-Geral de Saúde prendem-se sobretudo com a utilização de máscara, a distância de segurança entre não-coabitantes e a desinfeção das mãos à entrada e saída (ou sempre que necessário). Para além disso, a Direção Geral do Património Cultural criou um documento com algumas medidas, orientações e recomendações para a limpeza, desinfeção e conservação dos bens culturais na reabertura dos museus, palácios e monumentos.

  • Menos turistas e viagens mais caras para o exterior

Embora ninguém saiba ao certo o que vai acontecer, um comunicado de imprensa da Associação Internacional de Transporte Aéreo antecipa que as tarifas aumentem entre 43% e 54% dependendo da região. De acordo com a associação, as medidas de distanciamento social irão reduzir a capacidade máxima dos aviões para 62%, quando a maioria das companhias aéreas precisa que os seus aviões estejam 77% cheios para evitar prejuízos económicos.

Ross Dawson, autor e empreendedor australiano, previu o surgimento de um novo tipo de classe chamada "classe de isolamento" — classe que poderá usufruir de lugares com divisórias ou salas privadas nos aviões por preços mais altos. Enquanto estas pessoas poderão viajar isoladas umas das outras, os utilizadores da classe económica continuariam a viajar sem qualquer separação. Esta ideia de pagar pelo distanciamento social já foi abordada (e rapidamente abandonada) pela Frontier ao afirmar que iria começar a cobrar $39 [aproximadamente 35 euros] por um lugar vazio garantido ao lado do passageiro.

  • Os mais cautelosos ficarão perto de casa

Os especialistas acreditam que as pessoas irão começar a aventurar-se mais perto de casa, enquanto alguns governos, como o português, apelam mesmo ao turismo interno. Este apelo foi também reforçado em junho pelo Turismo de Portugal através de uma nova campanha chamada ​​#TuPodes, Visita Portugal que desafia os portugueses a viajarem pelo Melhor Destino Turístico do Mundo.

Existem vários indicadores que comprovam esta tendência de preferência pelo turismo local. O site de comparação de seguros de viagem Squaremouth afirma que, com base nas apólices de seguro adquiridas entre 1 de abril e 10 de maio, as viagens domésticas representam 48% das viagens planeadas para o verão, um aumento de 15% em relação ao ano passado. Simultaneamente, a Travelocity observou que a maioria das reservas de hotéis realizadas no seu website fica a 160 quilómetros de onde os turistas moram.

  • Novas medidas para o setor da aviação

Com crescentes preocupações relacionadas com o novo coronavírus, é esperar que os aeroportos aumentem os cuidados com a limpeza e a saúde numa tentativa de evitar a sua propagação. Companhias de aviação como a Lufthansa, American Airlines, Air France e TAP, entre outras, tornaram obrigatório o uso de máscaras para passageiros e tripulantes. A Qatar Airways é uma das várias companhias aéreas a introduzir fatos de proteção para seus tripulantes de cabine. As regiões autónomas dos Açores e da Madeira estão a realizar testes gratuitos (os custos são assumidos na íntegra pelos próprios governos regionais) à Covid-19, para os passageiros que queiram visitar as suas ilhas. Na China, é exigida aos turistas uma validação de que não estão infetados com o vírus. Esta validação é feita através de um sistema onde é gerado um código QR que classifica os cidadãos como “verde”, “amarelo” ou “vermelho”, dependendo do risco de terem contraído o vírus.

Para além disso, estão também a ser testadas outras tecnologias. Um delas é um quiosque ativado por voz para monitorizar a temperatura, a frequência cardíaca e a respiratória dos passageiros antes do check-in, testado pela Etihad Airways e a Elenium Automation. Também está a ser testada uma instalação de desinfeção e higienização para o corpo todo chamada CleanTech no Aeroporto Internacional de Hong Kong.

  • Um possível passaporte de imunidade

Até que uma vacina seja desenvolvida, o foco será a avaliação do risco de contágio dos viajantes. Poderá ser compilado um passaporte de imunidade, um documento que certifica se alguém é imune ao COVID-19 através da realização de um teste de anticorpos e um teste ao vírus. Contudo, os especialistas ainda não têm a certeza se as pessoas que recuperaram do coronavírus estão realmente imunes e alguns destacam possíveis questões que amplificam as desigualdades sociais.