O estudo “cantinas escolares – direito à alimentação e contratação pública”, realizado pela ex-vice-presidente da Câmara de Santarém Susana Pita Soares no âmbito do doutoramento em Ciências Jurídico-Políticas, atribui muitos dos problemas identificados à opção pelo preço mais baixo e não pela proposta economicamente mais vantajosa, também prevista no Código de Contratação Pública, e à falta de fiscalização do cumprimento dos cadernos de encargos.
“Há, por exemplo, sítios em que a ementa não corresponde ao anunciado”, outros em que a quantidade fica abaixo do definido ou em que os ingredientes usados não têm qualidade, “porque o critério na sua aquisição é o baixo custo” e não existe fiscalização, aponta.
À qualidade das ementas, Susana Pita Soares acrescenta o reduzido número de responsáveis pela confeção e distribuição dos alimentos, a falta de vigilantes e de acompanhamento, sobretudo no pré-escolar e no primeiro ciclo, a que acresce o ambiente no espaço de refeição, barulhento e pouco acolhedor, e a falta de sensibilização da comunidade para uma alimentação saudável.
Para Susana Pita Soares, o problema não está na contratação pública, solução que defende, mas na falta de fiscalização e de acompanhamento da execução dos contratos e também quando o critério preço é determinante, comprometendo a qualidade.
“Bastava em termos de concurso optar pela proposta economicamente mais vantajosa, que aceita critérios que introduzem melhorias”, salientou.
Como exemplos apontou “o reconhecimento de valores como a promoção de uma alimentação saudável junto dos utentes de cantinas escolares, a redução dos custos ambientais de cadeias logísticas extensas, as razões de segurança alimentar e a promoção de práticas agrícolas sustentáveis, nomeadamente pela promoção dos produtos de agricultura biológica”.
“É possível atender a esses valores através das regras existentes da contratação pública, sem que seja posta em causa a liberdade da concorrência, como nos parece poderia acontecer com o estabelecimento de uma prioridade em razão da origem dos produtos”, afirmou.
A introdução deste tipo de critérios “permitiria ter em conta aspetos como as considerações de saúde e ambiente, a sazonalidade, variedade e disponibilidade do produto, bem como a extensão das cadeias de abastecimento, evitando privilegiar produtos devido exclusivamente à sua origem”.
À questão da qualidade dos ingredientes, Susana Pita Soares junta as consequências dos cortes na contratação de pessoal, também efeito do fator custo, que se reflete na confeção e no serviço das refeições, com uma das queixas mais frequentes dos alunos a prender-se com os tempos de espera que os obrigam a muitas vezes ingerir apressadamente ou mesmo a optar por levar comida de casa.
“Há aqui também uma aprendizagem que se perde, de civismo – há alunos que se queixam que os mais velhos passam à frente e ficam sem tempo para almoçar -, de convivência, de saber estar”, que, no seu entender, se deve à falta da presença de um adulto.
Do levantamento que fez, concluiu que “mais de 60% das refeições escolares são adjudicadas a uma única empresa”, que, pela economia de escala, vence pelo critério de preço mais baixo.
“Se se optasse pela proposta economicamente mais vantajosa, o preço poderia aumentar, mas garantiria maior qualidade”, frisou.
Ao longo do estudo, Susana Pita Soares verificou que muitas crianças e jovens não almoçam nas cantinas porque “não gostam da comida”, que, na maioria das vezes, “não corresponde ao padrão a que estão habituadas, de alimentos confecionados com muita gordura, sal e açúcar, achando as ementas escolares, mais equilibradas, pouco apelativas”.
Além do trabalho a fazer com as famílias neste âmbito – de que encontrou alguns projetos -, a investigadora considera que o Ministério da Educação deveria fazer um esforço no sentido de melhorar a acústica e a estética dos refeitórios, tornando-os mais acolhedores e mais atrativos.
Comentários