A prova de que um governo pode sobreviver durante uma legislatura completa mesmo com maioria relativa é que entre 2019 e 2023 o PSD governou a Madeira com apenas menos dois deputados do que o PS, que ficou em segundo lugar (PSD-21/PS-19).
A probabilidade de uma geringonça (já aprendemos que em política não há impossíveis) liderada pelo PS, como sugere Paulo Cafôfo, é em primeiro lugar uma impossibilidade aritmética, mas também padece de falta de lógica que a sustente. No limite, os madeirenses poderiam voltar a ser chamados às urnas antes do tempo, mas esse é um cenário que ninguém quer.
Sem Bloco de Esquerda ou PCP no parlamento da Madeira, resta ao PS a possibilidade de se aliar ao JPP, o único partido que melhorou o seu resultado em relação a 2023 e a 2019, subindo consecutivamente de três para cinco e agora para nove deputados. Em conjunto, PS (11) e JPP (9) têm 20 assentos, mais do que os 19 do PSD, ainda assim abaixo dos 24 necessários para formar maioria, impossível mesmo com o PAN (1) a bordo.
André Ventura disse ao SAPO24 que, mesmo na hipótese remota de vir a ser convidado — entretanto excluída por Paulo Cafôfo —, o Chega "nunca" se aliaria ao Partido Socialista. Também o líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha, veio dizer que o PS não deve perder tempo a falar com a IL.
Resta a hipótese de fazer cair o Orçamento do Governo Regional da Madeira, e é aí que as coisas se podem complicar para Miguel Albuquerque. Entre 2019 e 2023, o orçamento foi sempre aprovado com os votos a favor do PSD e do CDS (neste caso, PSD-19/CDS-2) e ora os votos contra ou a abstenção do PS ou do JPP.
O presidente do CDS Madeira, José Manuel Rodrigues, admite que "o orçamento será mais complicado de negociar", mas garantiu ao SAPO24 que "se entrarmos no campeonato das irresponsabilidades, o CDS será o campeão da responsabilidade". E lembra que "o CDS sempre defendeu que quem ganha as eleições deve formar governo".
Na verdade, depois das eleições de ontem, o maior perigo para o PSD pode mesmo vir da direita. Pelo menos, olhando para as variáveis: à esquerda PS, JPP, PAN (21 assentos); à direita, PSD, CDS, Chega e IL (26 assentos no total). À primeira vista pode parecer simples, mas é aqui que o campo para a chantagem é maior. Basta Chega e IL absterem-se para haver um empate (o Orçamento cai ao segundo empate). O mesmo poderia acontecer se Chega e CDS decidissem abster-se e PS, JPP e PAN votassem contra.
Recorde-se que o PS, apesar de ter mantido o mesmo número de deputados, saiu fragilizado destas eleições, tendo em conta o que levou à queda do governo de Miguel Albuquerque, arguido na "Operação Zarco", um processo sobre corrupção.
Amanhã, o representante da República para a Madeira, Ireneu Barreto, vai ouvir os partidos que no domingo ganharam assento parlamentar e se "as condições formais e políticas" estiverem reunidas", será nomeado o presidente do XV Governo Regional da Madeira, onde até ontem o PSD nunca perdeu uma eleição, apesar de Miguel Albuquerque ter perdido a maioria.
A declaração de princípio assinada hoje pelo PS e JPP e a pretensão de "encetar conversações para apoio parlamentar mais robusto" e "não viabilizar qualquer solução governativa do PSD", apresentando-se como solução ao representante da República, em nada muda o resultado das eleições e a escolha dos madeirenses.
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