“Tudo vai bem”, a derradeira longa-metragem de ficção do grupo, produzida em 1972, com os atores Yves Montand e Jane Fonda, abre o ciclo, na terça-feira, dia 08, a que se segue, no dia seguinte, “Um filme como os outros”, obra que inaugurou o coletivo que tomava o nome do realizador da Revolução Russa Dziga Vertov, pioneiro do cinema documental, autor de “O homem da câmara de filmar”.
Para Jean-Luc Godard, cineasta que ajudara a definir a ‘Nouvelle Vague’ com obras como “O acossado” – e que, em 1967, já fizera a declaração política em “O maoísta” –, o coletivo, mais do que produzir “filmes políticos”, tinha o propósito de “fazer filmes politicamente”, o que impunha a perspetiva em “todo o processo", da produção à rodagem, cita a Cinemateca, na apresentação do ciclo.
“Os filmes do Grupo Dziga Vertov são, em primeiro lugar, uma reinvenção da prática cinematográfica. Ao mesmo tempo ‘utópicos’, no sentido em que preparam e apontam um ‘caminho’ para um ‘futuro’ (...), e ‘realistas’, no sentido em que dão conta das circunstâncias concretas de tempos e lugares", que vão da França, do Maio de 68, à Primavera de Praga, do Reino Unido, a Itália e ao Médio Oriente, com todos os conflitos da época.
Além de Godard e Gorin, o grupo contava também com o operador de câmara William Lubtchansky e as atrizes Juliet Berto e Anne Wiazemksy, a quem se juntaram, mais tarde, o ator, realizador e argumentista Jean-Henri Roger e o diretor de fotografia Armand Marco. Os atores Gian Maria Volonté e Yves Afonso, os cineastas Marco Ferreri e Glauber Rocha, e o protagonista do Maio de 68 Daniel Cohn-Bendit, como argumentista, são outros nomes associados ao coletivo.
“Um filme como os outros”, um 'documentário-investigação' sobre o Maio de 68, foi a primeira produção do grupo, e será exibida na Cinemateca, esta semana, na quarta e na sexta-feira.
Na produção do coletivo seguiu-se, ainda em 1968, “Le gai savoir”, com Jean-Pierre Léaud, ator conhecido pelo desempenho de Antoine Doinel, nos filmes de François Truffaut, e Juliet Berto, atriz que já filmara com Godard (“Weekend”) e viria a entrar em “Conversa acabada”, de João Botelho.
“Le gai savoir” é "um ensaio sobre o poder das palavras e a sua relação com as imagens”. Começado antes dos levantamentos de 68, e concluído depois deles, constitui "a antecâmara do que viria a ser o espírito e o trabalho do Grupo Dziga Vertov”, segundo a Cinemateca, que exibe a obra no próximo dia 28.
“Pravda” (a exibir no dia 21), rodado clandestinamente na Checoslováquia, depois da invasão militar soviética, e “British sounds” (dias 14 e 24), sobre condições de vida do operariado britânico, ambos de 1969, foram os seguintes na produção do grupo.
De 1970 vêm “Lotte in Itália”, “um jogo de cartas revolucionário” (21 de maio), “Vladimir e Rosa”, “parábola política que cruza elementos, da agitação social nos Estados Unidos nos anos 60, às memórias do nazismo” (23 de maio), e “Le vent d’est”, “um dos mais complexos e, para vários comentadores, o melhor” do Grupo Dziga Vertov (30 de maio), segundo a Cinemateca.
“Tudo vai bem”, de 1972, permitiu o regresso de Godard ao cinema comercial, por causa dos atores - Jane Fonda e Yves Montand -, mas manteve o discurso político, centrado na greve de uma grande empresa, com sequestro do patrão.
“Letter to Jane”, realizado em 1972, “como uma espécie de adenda” a “Tudo vai bem”, parte de uma fotografia de Jane Fonda, no auge da atividade de protesto contra a Guerra do Vietname. Foi o último filme do grupo e a derradeira colaboração entre Godard e Gorin, discípulo dos filósofos Louis Althusser e Michel Foucault, que acabaria por se fixar nos Estados Unidos, como professor de cinema.
A derradeira obra associada ao coletivo, no entanto, é um filme inacabado sobre a resistência palestiniana, “Ici et ailleurs”, rodado em 1972, que Godard e Anne Marie-Miéville recuperaram quatro anos mais tarde.
Raramente exibido, o filme será apresentada no dia 25, em Lisboa. “Já não é um filme do Grupo”, lê-se na apresentação, “mas é, por todas as razões, uma espécie de seu oficioso posfácio”.
"Passados 50 anos" - escreve a Cinemateca - estes filmes “chegam de um outro mundo que, no entanto, não deixou de ser o nosso”, com "a sua intensidade política, e com o seu incessante questionamento dos poderes e significados da imagem (cinematográfica e para lá dela)".
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