Manon Rosenboom Alves chegou a Portugal em 1995, já lá vão 25 anos. “Portugal era muito diferente do que é agora. Naquela altura eu era um bicho de fora, de aparência diferente, que não falava bem português e senti que estava em desvantagem, sobretudo quando ia a entrevistas de emprego. Agora há tantos estrangeiros aqui, há tanta influência internacional que a pessoa já nem repara se o nome é estranho ou se alguém só fala inglês. Hoje o meu nome ajuda-me a ser lembrada, o que é bom quando falamos em marca pessoal. O que é menos bom é que as pessoas sempre se lembram do meu nome, mas eu nem sempre me lembro do delas, isto já é da idade [risos]”, conta.
Mas Manon está longe de ver na idade uma desvantagem. “Acho que a idade ajuda [a mudar a perspetiva e a ver desvantagens como vantagens]. Não queremos envelhecer, mas eu vejo o envelhecer como algo muito positivo, algo que me deu muito mais autoconfiança e tranquilidade”, diz.
O tempo, e a maturidade que o acompanha, são parte da equação, mas houve um momento-chave no percurso de Manon: “Quando decidi começar com o meu próprio negócio, quando decidi fazer algo que eu realmente queria, da forma como eu queria, isso ajudou-me também a aceitar melhor aquilo que eu tenho e a reconhecer aquilo em que posso melhorar, mas de forma mais tranquila e pacífica” — e é sobre isso que queremos falar. A decisão de mudar, de voltar a lançar os dados, de reinventar-se.
“Eu tinha uma filha de poucos meses e não queria continuar com o ritmo que tinha antes de ser mãe e acabar por não ser uma mãe presente. E, como sabes, cá em Portugal não há muito equilíbrio, ou se trabalha muito ou não se trabalha de todo. No entanto, consegui encontrar um trabalho que me permitia sair às 17h00. Mas não estava muito feliz porque o trabalho não me colocava desafio nenhum, ficava com o meu cérebro adormecido, por assim dizer”.
A insatisfação serviu de alavanca — ou não fosse o ditado certeiro ‘quem está mal que se mude’. “Decidi arriscar e perguntar se podia trabalhar em part-time. Convenci a minha chefe que aquele trabalho se podia fazer perfeitamente a meio tempo e ela deu-me essa oportunidade, e assim tive espaço para começar a montar o meu negócio”.
Mas o facto é que não dá para andar toda vida em cima do muro. “Chegou o momento em que pedi férias para dar uma formação mais prolongada e não me queriam dar. E eu pensei ‘ok, agora é que é o momento. Ou vais agora concentrar-te a 100% nisto e tomar todos os riscos inerentes, ou então vais ficar assim e nunca seguir o teu sonho’. Então decidi arriscar, despedi-me. Era 1 de abril [dia das mentiras] e a minha chefe não acreditou no início, mas foi uma muito boa decisão”, conta.
Hoje recorda esse tempo de sorriso no rosto e relato escorreito, mas à data, assume, “não foi fácil”. “Em 2008 ainda não havia este boom de empreendedorismo, não havia apoios ou associações para ajudar mulheres empreendedoras, mas eu estava tão convencida de que era isto que estava feito para mim… E a verdade, que se lê nos livros mas que é mesmo verdade, é que quando nos focamos numa coisa que realmente queremos, e nos focamos a 100% e não apenas a meio tempo, as coisas acabam por aparecer. É que o nosso foco é diferente, a nossa energia é diferente, e é mais fácil de criarmos oportunidades. Esta foi uma grande lição que aprendi”, conta.
E assim nasceu a Reinvent Yourself. Mais tarde, já em fim de conversa, quando a descontração é maior, Manon revelar-nos-ia que o nome tem como inspiração a rainha da pop. “Desde a minha adolescência que a Madonna é o meu ídolo, porque ela é o que quer ser e não liga muito ao que os outros dizem, e provoca, gosto dessa parte. Ela lançou uma digressão chamada Reinvention Tour [2004] numa altura em que achávamos que ela ia parar [tinha 46 anos], mas não. Realmente ela reinventou-se e hoje em dia tem 60 anos, acaba de lançar um álbum… Realmente, a idade é só um número, uma limitação que colocamos na nossa cabeça. É importante continuar a fazer aquilo que faz sentido para nós”.
E o que faz sentido muda, claro, à medida que o tempo vai passando e o contexto se altera. Quando a Reinvent Yourself foi lançada o foco de Manon estava no desenvolvimento da marca pessoal, o que deu mote ao seu primeiro livro, lançado em 2017.
“Temos muito pouco tempo para causar uma boa primeira impressão. Há livros que falam 30 segundos, outros em 7. E [a imagem que passamos] acontece de forma muito inconsciente, basta determinada postura, o evitar o contacto visual, coisas que transmitem ou não confiança. [Uma primeira má impressão] dá para reverter, mas demora mais tempo”.
Sem perder de vista que “é mais importante ser do que parecer, porque isso é uma coisa que mais tarde ou mais cedo se descobre”, Manon divide a construção da marca pessoal em três dimensões, sendo elas o valor interior, o valor exterior e o valor atribuído.
“Estas três dimensões ajudam-nos a ter uma marca pessoal completa e autêntica. O valor interior é onde temos sempre de começar: saber quem somos, onde estão as nossas qualidades, as nossas paixões, mas também conseguir perceber o que o mundo precisa. Há aqui um trabalho grande e que não se faz em poucos dias. Quando temos isto bem claro, vamos trabalhar depois na área da comunicação. Como é que eu me divulgo? Que meios são adequados para mim? E aqui entra também a imagem, usando isso como ferramenta [de comunicação]. O valor atribuído é, no fundo, onde damos continuidade à construção da marca pessoal, porque isso nunca pára, vamos tendo feedback das pessoas para refletirmos sobre o que podemos melhorar, apostamos em formações, networking, etc. O mais difícil é a primeira parte, do valor interior, porque as pessoas às vezes estão à espera de uma solução rápida e não há. É um trabalho contínuo, sobretudo para quem quer sair do seu emprego para um mundo, no fundo, com mais incertezas. Tudo isto é muito bonito em papel, pôr em prática é algo muito diferente”.
O “papel” a que Manon se refere é o seu livro, lançado em 2017. “Foi um grande desafio [escrever o livro]. Era algo que já queria fazer a algum tempo, mas não conseguia encontrar o momento. Aliás, o mais difícil foi dizer ‘é agora’. Depois foi mais fácil. Decidi que todos os dias ia trabalhar uma hora de manhã, quando tenho maior concentração e inspiração. E é engraçado que a parte de que tinha mais medo, a de encontrar uma editora, nem foi a mais a que tive de me preocupar mais porque alguém veio ter comigo a perguntar se queria escrever sobre esse tema. Eu eu disse que já tinha começado. Portanto, às vezes basta decidir, focar e as coisas surgem no nosso caminho”.
No caminho que Manon tem vindo a percorrer, pessoal e enquanto empresa — “a empresa sou eu”, resume —, decidiu que estava na altura de caminhar para lá da construção da marca pessoal para uma visão mais holística.
Inspirada por um projeto de associação entre o ISEG e Otto Scharmer, professor do MIT que desenvolveu a Teoria U — uma metodologia de sete passos que visa quebrar com padrões de pensamento antigos e impulsionar a mudança, a inovação e aumentar a produtividade —, Manon tem-se dedicado ao tema da colaboração e da criatividade, porque “juntos conseguimos criar soluções que sozinhos não conseguimos”.
“Por exemplo, quando fazemos formação damos um conteúdo e pronto. Agora o que faço mais é a facilitação. No fundo, damos ferramentas para que o grupo arranje as soluções. Nunca sabemos o que vai sair dali, porque a dinâmica do grupo, a confiança que se cria, é que vai determinar o resultado, e isso é fascinante de ver”.
Esta metodologia visa ir ao encontro também das necessidades que as empresas que contactam Manon identificam. Entre os pedidos mais recorrentes está o trabalhar o tema das equipas, melhorando a comunicação. Trabalhar o indivíduo, sim, mas ir mais longe.
“Trabalho com ferramentas de facilitação como Lego Serious Play, entre outras metodologias, que despertam a criatividade, criam um ambiente mais informal, necessário quando queremos ir mais fundo e falar de temas mais sensíveis, porque num ambiente formal isto é muito mais difícil, estamos a pensar nas hierarquias, no que posso ou não dizer, e aí perde-se autenticidade e não se conseguem criar soluções melhores”, explica.
“As empresas que nos contactam também já sabem que a nossa forma de trabalhar é diferente, é mais holística. Também se está cada vez mais consciente de que a forma como se trabalha não é sustentável, tudo a correr, os burnouts são por alguma razão, portanto [as empresas] também estão a ver o que é que podemos melhorar para aumentar o bem-estar dos colaboradores e este modelo dá, no fundo, soluções diferentes”.
E é isto que traz Manon ao Rock in Rio Innovation Week — da marca pessoal aos jogos sérios da criatividade.
"Vamos trabalhar a criatividade, aquela que cada um tem dentro de si, mas da qual nem sempre está consciente. Vou ainda fazer um workshop partilhando metodologias que podemos utilizar a partir do momento em que definimos um problema ou um desafio. Há também sessões de mentoria individuais em que as pessoas podem trazer os seus temas, seja marca pessoal, comunicação, como começar um negócio, é a pessoa que me diz qual é o desafio. E depois vai haver uma sessão muito engraçada que é uma sessão de mentoria em grupo: vamos perceber que sabedoria existe num grupo para solucionar temas que o próprio grupo propõe. Vai ser uma sessão fora do vulgar, terá de ser um grupinho bem pequeno para manter um ambiente de intimidade e de segurança. A ideia é encontrar soluções de que estamos todos à procura”.
O desafio é sempre o da metamorfose, a mudança que começa por dentro e não pára mais. Manon o “bicho de fora”, funcionária 9-17 insatisfeita, empreendedora, escritora e o que mais vier pelo caminho, desde que continue a fazer-lhe sentido, dá uma ajuda. Com legos ou sem eles, reinvent yourself. Sim, Manon não é só a sua empresa, mas o espírito desta é definitivamente o seu.
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