“É com muita preocupação mesmo que se vê esta quantidade de vagas que sobram e sem dúvida que o Ministério da Saúde na terça-feira também deveria ter isto em conta. Não é só o facto de termos serviços de urgência encerrados de norte a sul do país, vias verdes coronárias encerradas, que deixa a população para trás, é mesmo o facto de 20% dos jovens médicos desistirem do SNS”, disse à Lusa Joana Bordalo e Sá, presidente da FNAM.

O concurso para a formação de médicos especialistas terminou no sábado com 1.836 das 2.242 vagas preenchidas, anunciou hoje a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), assumindo preocupação com a diminuição das escolhas em Medicina Interna.

A ACSS reconhece como “motivo de preocupação” a diminuição das escolhas pela especialidade de Medicina Interna, onde foram ocupadas apenas 104 das 248 vagas a concurso, sendo que este número foi “só parcialmente compensado pela admissão de 68 candidatos na especialidade de Medicina Intensiva”.

Sobre o total de vagas por preencher, Joana Bordalo e Sá referiu que “21,2% dos candidatos optarem por não escolher uma vaga no SNS significa que desistem, numa fase tão precoce, do SNS”, sublinhando os números relativos a Lisboa e Vale do Tejo, onde ficaram 168 vagas por preencher, o que “provavelmente também reflete o elevado custo de vida nessa zona, sobretudo em Lisboa.

A presidente da FNAM olha com preocupação para o total de vagas sobrante em Medicina Geral e Familiar, que foram médicos de família, uma das grandes carências do país, mas também em Medicina Interna, que a ACSS reconheceu em comunicado como “uma especialidade nuclear para o funcionamento das unidades hospitalares”, motivo pela qual vai analisar a quebra de interesse na especialidade.

Joana Bordalo e Sá frisou que a nível nacional 60% das vagas em Medicina Interna ficaram por preencher, com 144 vagas vazias, considerando “também preocupante que os dois grandes centros hospitalares de Lisboa – Lisboa Central e Lisboa Norte — só tenham tido duas vagas de Medicina Interna ocupadas”.

“No fundo, tudo isto demonstra a desesperança dos jovens médicos que acabam por não iniciar o internato médico no SNS. Isto é fruto da degradação das condições de trabalho também no SNS e é preciso dar nota que os médicos internos não são meros estagiários, são médicos e como tal têm uma grande responsabilidade nas suas mãos, a vida dos doentes nas suas mãos e representam neste momento um terço da força de trabalho no SNS”, disse.

A presidente da FNAM referiu que, atualmente, os médicos internos “passam a vida a tapar buracos”, substituindo especialistas nos serviços de urgência, o que por sua vez contribui para o desinteresse no internato médico no SNS, frisou.

“Faltam médicos especialistas, isto vai ter repercussões depois nos médicos internos, porque os médicos internos são formados por especialistas”, disse.

“A FNAM sempre defendeu que o internato médico deve ser reintegrado na carreira, exatamente porque os médicos internos são um terço da força de trabalho no SNS e deve ser o primeiro patamar da carreira, para que os jovens médicos possam estar protegidos e para que se consiga garantir uma formação mesmo de qualidade”, acrescentou.

Para Joana Bordalo e Sá, que olha com preocupação para o número de jovens médicos que vão optar por emigrar e fazer a especialidade no estrangeiro e para os que vão preferir ser prestadores de serviços, a resposta é só uma: “é preciso melhorar as condições de trabalho no SNS, não há outra maneira”.

Os sindicatos dos médicos e o Governo voltam a reunir-se na terça-feira, véspera da votação final do Orçamento do Estado para 2024, para tentar alcançar um acordo no âmbito de negociações que decorrem há 19 meses.