No final de uma cerimónia militar junto ao Monumento aos Combatentes do Ultramar, em Lisboa, o almirante António Silva Ribeiro respondeu a perguntas da comunicação social sobre a Operação Miríade, uma investigação judicial sobre tráfico de diamantes, ouro e droga, no âmbito da qual a Polícia Judiciária (PJ) executou cem mandados de busca e deteve onze pessoas, incluindo militares e ex-militares.

Questionado sobre a não comunicação deste caso ao chefe de Estado e Comandante Supremo das Forças Armadas, Marcelo Rebelo de Sousa, o CEMGFA respondeu: “Essas circunstâncias já foram esclarecidas pelo senhor Presidente da República e pelo senhor ministro da Defesa. As Forças Armadas informaram dentro da sua estrutura de comando, e a sua estrutura de comando fez a participação à Polícia Judiciária Militar (PJM)”.

O CEMGFA assinalou que “quem detetou estas circunstâncias foram os militares do Exército na República Centro-Africana, e foram eles que comunicaram, como deve ser, pela cadeia hierárquica a possibilidade de haver um ilícito criminal”, que na altura envolvia “dois militares que tinham estado em anteriores missões”. Isso aconteceu “em final de dezembro de 2019”, referiu.

Posteriormente, foi adotado “um conjunto de medidas complementares de ações, quer no Aeroporto de Trânsito n.º 1 da Força Aérea, quer pelo Exército dentro daquilo que é a preparação das bagagens e depois o seu despacho nos aviões para Lisboa, bem como o seu controlo à chegada” que, segundo o CEMGFA, “garantem absolutamente que não há possibilidade de repetição destes acontecimentos”.

Atualmente, existe “um controlo rigoroso de todas as bagagens, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) é chamado, a Autoridade Tributária é chamada, a Força Aérea quando chegam as bagagens toma um conjunto de procedimentos muito rigorosos, muito mais rigorosos do que aqueles que existem nos aeroportos civis relativamente ao controlo de bagagens”.

O CEMGFA referiu que “os militares entregam as bagagens 24 horas antes de entrarem nos aviões, as bagagens são verificadas, são revistadas, e depois são-lhes entregues só à chegada a Lisboa”.

“Hoje em dia nós temos absoluta garantia de que esse tipo de ações, que são essencialmente de dissuasão, conjugadas com aquilo que são os valores fundamentais da instituição militar, são suficientes para garantir que esse tipo de desvios comportamentais não se repetiu desde 2019 e não se voltará a repetir”, afirmou.

O almirante Silva Ribeiro realçou ainda que “quando a denúncia chegou era uma denúncia relativa à eventual participação de dois militares, eventualmente dois militares”.

“Não havia nem nunca houve a perceção, logo de início, de que o problema fosse desta dimensão. Nós só tivemos essa compreensão exatamente ao mesmo tempo que os senhores tiveram, na segunda-feira passada”, acrescentou, dirigindo-se aos jornalistas.

"O que eu sinto é evidentemente uma profunda tristeza e manifesto o meu profundo repúdio por aquilo que foi o comportamento daqueles militares e ex-militares na República Centro-Africana. Eu não me sinto envergonhado, porque as Forças Armadas não são aquilo. Eu sinto-me é orgulhoso do extraordinário trabalho que os militares fazem", afirmou ainda o almirante.

O almirante Silva Ribeiro referiu que desconhecia "os desenvolvimentos, aliás, como deve ser, do processo judicial" – que já levou à detenção de onze pessoas, incluindo militares, um advogado, um agente da PSP e um guarda da GNR – e que "nunca houve a perceção, logo de início, de que o problema fosse desta dimensão".

"Evidentemente que agora cabe à justiça averiguar os factos e aplicar as leis relativamente àqueles que eventualmente tenham cometido crimes", acrescentou.

O CEMGFA realçou que "este tipo de comportamentos é absolutamente intolerado nas Forças Armadas" e que tudo será feito "para corrigir este tipo de desvios", com eventuais consequências "de natureza disciplinar", uma vez "averiguadas as circunstâncias relativas aos militares".

O almirante Silva Ribeiro deixou uma mensagem de orgulho no "trabalho abnegado e competente" dos militares portugueses, defendendo que não se pode "misturar aquilo que é o comportamento eventualmente desviante de alguns militares com aquilo que tem sido ao longo da história os brilhantíssimos serviços que as Forças Armadas têm feito por Portugal e pelos portugueses".

Interrogado sobre potenciais efeitos externos deste caso, o CEMGFA considerou que nas Nações Unidas e na República Centro-Africana existe a perceção de que "isto foi um fenómeno localizado com um grupo restrito de militares naquela ocasião e que este fenómeno nunca mais se repetiu desde aí para cá".

"As nossas forças na República Centro-Africana gozam de um tal prestígio pelos atos heroicos que têm feito na defesa da vida das populações que aquilo que eu tenho visto na República Centro-Africana são ovações às nossas tropas sempre que elas passam. E, portanto, eu tenho a certeza de que os cidadãos da República Centro-Africana, tal como nós, saberemos bem distinguir aquilo que foi o comportamento incorreto, eventualmente criminoso, de alguns militares daquilo que é o trabalho abnegado, esforçado, heroico, direi mesmo, das nossas forças militares na República Centro-Africana", declarou.

Ainda a propósito da Operação Miríade, o almirante Silva Ribeiro assegurou que "as Forças Armadas continuarão a cumprir as suas missões com brio e com relevância e serão absolutamente intolerantes para quaisquer comportamentos que se desviem daquilo que são os valores militares".

"Desde que foram detetados os primeiros indícios, em final de 2019, tem havido o cuidado de sensibilizar as nossas forças para este tipo de problemas. Eu próprio quando recebo os comandantes das forças nacionais destacadas falo sempre com eles e alerto-os para a necessidade de um cumprimento rigoroso daquilo que são as normas e os valores militares", salientou.