"Recebi mensagens privadas em tom de ameaça, fui à polícia no mesmo dia. Tentei fazer um enquadramento das mensagens, ver se era possível enquadrar como ameaça ou coação. Nos dois casos, analisando o Código Penal, não eram mensagens explícitas no sentido de ameaça. Por exemplo, recebi uma mensagem que dizia: 'Vais [embora] e não bufas, tu e toda a lixeira que aqui vem desaguar, escondidos no meu país a roubar. Agora é a sério, a guerra começou. Vais a bem ou queres ir a mal?'", revelou hoje à Lusa Juliano Mattos.
A notícia sobre a constituição do movimento, que reúne estudantes e imigrantes brasileiros em Portugal, foi divulgada no domingo, tendo surgido comentários na página da FIBRA na rede social Facebook e também em mensagens privadas enviadas aos fotógrafo luso-brasileiro, de 36 anos.
Apesar das tentativas do responsável pela comunicação da FIBRA, a polícia não conseguiu enquadrar as mensagens no crime de ameaça, coação ou de xenofobia, não havendo também nenhuma denúncia no Ministério Público, mas o caso foi registado pelas autoridades.
Juliano Mattos explicou que a exposição foi algo procurado pelo grupo, alegando que não estão a fazer "nada de errado" e, como assumem o "ativismo político, faz sentido [o grupo] ser público e visível", mas não escondeu alguma apreensão pessoal.
"Como as ameaças foram dirigidas a mim, fico um pouco receoso. Sou algo conhecido no Porto, fotografo festas. Vivo cá há muito tempo e, em alguns comentários, as pessoas diziam que me conheciam. Estou tranquilo, não vou procurar nenhum tipo de proteção, nem me vou inibir, continuo a minha vida. Claro que, ao andar pela rua à noite, já tenho um certo receio. Ando mais de transportes públicos, em vez de andar a pé, mas durante o dia a minha vida segue normalmente", disse.
O grupo criou uma rubrica de vídeo na sua página no Facebook, intitulada "Dois minutos de amor", em referência aos "dois minutos de ódio" do livro 1984, de George Orwell, no qual respondem aos comentários de forma informativa e humorística.
"Se reagirmos de forma negativa, criamos toxicidade e enlouquecemos também. Para criar um ambiente mais leve, vamos tratar esses comentários - que não são ameaças - como algo construtivo. Em relação às ameaças em si, temos guardado tudo o que recebemos no grupo ou em mensagem privada. Vai ser guardado e destinado à polícia. Não temos problema nenhum em fazer denúncias, porque o perfil do grupo é não-violento e o nosso combate antifascista é feito dentro das ideias", garantiu.
O objetivo passa por explicar que há pessoas dentro da associação que são luso-brasileiras e, mesmo que não fossem, têm o direito de "participar na vida política" do país, pretendendo "desconstruir a ideia" de que os imigrantes "estão aqui apenas para o trabalho precário".
Apesar das ameaças e dos comentários negativos, a reportagem permitiu à FIBRA angariar cerca de "300 novos seguidores" nas redes sociais, assim como várias mensagens de brasileiros que vão ainda chegar a Portugal e querem conhecer a plataforma, assim como alguns que já estão no país, mas não conheciam, apontando ainda que "há mais mensagens de pessoas a querer participar do que a insultar".
"No domingo exibimos o documentário "O Processo", foi totalmente aberto e recebemos cerca de 50 pessoas. Grande parte não conhecíamos. Ou seja, não foi uma coisa limitada à nossa bolha social, houve gente que apareceu e não nos conhecia. Vamos continuar a fazer coisas assim, abertas ao público, sem medo de dar a cara e sem medo de participar. Esperando que não aconteça nada, mas se acontecer, as medidas vão ser tomadas, sem qualquer problema", vincou.
O movimento, criado há cerca de dois meses, pretende combater a ascensão da extrema-direita no Brasil e em Portugal e ajudar cidadãos brasileiros que saiam do seu país devido à atual situação política, após a eleição de Jair Bolsonaro (extrema-direita) como Presidente.
Comentários