"O que nós infelizmente testemunhámos nos últimos dias foram essas marchas de extremistas de direita e neonazis preparados para a violência, que não têm nada a ver com o luto de um homem, mas visam enviar uma mensagem de ódio contra os estrangeiros, políticos, polícias e contra uma imprensa livre", declarou Steffen Seibert, o porta-voz de Merkel.
"Precisamos deixar uma coisa clara: todo cidadão tem direito à palavra e a tomar uma posição contra a divisão do nosso país", salientou.
Esta foi a reação da chanceler alemão aos últimos acontecimentos nas ruas de Chemnitz planeados por várias organizações de extrema-direita, que reuniu 8000 pessoas para denunciar a morte de um alemão de 35 morto com facadas na rua.
A justiça alemã prendeu um iraquiano de 22 anos e um suspeito de ser cúmplice de nacionalidade síria.
Extrema direita na Alemanha
A extrema-direita alemã tem aproveitado o assassinato do alemão de 35 anos para criticar os imigrantes e a política de abertura defendida por Angela Merkel. A chanceler é acusada de ter aumentado a insegurança no país, ao receber, entre 2015 e 2016, mais de um milhão de pedidos de asilo.
Para além deste caso, o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) tem destacado também o assassinato de uma adolescente de 15 anos no final do ano passado num supermercado na cidade de Kandel, no sudoeste do país, perto da fronteira com França.
Esta segunda-feira, o seu ex-namorado, Abdul D., asilado do Afeganistão, foi condenado a oito anos e meio de prisão pelo crime, sendo expulso do país após o cumprimento da pena.
Porém, o responsável pela cidade de Kandel, Volker Poss, diz que a mobilização do AfD local vai continuar: "O movimento de extrema-direita já anunciou a sua vontade de continuar a vir [manifestar-se para a cidade]".
Em Chemnitz, 18 pessoas, incluindo três polícias, ficaram feridas na noite de sábado, à margem do protesto anti-imigrantes, e de uma contramanifestação de esquerda que reuniu 3.000 pessoas. Entre os feridos está um jovem afegão de 20 anos que foi espancado por homens mascarados, um militante do Partido Social-Democrata e uma equipa de televisão.
A mobilização anti-imigrantes está a dar frutos para a extrema-direita. De acordo com as últimas pesquisas, o AfD está a ganhar terreno nas intenções de voto com 16%, em terceiro lugar, atrás do Partido Social-Democrata, que tem 17%.
Para esta tarde está previsto um concerto de rock nesta cidade contra a xenofobia, com o slogan "Somos mais". Os moradores de mais idade foram convidados a participar através da "manifestação nas janelas", que consiste em pendurar mensagens de tolerância nas varandas.
O ministro alemão das relações externas, Heiko Maas, defende, no entanto, que a mobilização é modesta que é preciso "deixar os nossos confortáveis sofás e falar em voz alta".
Portugueses em Chemnitz
Os portugueses que vivem em Chemnitz, na Alemanha, negam ter sido alvo de atos discriminatórios e acreditam que tem havido "aproveitamento político" da extrema-direita, depois da morte por esfaqueamento de um cidadão alemão.
Após a morte por esfaqueamento de um alemão, a 26 de agosto, e a detenção pela polícia de dois suspeitos do crime, os grupos de extrema-direita lançaram no domingo uma “caça aos estrangeiros” nas ruas de Chemnitz.
A viver há sete anos na Saxónia, Lúcia Soares não esconde o receio: "tenho medo, apesar de ter dupla nacionalidade e de ser casada com um alemão, tenho receio de ir ao centro da cidade".
"Aqui há estrangeiros de primeira e segunda", confessa Lúcia Soares, que admite não ter sentido na pele "xenofobia ou racismo" apesar de estar certa de “que existe, por falta de conhecimento das pessoas e também pelo passado político que viveram".
Apesar de reconhecer que "o problema das pessoas de Chemnitz é com os refugiados", a enfermeira portuguesa não esconde que vai ouvindo alguns comentários racistas: "há uma colega de trabalho que diz que, se pudesse, pegava nos estrangeiros, juntava-os num avião e mandava-os para a terra deles".
Lúcia Soares lamenta que exista um "aproveitamento" por parte dos movimentos de extrema-direita alemães, revelando que "uma grande parte dos manifestantes que se tem juntado desde que começaram os protestos não é de Chemnitz, vem de outros lados da Alemanha".
Apesar de sentir medo, adianta que por agora não pensa em sair do país: "Tenho aqui a minha vida estável, o meu marido, os meus filhos e o meu trabalho, vou ficar por cá enquanto sentir que não estou realmente em perigo", adianta a enfermeira portuguesa de 50 anos.
Lúcia Soares não encontra justificação para os atos violentos contra os refugiados, mas acredita que "houve uma entrada descontrolada" de migrantes no país, defendendo outra forma de agilizar o processo por parte da chanceler Angela Merkel.
A morar em Chemnitz há cinco anos, Afonso Henrique Manita assegura que nunca teve "problemas, nem nenhuma situação desagradável ou de racismo, nem com alemães, nem com nenhum outro cidadão de outro país".
"Logicamente evito aproximar-me da zona das manifestações, pois se, por um lado, penso que há muito aproveitamento político por parte da extrema-direita, compreendo a parte alemã. Há muitos jovens recém-chegados como refugiados, a sua grande maioria recebe casa, dinheiro, escola e formação por parte do estado alemão e são muitos os que não querem trabalhar, nem estudar", reconhece o português que vive a dois quilómetros do local onde foi morto um cidadão alemão.
Mas Afonso Henrique Manita também recorda o tempo em que trabalhou com vários árabes, que o ajudaram muito e de quem ficou amigo.
Numa resposta enviada à agência Lusa, a embaixada de Portugal em Berlim revela não ter conhecimento de nenhum português envolvido nos acontecimentos de Chemnitz.
Madremedia com agências
(Notícia alterada às 21:01. Correção no título)
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