Francisca Van Dunem, que cumpre uma visita de três dias a Angola, dirigiu hoje uma palestra na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto, em Luanda, sobre os desafios da universidade e do seu desenvolvimento.
A governante portuguesa respondia à questão colocada por um estudante, sobre como encarou as últimas transformações que Angola viveu no seu processo político.
"Todos os processos, os procedimentos, os movimentos, que visem criar maior igualdade, maior coesão social, que visem reduzir a soma de dor, de incompreensão que existam entre as várias camadas da sociedade, são movimentos bem-vindos", afirmou.
A ministra portuguesa, natural de Luanda, referiu também que é preciso cumprir com os direitos humanos, sobretudo porque, em democracias mais recentes, “os processos de rutura foram, normalmente, feitos em nome da necessidade de igualdade, de maior coesão social, de uma aproximação a sociedades mais justas e mais equitativas".
"E tudo que seja caminhar nesse sentido é, para mim, positivo", disse Francisca Van Dunem.
Relativamente à área da justiça, a governante portuguesa disse que quer Angola quer Portugal enfrentam problemas comuns também a outros sistemas judiciários.
"[O sistema judiciário] deixou de estar onde esteve durante muito tempo, numa posição de quase superioridade, se assim se pode dizer, ou, no mínimo, protegido por um manto de intocabilidade", explicou.
Face a essa situação, a justiça verifica hoje um ‘gap' (hiato) entre a aplicação do direito e as formas que os juristas estão habituados a aplicar, bem como o nível de satisfação das sociedades pelas quais é aplicado o direito, acrescentou.
"O que temos hoje é, de facto, níveis grandes de incompreensão para respostas de direito", declarou, dando como exemplo, em Portugal, os fenómenos de violência doméstica.
"Na forma como o direito é aplicado, não tem depois um nível de aceitação ou de compreensão pela população em geral, mesmo em alguns casos em que a aplicação do direito se pode dizer que foi feita de acordo com todos os parâmetros da boa aplicação", especificou.
Por outro lado, considerou a "grande crise da justiça" como o desencontro entre quem faz as leis, quem aplica, e a sociedade e o povo, nomeadamente ao nível da organização e de crises institucionais, que se prendem com o tempo da justiça.
Francisca Van Dunem adiantou que, nos últimos quatro anos, Portugal melhorou muito no tempo da administração da justiça, reduzindo a pendência em mais de 300 mil processos.
"Mas, mesmo assim, continuamos a ter pendências muito importantes", reconheceu a ministra, salientando a necessidade de maior celeridade, "numa altura em que tudo acontece instantaneamente neste mundo".
"E esta dimensão tem de ser seriamente encarada pelos juristas, porque aquilo que acontece é que, na prática, as pessoas fazem depois apelos a outras formas de julgar, muitas vezes até ao julgamento popular. E mais, isto tem efeito profundamente deslegitimador na justiça estadual e também no próprio direito", afirmou.
Durante a palestra, Francisca Van Dunem apresentou ainda como desafios aos estudantes de Direito as alterações climáticas, uma questão que "deixou de ser teórica".
"É um combate das pessoas, em geral, mas os juristas têm, em particular, uma grande obrigação nestas matérias, nas questões relacionadas com o urbanismo, com o ambiente, com o património cultural. Isso são hoje áreas do direito que devem ser trabalhadas e acarinhadas nas faculdades e que devem ser incentivadas em termos práticos", declarou à imprensa, no final da palestra.
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