Há duas décadas, antes mesmo de o sol nascer, Matilde Tivane, 45 anos, faz-se às escuras ruas do interior de bairro de Polana Caniço, onde vive com os seus dois filhos, a caminho da sua pequena banca, instalada à entrada do mercado Xiquelene.
A imundice do chão de um dos mais populares mercados de Maputo e a fiscalização das autoridades municipais, proibindo os comerciantes de se instalarem ao longo dos passeios, eram, até há pouco tempo, as principais ameaças à pequena banca de Matilde Tivane, composta por "um pouco de tudo" - alface, tomate, alho, feijão?
Hoje, associados a estas ameaças, o pequeno negócio, como tantos outros de um dos países mais pobres do mundo, debate-se com problemas muito maiores, após a revelação de que a dívida pública de Moçambique disparou para mais de 70% do PIB, em resultado de empréstimos garantidos pelo Estado e ocultados nas contas públicas.
"O negócio está mal, as coisas que nós ouvimos pela televisão e pela rádio são assustadoras", lamenta a comerciante.
Se há poucos anos Moçambique era, para muitos, um futuro "el dourado", apontado como exemplo de crescimento a nível regional, hoje o país tem um futuro incerto, abalado, ao mesmo tempo, por várias crises.
Além da dívida, o arrefecimento da economia, a desvalorização do metical face ao dólar, a inflação e a crise político-militar entre as forças dominantes são os desafios de Moçambique, que ainda espera as decisões finais das grandes companhias que vão explorar o gás natural no norte do país e a esperança de receitas milionárias para o Estado.
"O mercado está difícil, isso todo o mundo pode ver", observa Mamudo Uosif, gerente da Mundo de Câmbios. Várias casas começaram a fechar, "como no resto da economia". Ao mesmo tempo, a troca informal de dólares voltou a Maputo e não entra no sistema financeiro.
Nos principias mercados do país, os preços continuam a instáveis e, numa ronda pelos centros comerciais, não são poucas as reclamações tanto dos comerciantes como dos clientes que, mesmo enfrentando as três crises, lutam pela sobrevivência.
"Isto está mal, está tudo caro agora", diz uma cliente de Matilde Tivane, enquanto escolhe o melhor tomate na banca da comerciante, que, respondendo ao comentário, explica que de assuntos económicos pouco sabe, mas já percebeu que "as coisas estão negras para a ´perola do Índico´".
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