“A área devia ser aumentada e não reduzida”, afirmou à agência Lusa Luís Damas, presidente da Federação Nacional das Associações de Proprietários Florestais (FNAPF), como também defendeu a Associação da Indústria Papeleira - Celpa.

Segundo a FNAPF, as condicionantes à plantação ou replantação de eucaliptos tem vindo a contribuir para o abandono de anteriores povoamentos, após o corte da madeira.

“Esta proibição provocou desinteresse e abandono por parte de muitos proprietários, que deixaram de cuidar daquilo que é seu”, explicou o dirigente, acrescentando que essas “são áreas de floresta sem produção onde têm custos de manutenção” e, por falta de limpeza por não serem áreas produtivas, é por aí que entram os fogos.

‘Guardiões da floresta’, por serem os primeiros a querer proteger o seu negócio, os proprietários florestais querem transformar matos em floresta, para estas áreas passarem a ter uma gestão profissional, minimizando o risco de incêndio.

“Temos muitas áreas que são matos e nestes dias estão a ser tomadas pelos fogos porque não têm gestão”, justificou a FNAPF.

“Quase metade da área ardida corresponde a matos e pastagens, seguindo-se o pinheiro-bravo e só depois o eucalipto”

Na mesma perspetiva, o diretor-geral da Associação das Indústrias Papeleiras - Celpa, Francisco Gomes da Silva, lembrou à Lusa que “quase metade da área ardida corresponde a matos e pastagens, seguindo-se o pinheiro-bravo e só depois o eucalipto”, concluindo que os incêndios ocorrem sobretudo em áreas de “ausência generalizada de práticas de silvicultura”.

Para a FNAPF, a proposta poderia ser uma solução para resolver os problemas do minifúndio.

“Posso ter dois hectares e geri-los bem, mas, se os meus vizinhos não fizerem nada à volta, o incêndio vem e eu com dois hectares não os consigo salvaguardar”, advertiu Luís Damas.

As duas associações alertaram também que as restrições ao aumento da área de eucalipto, uma das espécies onde há maior investimento por ser de crescimento rápido, tem causado “prejuízos económicos” ao país.

Desde logo, restringem o potencial de produção e de exportação e contribuem para o aumento das importações de madeira (25% da madeira transformada pelas indústrias), para a escassez de produtos e para o aumento dos preços.

“O aumento de produção nacional só não se concretiza por existir uma clara ‘perseguição’ a esta espécie”, apontou a FNAPF.

Para o aumento da área, a associação defendeu a existência de “áreas de compensação”, que ainda não estão regulamentadas, exemplificando que, num projeto de 100 hectares, 50 seriam de espécies de crescimento rápido e os restantes de espécies autóctones.

A área de eucalipto passou de 810 mil hectares, em 2010, para 845 mil hectares, em 2015, de acordo com os últimos dados, dos quais cerca de 300 mil são certificados.

Contudo, as associações estimam que esta área tem vindo a reduzir desde 2017, em resultado dos incêndios de 2017 e 2018 e das condicionantes impostas.

O eucalipto representa 26% da floresta portuguesa e Portugal é o terceiro maior produtor europeu de pastas e o segundo de papel.

O país é um dos cinco principais produtores mundiais da espécie de eucalipto ‘ Eucalyptus globulus’, de onde é extraída a melhor fibra para o fabrico de papel, a par da Espanha, Austrália, Chile e Uruguai, o que torna a indústria da celulose competitiva a nível mundial e constitui uma enorme oportunidade para o crescimento de todo o setor.

O setor da produção possui um potencial de produção de 340 milhões de euros/ano em valor de madeira de eucalipto e emprega 100 mil trabalhadores.

A indústria da pasta e do papel produz por ano 1,9 milhões de toneladas de papel e cartão, possui cerca de 4.500 postos de trabalho e um volume de negócios de 2,9 mil milhões de euros, dos quais 2,3 mil milhões ao exportar metade da sua produção.

“Nos casos em que o eucalipto está abandonado e não tem uso produtivo, tem de ser forçado a deixar de existir ”

As associações ambientalistas defendem uma gestão mais integrada da produção de eucalipto com vista a um melhor ordenamento da floresta portuguesa contra incêndios, para se conseguir conciliar com os interesses deste setor económico.

“Temos uma indústria em Portugal instalada, temos eucaliptos na paisagem, temos necessidade da matéria-prima que produz valor e cria emprego, por isso não queremos a erradicação das plantações e da indústria do eucalipto. Agora, temos de ter uma gestão equilibrada do território que possibilite que também existam outras espécies e isso não está a acontecer”, afirmou Paulo Lucas, da Associação Zero, à agência Lusa.

Considerando que “há um certo descontrolo da plantação do eucalipto”, com a espécie a crescer em áreas “pouco produtivas” de minifúndio e sem qualquer gestão, o ambientalista defendeu que os limites legais à plantação ou replantação desta espécie “não devem ser ultrapassados”.

“Nos casos em que o eucalipto está abandonado e não tem uso produtivo, tem de ser forçado a deixar de existir com o Governo a promover a reflorestação com espécies autóctones”, preconizou por seu turno à Lusa Miguel Jerónimo, do Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (GEOTA).

Para o coordenador de projetos de reflorestação em Monchique e Leiria, é preciso “evitar ter dezenas de quilómetros de uma só espécie, intercalar o eucalipto com bosques de espécies autóctones para promover o ordenamento e proibi-lo em zonas de alta perigosidade de incêndio”.

Tendo o eucaliptal um ambiente mais seco do que o de outras espécies arbóreas, o que propicia uma maior propagação e projeção do fogo, o dirigente alertou que, para haver essa descontinuidade da mancha florestal, a área de eucalipto tem de ser reduzida.

A mesma posição é assumida pela Associação Zero.

Ambas as associações defenderam que os povoamentos em que os proprietários plantaram outras espécies arbóreas para “compensar” os de eucalipto também não podem ficar ao abandono e carecem de uma gestão contra os incêndios, sob pena de constituírem uma “bomba-relógio” sempre que existe combustível por limpar.

Por todos estes motivos, preconizaram, não basta apostar na certificação do eucalipto que, além de cara, não constitui um verdadeiro avanço para o ambiente e para a defesa da floresta contra incêndios, quando o problema é o desordenamento florestal, o abandono da terra e a falta de gestão.

É urgente o ordenamento florestal, alternando a mancha florestal com várias espécies, frisaram.

“Não basta decretar a proibição da expansão do eucalipto e o apoio à reconversão e depois ficar à espera de que sejam as próprias pessoas a fazê-lo, quando não têm meios”, disse Miguel Jerónimo, para quem é necessário passar dos planos às ações concretas no território, com áreas integradas de gestão da paisagem, e investir na prevenção dos incêndios neste quadro de alterações climáticas, com fenómenos climáticos extremos cada vez mais frequentes.

“Este Governo trouxe uma nova visão com um plano de transformação da paisagem, mas basta ir a áreas ardidas como em Pedrógão [2017] ou Monchique [2018] e ver que a floresta continua exatamente na mesma ou até pior”, exemplificou.