“Parece que o Lorde [David] Brownlow teve acesso ao primeiro-ministro e ao ministro de Cultura porque estava a pagar pela remodelação luxuosa do seu apartamento (…) Nesse caso, é corrupção pura e simples”, afirmou a vice-líder do ‘Labour’, o principal partido da oposição, Angela Rayner.

De acordo com mensagens de telefone escritas divulgadas na quinta-feira, Boris Johnson concordou em estudar propostas para um grande evento cultural proposto por Brownlow, militante e membro da Câmara dos Lordes pelo Partido Conservador.

O primeiro-ministro concordou em examinar a proposta, dizendo ao colega conservador “[Eu] estou [a tratar do] plano para a grande exposição … irei responder”, numa mensagem onde pedia a Brownlow dinheiro adicional para acabar as obras de remodelação.

Poucos meses depois, o então ministro da Cultura, Oliver Dowden, recebeu o milionário e outros representantes na sala de concertos Royal Albert Hall, que foi construída após a primeira Grande Exposição em 1851, durante o reinado da Rainha Vitória, e que estava na origem da proposta.

A ideia para uma nova Grande Exposição não se concretizou, tendo o Executivo avançado para um festival à escala nacional chamado “Unboxed” durante este ano.

Em declarações hoje à Times Radio, o sub-secretário de Estado da Economia, Paul Scully, respondeu que é normal o Governo receber este tipo de propostas.

“Mas o importante é que não foi para a frente (…) não há nada de ilícito que tenha surgido de umas linhas num WhatsApp

”, afirmou.

A troca de mensagens sobre o festival foi divulgada na quinta-feira por Christopher Geidt, responsável por fiscalizar o cumprimento das normas de conduta dos ministros, numa revisão da investigação inicial sobre o financiamento das obras de remodelação dos aposentos de Boris Johnson em Downing Street.

O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, apresentou “desculpas humildes e sinceras” por não ter revelado todas as mensagens de telemóvel no primeiro inquérito, alegando que tinham ficado num telemóvel antigo.

Geidt disse que o “episódio abalou a confiança” devido às “falhas” no processo de facilitação de informação pelo gabinete do primeiro-ministro, mas manteve a conclusão do inquérito finalizado no início deste ano de que o primeiro-ministro não transgrediu os regulamentos.

Nessa primeira investigação à potencial violação do código ministerial por não declarar donativos, Geidt, que também é membro da Câmara dos Lordes e foi secretário privado da Rainha Isabel II, absolveu Johnson porque este disse que não conhecia a origem do financiamento.

Geidt considerou mesmo assim que Johnson se portou de forma “imprudente” na forma como financiou as obras.

Mas, numa segunda investigação, a Comissão Eleitoral viu evidências de que Johnson enviou ao milionário David Brownlow uma mensagem de telemóvel em novembro de 2020, pedindo-lhe para autorizar ainda mais, naquela altura sem especificar o valor, obras de remodelação na residência, o que sugere que o primeiro-ministro sabia de onde vinha o dinheiro.

Os regulamentos parlamentares dizem que qualquer donativo acima de 500 libras (600 euros) deve ser registado e declarado.

Como penalização, a Comissão Eleitoral multou o Partido Conservador em 17.800 libras (21.300 euros) por ter concluído que os conservadores não conseguiram “documentar com precisão um donativo e manter um registo de contabilidade adequado” do dinheiro entregue em outubro de 2020 por Brownlow.

O relatório da Comissão Eleitoral disse que os conservadores alegaram repetidamente que o dinheiro não tinha sido um donativo ao Partido e que as justificações para o pagamento variaram entre ser “um donativo ao primeiro-ministro através do partido”, um “presente para a nação”, um “assunto ministerial” e o “reembolso de um empréstimo”.

No relatório final, a Comissão calculou que Brownlow entregou 52.801,72 libras (63.165.91 euros) ao Partido Conservador para pagar as obras de remodelação, as quais, segundo a imprensa britânica, terão custado 112.000 libras (134.000 euros).

Esta despesa gerou controvérsia por ter ultrapassado em muito o limite anual de 30.000 libras (36.000 euros) concedido ao primeiro-ministro para decorar os aposentos pessoais na residência oficial, em Downing Street.

Na sequência do escândalo, Boris Johnson acabou por assumir o custo total das obras.