Os números são conhecidos: 60% dos alunos do ensino secundário não prosseguem estudos superiores e entre estes são os que frequentam o ensino profissional que menos interesse mostram em conseguir um ‘canudo’.

A isto junta-se uma taxa de 55% de adultos entre os 25 e os 64 anos que não tem o ensino secundário completo e estão encontrados os dois grandes públicos-alvo por onde o ensino superior pode ainda crescer, do ponto de vista da investigadora Cláudia Sarrico, que na segunda-feira será uma das oradoras na Convenção do Ensino Superior 2020-2030, no ISCTE, em Lisboa, e é promovida pelo conselho de reitores (CRUP).

É sobretudo do lado dos adultos, onde o potencial e necessidade de formação é ainda elevado, que a investigadora do CIPES – Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior e professora no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) entende que melhor se aplicaria uma maior colaboração entre o ensino secundário e o ensino superior, delineando “formações à medida dessas pessoas”, de conclusão do ensino secundário que permitam e motivem a prosseguir para o ensino superior.

Depois, quer para os adultos, quer para os alunos mais novos, é necessário “diversificar a oferta” e ligá-la às empresas, aos serviços públicos, ao setor social, aos municípios, defende a investigadora, para quem só nesta base de diálogo será possível ter um ensino superior que contribua para o desenvolvimento da economia e da sociedade.

“O objetivo tem que ser aumentar participação de forma sustentada e a oferta tem que ser adequada e diversificada. Se vamos buscar novos públicos vamos ter que diversificar a oferta. Portugal não tem tido essa tradução e parece-me que pode criar isso”, disse Cláudia Sarrico à Lusa, citando exemplos que estudou e conhece bem, como o caso holandês, onde a ligação do ensino profissional ou vocacional às universidades de ciências aplicadas (equivalentes aos politécnicos portugueses) e destas aos parceiros sociais se tem mostrado profícua e revelado sucesso, sobretudo no que diz respeito à inserção no mercado de trabalho.

Ainda citando o exemplo da Holanda, mas agora no que diz respeito ao financiamento do ensino superior, a analista da OCDE refere que o sistema de empréstimos a estudantes com garantia do Estado está a ganhar terreno na Europa, retirando a responsabilidade do custo às famílias, referindo ainda que no caso português o peso do financiamento suportado pelas famílias, através das propinas, tem um peso relativo superior a outros países europeus e pode estar a funcionar como entrave ao acesso.

“O que muitos países estão a introduzir são os sistemas de empréstimo com garantia do Estado. É a ideia de um estudante poder pedir empréstimo para estudar e aí não há entrave, porque todos recebem o empréstimo desde que sejam elegíveis para frequentar o ensino superior. Vão pagá-lo se e quando atingirem determinado nível de rendimento”, disse a investigadora, que também admite riscos neste modelo de financiamento ainda com expressão muito reduzida em Portugal.

Para evitar situações de incumprimento e de um peso de despesa para o Estado, é necessário introduzir regulação, desde logo na seleção de alunos à entrada, que mostrem estar motivados para concluir o curso e obter as competências necessárias para um emprego com um nível remuneratório suficientemente elevado que permita pagar o empréstimo, evitando que as universidades possam estabelecer o recrutamento de alunos sem critério, apenas com o objetivo de obter o financiamento que cada estudante representa por via do empréstimo concedido ‘a priori’.

Mas é também necessária atenção à regulação das propinas, estabelecendo um limiar máximo nos valores que as instituições podem cobrar, não permitindo que entrem numa lógica de mercado e de competição em serviços e instalações oferecidas aos alunos sem efeitos na qualidade do ensino.

O financiamento será um dos painéis de discussão da convenção e tem entre os oradores o presidente do Sindicato Nacional do Ensino Superior (SNESup), Gonçalo Leite Velho, que disse à Lusa que não deixará de aproveitar o momento, que contará com a participação do secretário de Estado do Orçamento, João Leão, para alertar para “o défice de financiamento”, referindo que as instituições precisam de um reforço de 200 milhões de euros para garantir o normal funcionamento.

À pressão criada no financiamento com a redução do valor de propinas cobradas pelas universidades acresce “a tensão” com as progressões remuneratórias dos docentes, ainda por resolver, e os problemas de precariedade, com Gonçalo Leite Velho a alertar que aumentou o número de docentes a lecionar a tempo inteiro, mas com contratos a tempo parcial, dando o exemplo da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), liderada pelo atual presidente do CRUP, o reitor António Fontaínhas Fernandes.

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