"Naturalmente que o que aconteceu [o incêndio que provocou 66 mortos e 253 feridos] foi absolutamente lamentável e isso do ponto de vista humano tem de ser frisado e não está aqui em causa. Mas isso não implica que as pessoas sejam acusadas injustamente de uma coisa de que não são responsáveis. Uma tragédia que há que lamentar e registar em primeiro lugar, não pode depois implicar consequências criminais quando nós achamos que elas não devem ser tiradas", afirmou o advogado.

Em declarações à margem da sessão inicial da fase de instrução do processo judicial que tem 13 arguidos, que hoje decorre no Tribunal da Comarca de Leiria, Rui Patrício escusou-se, para já, a falar sobre um eventual despacho de não-pronúncia por parte do tribunal aos seus clientes, o subdiretor da área comercial da EDP, José Geria, e o subdiretor da área de manutenção do Centro da mesma empresa, Casimiro Pedro, ambos acusados no processo.

"É muito cedo para tirar conclusões sobre essa matéria, a instrução vai hoje começar, vamos fazer as coisas com calma, com o seu tempo, seguindo as regras, no final se verá e o tribunal decidirá soberanamente", argumentou.

Os dois quadros da elétrica são apresentados como responsáveis da EDP pela manutenção e gestão da linha de média tensão onde no dia 17 de junho de 2017 terão ocorrido descargas elétricas que originaram dois incêndios, em Escalos Fundeiros, às 14:38, e Regadas, às 16:00.

No requerimento de abertura da instrução, Rui Patrício alegou que a EDP fazia mais do que estava previsto na lei, nomeadamente manutenções de cinco em cinco anos quando a lei obrigava a que fossem realizada de dez em dez anos e que quando ocorreu o incêndio essa manutenção estava dentro do limite legal, não podendo ser imputadas responsabilidades.

Questionado sobre aspetos da sua estratégia de defesa, Rui Patrício recusou "entrar em questões técnicas".

"Isso não é o mais importante. O mais importante é lamentar profundamente aquilo que aconteceu, a tragédia humana que este evento constituiu e isso é o mais importante, as pessoas compreendem isso e isso não está em causa. Mas, por outro lado, dizer que do nosso ponto de vista da defesa, os nossos constituintes não têm nenhuma responsabilidade nisso", reafirmou.

Já Castanheira Neves, advogado de Fernando Lopes, ex-presidente da Câmara Municipal de Castanheira de Pera, disse que o seu cliente - que está acusado de 10 crimes de homicídio por negligência e um crime de ofensa à integridade física por negligência - pediu a abertura da instrução "tendo em vista a comprovação de que não cometeu, de facto, nenhum ilícito".

"Está por isso confiante de que desta instrução resulte a comprovação de que os indícios não têm consistência bastante para serem submetidos a julgamento", afirmou Castanheira Neves.

O grande incêndio que deflagrou em 17 de junho de 2017 em Escalos Fundeiros, concelho de Pedrógão Grande, e que alastrou depois a municípios vizinhos, nos distritos de Leiria, Coimbra e Castelo Branco, provocou 66 mortos e 253 feridos, sete deles com gravidade, e destruiu cerca de 500 casas, 261 das quais eram habitações permanentes, e 50 empresas.