“Houve, efetivamente, algumas injustiças no facto de haver manifestamente segundas habitações que mereciam ser apoiadas, porque aquelas pessoas vivem praticamente no território, mas não tinham lá a residência”, declarou o ex-coordenador da UMVI João Paulo Catarino, no âmbito de uma audição na comissão eventual de inquérito parlamentar à atuação do Estado na atribuição de apoios na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior.

Na perspetiva de João Paulo Catarino, “50% das segundas habitações era da mais elementar justiça” que fossem recuperadas, mas depois de “todo o alarido” na atribuição dos apoios à reconstrução das casas, através do fundo Revita, “não havia ninguém que quisesse atestar” quais as segundas habitações que deviam ser apoiadas.

Quanto à reconstrução das casas de primeira habitação, o ex-coordenador da UMVI disse que “provavelmente serão 5% das casas ou pouco mais de 5% das casas que estão em avaliação e que estão a ser investigadas” por suspeitas de apoio indevido.

“Não podemos tratar o todo por uma exceção”, defendeu João Paulo Catarino, criticando a “triste campanha mediática” que transformou algumas vítimas em criminosos.

No âmbito do fundo Revita, criado pelo Governo para gerir os donativos de apoio às populações e à revitalização das áreas afetadas pelos incêndios de junho de 2017, o papel da UMVI foi de coordenação logística de apetrechamento das casas e de reporte permanente à tutela quanto ao desenvolvimento do processo, referiu o ex-coordenador.

O fundo Revita ficou responsável pela reabilitação de 99 casas de primeira habitação, das quais 88 estão concluídas, seis em execução e cinco estão suspensas por questões judiciais.

Quanto ao apoio aos agricultores afetados pelos incêndios, com prejuízos até 5.000 euros, o fundo Revita concedeu subsídios a 1.131 produtores agrícolas, “no valor total de  3.442.967,76 euros”, revelou João Paulo Catarino.

Questionado pelos deputados, o ex-coordenador da UMVI indicou que a ideia inicial era que todos os apoios aos agricultores seriam através do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR), mas a “burocracia associada” às candidaturas fez com que o Governo criasse um mecanismo através no fundo Revita.

Neste sentido, João Paulo Catarino assegurou que “até aos 5.000 euros, toda a despesa apresentada pelos agricultores foi paga a 100%”, ressalvando que os apoios agrícolas, através do fundo Revita, não foram pagos na sua totalidade pelos donativos, uma vez foram alocados 2,5 milhões de euros do Orçamento do Estado.

Para o deputado do PSD Hugo Oliveira, as respostas do ex-coordenador da UMVI não coincidem com a informação prestada pelo ex-ministro da Agricultura Capoulas Santos.

Em 16 de dezembro de 2020, Capoulas Santos rejeitou a ideia de que houve agricultores a candidatarem-se à medida simplificada de apoio para prejuízos até 5.000 euros, porque apesar dos prejuízos serem superiores a esse valor, não tinham capacidade para elaborar um processo de candidatura ao regime de aplicação do apoio 6.2.2. - Restabelecimento do potencial produtivo, através do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR).

"Uma situação absolutamente absurda, porque não acredito que alguém que esteja carente de receber o apoio financeiro não esteja disponível para fazer o esforço mínimo de ir a um gabinete de projeto e pedir para lhe fazer uma candidatura", sustentou o ex-ministro da Agricultura, indicando que o custo da elaboração da candidatura era financiado a 100%.

Sobre a opção de usar o instrumento financeiro do PDR, o ex-ministro defendeu que "compete a qualquer governante fazer uma boa gestão dos dinheiros públicos", explicando que a medida comunitária é financiada a 85%, ou seja, em cada 1.000 euros a União Europeia dá 850 euros ao Estado português.

Ex-coordenador destaca "resposta exemplar”

“Em termos de resposta de emergência, e apesar de todo o alarido e polémicas - muitas delas bem desnecessárias -, estivemos à altura enquanto país ao nível das respostas estruturais”, afirmou João Paulo Catarino, destacando o “profundo empenho” das autarquias e dos serviços da administração pública no apoio à população afetada pelos incêndios de junho de 2017.

Numa audição na comissão eventual de inquérito parlamentar à atuação do Estado na atribuição de apoios na sequência dos incêndios de 2017 na zona do Pinhal Interior, João Paulo Catarino disse que a responsabilidade da UMVI, que foi sediada em Pedrógão Grande, foi “garantir a articulação da ação dos vários ministérios no território, em particular para coordenar a elaboração e a implementar o Programa de Revitalização do Pinhal Interior (PRPI)”.

Quanto ao PRPI, os principais objetivos passaram por reforçar a segurança das populações e a proteção dos espaços florestais, promover o desenvolvimento económico e social das regiões afetadas e intervir no ordenamento dos espaços rústicos, indicou o ex-coordenador da UMVI, referindo que, “no total, foram canalizados, através de avisos dedicados, cerca 278 milhões de euros de investimento público nas diferentes áreas setoriais, representando mais de 550 milhões de euros de investimento total”.

Relativamente ao reforço da segurança das pessoas e da proteção dos espaços florestais, João Paulo Catarino realçou o programa Aldeia Segura e Pessoas Seguras, a campanha Portugal Chama, a medida que obrigou à autorização prévia de queimas e queimadas e o reforço das equipas de sapadores e vigilantes florestais.

“Os resultados são positivos. Nestes últimos três anos reduziram-se substancialmente o número de ignições e no terreno são visíveis as intervenções físicas centradas sobretudo ao nível das faixas de gestão de combustível, quer em torno dos aglomerados populacionais, quer de vias rodoviárias, para aumentar a segurança das populações”, expôs o ex-coordenador da UMVI, que posteriormente foi secretário de Estado da Valorização do Interior e hoje é secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território.

Resultado da estratégia de revitalização económica dos concelhos afetados pelos incêndios, foram aprovados “mais de 400 projetos de investimento”, que contabilizam "139 milhões de euros e 87 milhões de euros de incentivo público”, revelou o governante, considerando que “são montantes que deixam antever mudanças importantes na estrutura do tecido económico”.

Em relação ao ordenamento dos espaços rústicos, João Paulo Catarino reconheceu que é o desafio “mais exigente”, inclusive porque 98% da área florestal é de propriedade privada e existe um problema de rentabilidade económica, revelando que houve “baixa adesão aos apoios” do PDR 2020 (Programa de Desenvolvimento Rural), em que dos 16 milhões de euros disponibilizados, foram apenas mobilizados cerca de 900 mil euros, no total de 41 projetos aprovados.

Perante as dificuldades de reordenamento da floresta, o Governo lançou o Programa de Transformação da Paisagem (PTP), com o objetivo de promover uma alteração estrutural da paisagem, “reintroduzindo a agricultura e dando preferência às espécies autóctones de crescimento lento, evitando a monocultura e, assim, conferindo maior resiliência face às alterações climáticas”, explicou o governante, referindo que se aplica aos territórios vulneráveis ao risco de incêndio.

Neste âmbito, o programa conta com “cinco avisos do PDR, no valor de 100 milhões de euros, complementados com 43 milhões de euros do Fundo Ambiental”, para apoiar os proprietários florestais, durante o período de 20 anos, na manutenção e gestão dos novos povoamentos de espécies de crescimento lento e autóctones, dispondo o Estado da possibilidade de arrendamento forçado das propriedades.

De acordo com o titular da pasta da Florestas, a ideia passa por “territorializar a política floresta”, em que a transformação da paisagem depende da intervenção dos agentes locais, sobretudo as autarquias, contabilizando-se “10 candidaturas, uma delas em Góis”.

Na perspetiva do ex-coordenador da UMVI, a zona do Pinha Interior está hoje “mais bem preparada” para a defesa da floresta contra incêndios, sobretudo no âmbito das faixas de gestão de combustível, em que foram investidos “vários milhões de euros”.

O incêndio que deflagrou em 17 de junho de 2017 em Escalos Fundeiros, no concelho de Pedrógão Grande, e que alastrou depois a municípios vizinhos, nos distritos de Leiria, Coimbra e Castelo Branco, provocou 66 mortos e 253 feridos, sete deles com gravidade, e destruiu cerca de 500 casas, 261 das quais eram habitações permanentes, e 50 empresas.

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