Habitantes da região relataram à agência francesa AFP que, desde o golpe de Estado de 1 de fevereiro, as pessoas estão, cada vez mais, a pegar em armas para combater o regime.
O golpe militar derrubou a conselheira de Estado Aung San Suu Kyi, líder do partido Liga Nacional pela Democracia, e empurrou o país para confrontos que já causaram a morte a 890 pessoas, segundo uma organização não-governamental local.
Segundo a Associação de Assistência aos Prisioneiros Políticos — Birmânia (AAPPB), há pelo menos 58 crianças entre os mortos.
A organização relata ainda um número incontável de feridos e casos de tortura.
Além disso, até quarta-feira, contabilizou, desde a revolta contra o golpe, a detenção de 6.421 pessoas pelas forças de segurança, das quais 5.554 ainda se encontravam na prisão, e 1.988 mandados de detenção para suspeitos.
De acordo com a Amnistia Internacional, as restrições ao acesso à internet e à liberdade de imprensa são severas.
Os confrontos estão também a forçar a deslocação de centenas de milhares de mulheres, homens e crianças, denuncia a Amnistia, estimando que, em 2021, “aproximadamente 200 mil civis deslocados” se tenham somado “aos mais de 300 mil deslocados já existentes que dependem da ajuda humanitária”.
Após o golpe militar, os civis organizaram-se, em certas zonas do país, em “grupos de defesa” para combater a junta militar, recorrendo a caçadeiras e armas artesanais.
Em particular, na região em torno da cidade de Sagaing (Centro) têm-se multiplicado os confrontos entre os “grupos de defesa” e os militares.
Na sexta-feira, registaram-se combates no cantão de Depayin, onde, segundo habitantes locais contaram à AFP, os militares abriram fogo sobre uma aldeia, perto da floresta, enquanto perseguiam membros do “grupo de defesa” local.
“Registámos 26 ataques com disparos de artilharia”, contou um aldeão. “Atiraram contra tudo o que mexesse na estrada e na aldeia”, detalhou, precisando que há civis entre as vítimas.
Os habitantes esperaram pelo dia seguinte para saírem das suas casas e contarem as vítimas, contou outra testemunha, que ajudou a recolher os corpos em Depayin. “Encontrámos oito mortos num local e outros dois noutro”, adiantou.
A imprensa local noticiou um número mais elevado de baixas.
Já os media estatais comunicaram que os militares que patrulhavam a zona foram apanhados numa emboscada.
Segundo o diário Global New Light of Myanmar, os soldados repeliram “terroristas armados” e apreenderam “quatro morteiros e seis armas de fogo”.
Noutro ataque registado em Sagaing, um membro das forças de segurança foi morto e as autoridades estão a tentar “garantir a estabilidade na região”, segundo o mesmo jornal oficial.
Apesar da repressão, manifestantes continuam a descer diariamente às ruas para desafiar o regime militar.
Hoje, em Sagaing, organizaram-se curtas manifestações, durante as quais os manifestantes fazem a saudação de três dedos, símbolo da resistência.
Na terça-feira, Aung San Suu Kyi — em prisão domiciliária desde o golpe — compareceu a um tribunal militar liderado pela junta.
A vencedora do Prémio Nobel da Paz em 1991, julgada por sedição, pode ser condenada a mais de dez anos de prisão se for considerada culpada.
Os militares justificaram o golpe por uma alegada fraude eleitoral nas eleições de novembro, ganhas, tal como em 2015, pelo partido liderado por Aung San Suu Kyi, com observadores internacionais a negarem a existência de qualquer fraude.
A 19 de junho, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) condenou o golpe militar e pediu um embargo de armas contra o país, numa resolução onde mostra ampla oposição à junta militar e exige restauração da transição democrática no país.
Os apoiantes esperavam que os 193 membros da ONU aprovassem a resolução por unanimidade, mas a Bielorrússia pediu uma votação e a medida foi aprovada com os votos favoráveis de 119 países, a abstenção de 36 países e o voto contra da Bielorrússia.
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