A ação legal promovida pelas famílias de diversas partes do mundo é contra o Parlamento Europeu e o Conselho Europeu e baseia-se no argumento de que a União Europeia (UE) não está a fazer tudo o que está ao seu alcance para combater as alterações climáticas e proteger os direitos fundamentais dos cidadãos relacionados com os efeitos adversos das mudanças no clima.
O grupo de cidadãos de Portugal, Alemanha, França, Itália, Roménia, Gronelândia, Fiji e Quénia envolvidos neste caso, chamado em inglês 'People's Climate Case', é acompanhado por organizações de defesa do ambiente, como a portuguesa Associação Sistema Terrestre Sustentável - Zero, por advogados e por cientistas que acreditam que a UE pode e deve ser mais ambiciosa na meta de redução das emissões de gases com efeito de estufa, principais responsáveis pelas alterações climáticas.
Representando setores de atividade dependentes do equilíbrio das condições do clima - floresta, agricultura e apicultura -, os portugueses envolvido na iniciativa são unânimes na necessidade de definir políticas abrangentes, e não só nacionais, que permitam lidar com os efeitos já sentidos e que tendem a agravar-se.
Para demonstrar que as consequências já estão aí, todos lembram o exemplo dramático das condições de 2017, com uma seca prolongada que contribuiu para os incêndios florestais de junho e de outubro, levando à morte de mais de 100 pessoas e a destruição de vastas áreas de floresta e de agricultura, assim como de edifícios.
Argumentam que, se nada mudar, as temperaturas vão aumentar mais de 3ºC, as secas e cheias vão ser mais fortes e frequentes, o nível do mar vai subir. Por isso, em 2015, os países alcançaram o Acordo de Paris, reunindo esforços para limitar o acréscimo da temperatura média do planeta a 1,5ºC.
Para as famílias, a meta fixada na Europa de reduzir as emissões em 40%, até 2030, é inadequada "no que diz respeito à necessidade real de evitar as consequências adversas das alterações climáticas que estão já a acontecer" e pouco ambiciosa "em relação ao que a UE poderia fazer", como refere informação divulgada pela Zero.
Um dos portugueses que aderiu à ação, o apicultor Ildebrando Conceição, habitante no centro de Portugal salienta que deixaram de existir quatro estações, estando agora reduzidas a verão e inverno, situação que "está a perturbar o trabalho das abelhas que levam mais tempo para se adaptarem às variações climáticas". Além da produção de mel, as abelhas são essenciais para a polinização.
A diminuição da produção de mel tem sido contínua, segundo o apicultor, e reduziu o rendimento da família, nesta atividade há décadas, produzindo mel, pólen, própolis, cera e abelhas. São necessárias medidas adicionais para a sobrevivência das colmeias, como a alimentação artificial das abelhas, mas, apesar destes cuidados, em 2017, perdeu quase 60% da produção.
O pai de outra família, Armando Carvalho, aplica práticas de gestão florestal sustentável, substituindo os pinheiros e eucaliptos por espécies autóctones, como carvalhos e castanheiros. Teve os seus terrenos florestais afetados pelos incêndios florestais e sentiu necessidade de assumir um papel ativo, defendendo que "cabe à UE liderar e agir de forma ambiciosa para reverter o que está a acontecer em termos de impactos das alterações climáticas".
"Enfrentar as mudanças climáticas [exige que] tudo tenha de ser rearranjado no âmbito de uma economia europeia que se quer sustentável para todos os países", resume num vídeo com o testemunho, como aconteceu com os restantes participantes.
Para o agricultor Alfredo Sendim, que se dedica a uma propriedade na família há seis gerações, uma subida de temperatura "mesmo abaixo dos 2ºC, será um verdadeiro desafio simplesmente devido às temperaturas mais extremas no verão, uma verdadeira ameaça de morte" para o gado.
Um aumento de temperatura acima de 2ºC, "para onde nos estamos a encaminhar com a atual meta climática da UE, haverá um deserto na região onde hoje fica a herdade e teremos de nos mudar", lamenta Alfredo Sendim, do sul do país.
A tecnologia não pode resolver tudo, defende, e "só uma compreensão e respeito pela natureza", aliados a novas soluções, podem resultar e "um esforço tão grande não pode ser encarado individualmente, tem de ser coletivo, uma consciência de toda a comunidade". "É ainda possível fazer um paraíso neste planeta", realça.
Joaquim Caixeiro, dependente do trabalho na quinta de Alfredo Sendim, também aderiu à ação. "A alteração climática afeta diretamente o meu trabalho e a vida da minha família, tornando a nossa atividade menos competitiva em comparação com atividades semelhantes na agricultura convencional. O que me motiva a participar nesta ação legal é o medo do nosso futuro: o meu e o das minhas filhas", opina.
Comentários