Carlos Jalali, professor de Ciência Política da Universidade de Aveiro, e Pedro Magalhães, sociólogo e investigador principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, concordam que o efeito covid-19 nas próximas eleições presidenciais é imprevisível e muito difícil de medir e antecipar.
“A grande incerteza será o efeito da pandemia sobre o voto”, admitiu, à Lusa, Carlos Jalali, que estudou várias tendências e “modelos” nos últimos anos.
Também Pedro Magalhães, com investigações na área da abstenção, diz ser “muito provável” que o valor dos eleitores a ficar em casa atinja um recorde, e apresenta quatro razões para tal:
- Em Portugal, há “cada vez menos pessoas” a participar em eleições e é preciso recuar até às presidenciais de 2006 para se encontrar uma eleição com mais de cinco milhões de portugueses
- O recenseamento automático dos eleitores no estrangeiro, que é, segundo o investigador, uma “medida positiva”, por dar “uma estimativa mais realista de quem vota entre o real universo” de eleitores, mas que “revela mais abstenção”.
- O facto de eleitores e políticos darem menos importância a eleições onde o Presidente é candidato e claro favorito. São eleições menos mobilizadoras e onde os próprios partidos e candidatos fazem menos esforços para mobilizar os eleitores”
- A pandemia que se vive e “os receios e obstáculos que isso coloca à participação”
Carlos Jalali concorda com os argumentos utilizados por Pedro Magalhães, ainda que afirmando que “o efeito da pandemia quase certamente irá sobrepor-se" aos outros fatores. Para além disto, acrescenta outras possíveis causas que podem levar a uma elevada taxa de abstenção nestas próximas eleições presidenciais.
Assim, o professor universitário descreve o que é o efeito “iô-iô”. Ou seja, quando há eleições em que os presidentes se recandidatam, a abstenção sobe, mas cinco anos depois, já sem o recandidato em causa, a abstenção desce, porque há maior disputa entre os novos candidatos.
Desde 1991 que em eleições em que o Presidente em funções se recandidata que “o número de votantes diminui em média cerca de um milhão relativamente à eleição anterior”, acrescentou, dizendo ainda que "se nesta eleição se reproduzisse essa média, a abstenção oficial seria ligeiramente acima dos 65%”.
As presidenciais em que Mário Soares foi reeleito em 1991 “tiveram a abstenção mais alta até essa altura”, mas esse recorde foi depois “ultrapassado em 2001”, na reeleição de Jorge Sampaio, e “ultrapassado novamente em 2011, na eleição que reconduziu Cavaco Silva” em Belém, descreveu Carlos Jalali.
Em concordância com Pedro Magalhães, Carlos Jalali afirma que o efeito do recenseamento automático dos portugueses no estrangeiro desde 2018, poderá ter impacto e aumentar a abstenção em 5.1%, para os 56.4% relativamente a 2016 - partindo do pressuposto que os eleitores, em Portugal e no estrangeiro, manteriam o mesmo comportamento.
Ademais, uma outra forma de compreender o comportamento do eleitorado, afirma Carlos Jalali, é “modelizar” com base no “número de votantes mínimo” em eleições em Portugal.
“Se o número de votantes for igual ao das eleições menos participadas dos últimos 10 anos (contando aqui todas as eleições nacionais, presidenciais, legislativas, europeias e autárquicas), em que votaram ligeiramente menos de 3.3 milhões de votantes, a abstenção oficial nestas presidenciais seria de 70%”, disse em resposta por escrito a questões feitas pela Lusa.
Jalali avisa, porém, que estes “valores não são previsões de abstenção”, mas sim “modelizações com base em padrões anteriores”, deixando ainda mais uma advertência.
“O passado não determina o futuro. Caso fossemos eternos prisioneiros do passado, Portugal não seria agora uma democracia e não estaríamos agora a falar de sobre eleições presidenciais por sufrágio universal, em eleições livres e justas”, justificou.
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