Em março de 2017, o Ministério Público (MP) deduziu acusação contra as empresas Adubos de Portugal e General Eletric e outros sete arguidos por responsabilidades no surto, que teve início há exatamente quatro anos, em 07 de novembro de 2014, e causou 12 mortes e infetou mais de 400 pessoas.
Um ano e oito meses após a acusação, o processo mantém-se em Vila Franca de Xira, sem data prevista para seguir para o Tribunal de Loures, no qual irá decorrer a fase de instrução, que já foi requerida pelos arguidos e por mais de meia centena de pessoas afetadas pelo surto, mas que o MP não considerou como vítimas, por não se ter provado o “nexo de causalidade”.
Fonte judicial explicou à agência Lusa que o processo permanece no Tribunal de Vila Franca de Xira devido aos muitos requerimentos de abertura de instrução apresentados, às dezenas de pedidos para a constituição de assistentes no processo e à necessidade de se cumprirem, nestas situações, os prazos previstos na lei.
Segundo a fonte, é previsível que os autos sigam para o Tribunal de Loures ainda este ano, para que no decorrer de 2019 se realize a instrução, fase facultativa em que um juiz vai decidir se o processo segue ou não para julgamento e em que moldes.
Paralelamente, em 10 de setembro deste ano, o Tribunal Cível de Vila Franca de Xira começou a julgar o primeiro pedido de indemnização civil apresentado por uma das vítimas, um homem, de 67 anos, que exige 200 mil euros à empresa Adubos de Portugal, não havendo, até hoje, uma decisão judicial.
Em declarações à agência Lusa, o presidente da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Alberto Mesquita, lamentou a “lentidão do processo” e pediu mais celeridade.
“É com grande frustração que vemos que passados quatro anos não haja, efetivamente, resultados das investigações que foram feitas. Alguns processos já avançaram em tribunal, mas quatro anos é muito tempo para quem foi afetado. Esperemos que a justiça seja mais célere”, afirmou o autarca socialista.
Alberto Mesquita sublinhou que o próprio município interpôs uma ação para ser ressarcido pelos prejuízos causados pelo surto, nomeadamente a nível da sua imagem: “A nossa advogada está à espera de ser contactada para poder responder em sede própria”, apontou.
O surto de 'legionella' de novembro de 2014 afetou, sobretudo, as freguesias de Vialonga, Póvoa de Santa Iria e Forte da Casa, provocou 12 mortes e infetou mais de 400 pessoas. No entanto, o MP só conseguiu apurar nexo de causalidade em 73 das pessoas afetadas e em oito das 12 vítimas mortais.
Na acusação do MP, deduzida em março de 2017, são arguidos um administrador, o diretor e o supervisor do setor da produção da Adubos de Portugal (ADP).
Segundo o despacho de acusação do MP, além de João Cabral, José Carvalhinho e Eduardo Ribeiro, são também acusados neste processo quatro funcionários, todos engenheiros químicos, da General Eletric (GE), empresa contratada pela ADP Fertilizantes para fiscalizar e monitorizar as torres de refrigeração.
De todos os casos notificados à Direção-Geral da Saúde, o MP só conseguiu estabelecer o nexo de causalidade em 73 situações, uma vez que nas restantes foi “inviável a recolha de amostras clínicas” ou “não foi identificada estirpe ou a estirpe identificada era distinta da detetada nas amostras ambientais recolhidas”.
Assim, o MP arquivou parcialmente o inquérito quanto a possíveis responsabilidades criminais por falta de provas indiciárias, relativamente a mais de 300 pessoas afetadas.
O MP proferiu ainda despacho de arquivamento quanto à eventual prática de um crime de poluição, por falta de legislação.
O MP sustenta que o surto de 'legionella' no concelho de Vila Franca de Xira foi causado pela "manifesta falta de cuidado” dos arguidos, que não cumpriram “um conjunto de regras e técnicas na conservação/manutenção” de uma das torres de refrigeração da ADP.
A ADP, a GE e os restantes sete arguidos estão acusados de um crime de infração de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços. Os três responsáveis da ADP e os quatro funcionários da GE, Ricardo Lopes, Maria Viana, Liliana Correia e Nélio Moreira, respondem, ainda, cada um, por 20 crimes de ofensa à integridade física por negligência.
O MP relata que “todos os arguidos e cada um deles agiram com manifesta falta de cuidado, que o dever geral de previdência aconselha, porquanto omitiram ações importantes aquando da negociação, celebração e execução do contrato entre as sociedades arguidas ADP e GE”.
A procuradora Helena Leitão concluiu que, caso as ações tivessem sido realizadas, “seriam determinantes para que o desenvolvimento microbiológico, nomeadamente da bactéria 'legionella', não tivesse ocorrido e propagado, por aerossolização, nos termos em que o foi".
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