“É impensável que, em determinado tipo de processos complexos, a investigação seja titulada só por um magistrado porque, obviamente, a dimensão do que está em análise é tal que se exige equipas de magistrados”, afirmou Joana Marques Vidal, durante um jantar-debate realizado quinta-feira à noite em Lisboa, sob o tema “Ministério Público: Presente e Futuro”.
Para a Procuradora, há processos que precisam “da intervenção de diversos tribunais ao mesmo tempo”, dando como exemplo o caso BES, que originou vários processos em vários tribunais: um processo de investigação criminal, processos de contraordenações, processos de ações cíveis, processos no âmbito dos tribunais administrativos fiscais e um processo de insolvência no tribunal do comércio”
Segundo a PGR, o Ministério Público tem de ter uma abordagem integrada, até porque “se compreenderá mal que um MP defenda que estão provados determinados factos num crime e os mesmos se considerem não provados na concorrência”.
Dando o exemplo de processos criminais que implicam conhecimentos de direito administrativo, Joana Marques Vidal defendeu que “é essencial que haja capacidade de articulação entre jurisdições de ambos ou até a constituição de equipas onde magistrados da área administrativa venham fazer parte da área criminal e vice-versa, face a determinados pontos da investigação que está em causa”.
A PGR disse que este modelo “foi ensaiado em alguns processos e deu resultados”, lembrando o caso BES em que a equipa era constituída também por dois magistrados do Tribunal Administrativo que participaram na análise de determinados segmentos de áreas contratuais e de planeamento urbanismo.
Para a procuradora, um dos desafios do futuro é a possibilidade de se “constituir equipas de varias jurisdições e o outro desafio é constituir equipas de trabalho dentro da mesma jurisdição”.
A PGR lembrou as áreas internacionais em que já há atualmente “a constituição de equipas conjuntas na área policial com magistrados e polícias estrangeiros”, considerando que “o futuro vai ser esse”.
Para que estas equipas possam ser constituídas é preciso que determinados dirigentes hierárquicos do Ministério Público passem a ter competências que lhes permitam promover a constituição dessas equipas, sublinhou.
A magistrada disse que é preciso mudar mentalidades e dar formação a quem está no terreno: “Fomos formados para `um processo/um magistrado´ e esta forma de trabalhar em equipas com abordagens integradas exige capacidade de trabalhar em equipa”.
Joana Marques Vidal disse acreditar que estas equipas de trabalho permitirão responder de forma mais eficaz à complexidade de alguns ilícitos criminais, como fenómenos transnacionais e outros que, muitas vezes, passam ao nível da cibercriminalidade.
No que toca ao funcionamento geral das instituições que cooperam com a Justiça criminal, a PGR lembrou que é preciso, no presente, uma “melhoria das perícias, uma melhoria da qualidade de todos os intervenientes, uma melhoria da qualidade e aprofundamento constante da formação dos próprios magistrados”.
Sobre a revisão do Estatuto do Ministério Público, a PGR voltou a defender que a autonomia interna e externa daquele órgão como “marca fundamental” e “garantia do funcionamento do Estado Democrático e de Direito”.
“Queremos este modelo de Ministério Publico ou queremos outro? Eu defendo este modelo”, disse a procuradora, reconhecendo que “não há nada é perfeito”, mas que o modelo português “é um dos mais equilibrados”.
Joana Marques Vidal começou o seu discurso com um aviso: “por respeito ao quadro judicial”, não se iria pronunciar sobre uma eventual recondução no cargo de PGR, cujo mandato termina no final do ano.
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