Nélia Seco, Mário Berjano e Luís Elias são professores há mais de 20 anos. No dia em que o Ministério da Educação reuniu todos os sindicatos para voltar a discutir o regime de recrutamento e mobilidade, apanharam um autocarro até Lisboa para se manifestarem em defesa da escola pública.
Ao lado de algumas centenas de colegas, são, como a maioria dos que estão concentrados junto ao Ministério, docentes em escolas do distrito de Setúbal, onde decorre hoje a greve por distritos convocada por uma plataforma de nove organizações sindicais, que decidiu passar o protesto da capital do distrito para a Avenida Infante Santo, em Lisboa.
“Viemos para lutar por uma escola pública digna e coerente”, disse à Lusa Nélia Seco, professora do pré-escolar no agrupamento de escolas do Vale da Amoreira, entre o barulho dos apitos e palavras de ordem que se fazem ouvir dentro do Ministério da Educação.
Professora há cerca de duas décadas, foi contratada durante 18 anos e, ao longo desse período, passou por mais de 13 estabelecimentos de ensino. “Na última vez que tinha contado, eram 13 escolas. Só agora é que estabilizei”, contou.
A situação é semelhante à de Luís Elias, docente de História na escola Romeu Correia, em Almada. Contratado durante 20 anos, é o exemplo de “professor de casa às costas” que o ministro da Educação quer que deixe de existir, tendo percorrido escolas de todo o país, “do Minho ao Algarve”.
O protesto de hoje é o mais recente de uma contestação que se prolonga desde dezembro, quando o Sindicato de Todos os Profissionais da Educação iniciou uma greve por tempo indeterminado, que ainda decorre. Entretanto, foram convocadas outras três paralisações e, atualmente, quase todos os sindicatos têm greves em curso.
“Estamos fartos, cansados de não conseguirmos aquilo que é justo para nós”, sublinhou Nélia Seco.
Mário Berjano concorda que é esse cansaço que move os professores, que asseguram que a luta é para continuar. “A classe chegou a um ponto em que não vê solução à vista”, disse à Lusa o professor da escola Romeu Correia.
Entre as reivindicações que já são conhecidas, destaca a contabilização de todo o tempo de serviço que esteve congelado, as quotas no acesso ao 5.º e 7.º escalões da carreira docente, a pouca atratividade da profissão e o envelhecimento da classe docente.
“Os professores sofrem calados há anos, agora chegou o momento e o ministro deu-nos uma ajuda”, afirmou, considerando que foram precisamente as primeiras propostas da tutela para o regime de recrutamento, fortemente criticadas na altura, que motivaram a contestação inicial.
A deputada do Bloco de Esquerda, Joana Mortágua, também passou pelo protesto e, em declarações aos jornalistas, reafirmou o apoio do partido aos docentes e considerou que “o Governo ainda não pôs em cima da mesa medidas que, de facto, tornem a carreira atrativa para impedir o esvaziamento da carreira docente”.
“Há um braço de ferro que o Governo quer fazer com os professores em termos que são inaceitáveis”, considerou Joana Mortágua, criticando também o ministro da Finanças, Fernando Medina, que afirmou, na quarta-feira em entrevista à TVI, que a prioridade era “cuidar do equilíbrio das nossas contas públicas”.
“O ministro vem dizer que o país não tem só professores, ignorando que o país, daqui a pouco, já não tem professores. Vem dizer que reconhecer direitos aos professores é hipotecar o futuro, quando, na verdade, aquilo que hipoteca o futuro é desinvestir na escola pública ao ponto de não termos professores daqui a 10 anos”, alertou a deputada bloquista.
Os professores estão em greve desde dezembro para exigir a contabilização de todo o tempo de serviço, melhores condições de trabalho e salariais, o fim da precariedade, e a progressão mais rápida na carreira. Atualmente, estão em curso quatro greves distintas, convocadas por várias organizações sindicais.
* Por Mariana Caeiro, Agência Lusa
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