Três dias após o anúncio, que motivou uma petição que conta já com mais de 17 mil assinaturas pela “alteração do nome previsto”, o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, pediu para que o seu nome não seja atribuído à ponte ciclopedonal sobre o rio Trancão, na sequência da polémica gerada nos últimos dias, informou hoje o patriarcado.

A Lusa questionou a Câmara de Lisboa sobre a decisão tomada pelo cardeal-patriarca, mas o município respondeu que não tem, neste momento, nada a acrescentar sobre o tema.

Na sexta-feira, a Câmara de Lisboa, presidida por Carlos Moedas (PSD), anunciou que a nova ponte ciclopedonal sobre o rio Trancão, que faz a ligação entre a capital e Loures no Parque Tejo e que foi construída para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), iria chamar-se Ponte Cardeal Dom Manuel Clemente.

Esse anúncio surpreendeu os vereadores da oposição na Câmara de Lisboa, designadamente o BE, partido que apresentou no sábado um requerimento a pedir esclarecimentos sobre a atribuição do topónimo Dom Manuel Clemente, por considerar que as regras previstas não foram cumpridas.

“Foi com estupefação que o Bloco de Esquerda assistiu a esta precipitação do presidente Carlos Moedas sobre a atribuição do topónimo Dom Manuel Clemente”, afirmou Ricardo Moreira, do BE, em representação da vereadora Beatriz Gomes Dias.

Em declarações à agência Lusa, Ricardo Moreira disse que o anúncio foi precipitado, porque não houve deliberação do executivo municipal, não houve pronúncia da Comissão Municipal de Toponímia e o nome “não cumpre as regras” que determinam que “a atribuição de topónimo apenas deve ocorrer decorridos 5 anos sobre a morte da personalidade, privilegiando individualidades de maior universalidade, exceto em casos excecionais, devidamente fundamentados”.

A petição pela alteração do nome previsto para a ponte Lisboa/Loures no Parque Tejo “é uma expressão de que aquele nome é particularmente polémico, por isso não faz sentido Carlos Moedas passar por cima das regras”, apontou o BE, adiantando que, se a proposta ainda for a votação em reunião de câmara, irá votar contra.

Também a vereação do PS defendeu que “teria sido mais avisado, por parte da Câmara de Lisboa, ter lançado um processo participado e que levasse em conta os próprios regulamentos da autarquia, evitando-se o envolvimento e exposição de um nome na praça pública, como se viu”.

Os socialistas lamentam que o social-democrata Carlos Moedas, que governa sem maioria absoluta, “não tenha optado por um processo aberto, participado, que envolvesse a Comissão de Toponímia, e antes tenha optado por um processo precipitado em cima da JMJ”, acusando-o de atuar “na sede de protagonismo mediático que o tem caracterizado recentemente, levando a uma situação a todos os títulos lamentável e que era de todo evitável”.

O PS reforçou ainda que “as regras e regulamentos têm propósitos, não apenas de participação e de uniformização de critérios objetivos, mas de preservação das instituições e do direito ao bom nome dos envolvidos”, lembrando que a atribuição de topónimos apenas deve ser consagrado a pessoas já falecidas e recordando que o nome de Jorge Sampaio, ex-presidente da Câmara de Lisboa e ex-Presidente da República, que faleceu em 10 de setembro de 2021, se encontra ainda sem titular qualquer estrutura na cidade.

Relativamente ao nome do Parque Tejo, em que há uma petição para que se chame Parque Papa Francisco, o BE defende que a atribuição de qualquer topónimo deve seguir as regras, enquanto o PS considera que “não faz sentido” discutir isso agora, porque "a estrutura em causa está incompleta, pois ainda só existe um terreno modelado e preparado para a JMJ”, estando em falta “o desenho e lançamento do concurso para um verdadeiro parque verde, arborizado e com zonas de sombreamento que o torne aprazível para os lisboetas”.

Do Livre, o vereador Rui Tavares pretende que o nome de Dom Manuel Clemente seja votado pela câmara e votará contra a atribuição deste topónimo à ponte ciclopedonal, propondo que, em alternativa, haja “um processo de consulta pública participada entre os dois municípios – Lisboa e Loures – para a escolha do nome da ponte”.

Rui Tavares disse ainda que o presidente Carlos Moedas, “em violação dos próprios regulamentos da câmara, tem propostas de toponímia do Livre cumprindo todos os critérios (cinco anos depois da morte da pessoa em causa, aprovação em votação na câmara, apresentação à comissão de toponímia) que não fez avançar até ao momento”, em que uma delas é a dedicada a José Manuel Tengarrinha.

Para o PCP, "a questão colocada fica ultrapassada a partir dos desenvolvimentos, entretanto ocorridos", com a decisão de Manuel Clemente recusar a atribuição do seu nome à ponte ciclopedonal sobre o rio Trancão.

A Lusa questionou também os vereadores do Cidadãos Por Lisboa, mas sem sucesso.

O executivo da Câmara de Lisboa é composto por 17 membros, dos quais sete eleitos da coligação Novos Tempos (PSD/CDS-PP/MPT/PPM/Aliança) – que são os únicos com pelouros atribuídos –, três do PS, dois do PCP, três do Cidadãos Por Lisboa (eleitos pela coligação PS/Livre), um do Livre e um do BE.